A ideia revolucionária que define a fronteira entre os tempos modernos e o passado é o domínio do risco”. Assim destacou Peter L. Bernstein, historiador norte americano, economista e educador financeiro, em seu livro O Desafio aos Deuses. 

Em outras palavras, Bernstein quis dizer que, se antes, tudo dependia da vontade dos Deuses, nos dias de hoje, com a gestão de risco, o futuro pode ser, de certa forma, digamos, mais previsível.

Mas, o que podemos entender por risco?

De um modo geral, o risco está sempre ligado a eventos negativos e danosos, de qualquer natureza, e associado a uma probabilidade dele ocorrer e de uma consequência. Entretanto, a percepção dele pode variar conforme a situação e a perspectiva das pessoas envolvidas, pois para algumas pode representar uma oportunidade de ganho.

Vale ressaltar que o risco está presente em todas as atividades empresariais, variando de intensidade de acordo com o segmento econômico. 

Se as empresas vêm experimentando inúmeras transformações ao longo dos últimos anos para se manter no mercado, a Gestão de Riscos vem, por sua vez, definir um conjunto de ações estratégicas em prol delas, tais como: identificação, administração, condução e prevenção dos riscos ligados a uma determinada atividade.

É um processo contínuo que permite que a organização atue de forma preventiva, erradicando possíveis perdas, sejam elas humanas e/ou materiais.

Mas, a gestão de riscos não se resume à ação de detectar e controlar os possíveis problemas. Ela também permite criar um ambiente de melhorias.

Neste contexto, existe uma ciência que é responsável pela avaliação dos riscos: a chamada Ciência Atuarial.

Instituto Brasileiro de Atuária (IBA) define o profissional de ciências atuariais, ou seja, o atuário, como sendo: “… o preparado para mensurar e administrar riscos, uma vez que a profissão exige conhecimentos em teorias e aplicações matemáticas, estatística, economia, probabilidade e finanças, transformando-o em um verdadeiro arquiteto financeiro e matemático social capaz de analisar concomitantemente as mudanças financeiras e sociais no mundo.”

Além desta definição do IBA, várias outras podem ser encontradas, mas em todas iremos encontrar a palavra “RISCO”. Portanto, em suma, os atuários são gestores de risco. Eles identificam, analisam, administram etc.

De forma bem resumida, esse profissional coloca um valor no risco, seja esse valor em forma de preço, provisão e/ou capital. Daí a necessidade da multidisciplinaridade requerida que o curso possui, pois é necessário conhecer de tudo um pouco. Dentre as áreas de exploração, destaco: programação, banco de dados, matemática, estatística, economia, finanças, capacidade de análise, raciocínio lógico, contabilidade, legislação, dentre outros.

Alvin Toffler, escritor e futurista norte americano, já dizia: “o analfabeto do século XXI não será aquele que não consegue ler e escrever, mas aquele que não consegue aprender, desaprender e reaprender”.

Portanto, dada então esta contextualização inicial, olhemos a partir de agora para o futuro, criando, assim, uma ponte com destaque nas habilidades a serem enxergadas por esse profissional e pelo mercado envolvido.

Aqui, listo seis habilidades que considero essenciais para o atuário do futuro:

1- Desbravar outros mercados

O campo de atuação do atuário está principalmente voltado para previdência, seguros, saúde suplementar e capitalização, por serem mercados que apresentam riscos bastante elevados e com forte regulamentação governamental. Por exemplo, todos os preços de seguros (automóvel, vida, incêndio, responsabilidade civil etc.) e dos planos de saúde (individuais e coletivos) são calculados por um atuário, pois é exigência do regulador. As contribuições e benefícios da sua previdência complementar e da sua previdência social também são calculados por um atuário.

Contudo, no longo prazo, estes mercados estarão saturados e não conseguirão mais absorver todos os profissionais. Dessa forma, mensurar e administrar riscos, que são atividades próprias dos atuários, devem ser ampliadas para todo e qualquer tipo de mercado, aumentando, assim, o campo de atuação desse especialista e, ao mesmo tempo, auxiliando organizações a evitar perdas desnecessárias e a equilibrar suas finanças.

Gestão de riscos é um campo muito amplo e essas lacunas de mercado podem ser perfeitamente preenchidas pelos atuários. Neste aspecto, é preciso destacar também as seguintes oportunidades: cálculo de provisões dos programas de milhagens, estratégias em apostas de jogos esportivos, assessorias em micro e pequenas empresas, inteligência de mercado, controladoria, informações estratégicas (Business Intelligence), análise de custos, dentre outros.

2- Entender mais sobre ciência de dados e tecnologias emergentes

O atuário necessita investir tempo para entender sobre toda a tecnologia que vem mudando o mundo. O Big Data, por exemplo, conceito que descreve o grande volume de dados estruturados e não estruturados que são gerados a cada segundo, representa uma grande oportunidade, pois o atuário possui como um dos principais insumos de trabalho os dados para calcular os riscos e as probabilidades deles acontecerem. O Big Data permitirá cruzar esses dados numa abordagem mais dinâmica do gerenciamento dos riscos, com insights rápidos e precisos, aliado aos mecanismos que estão sendo utilizados atualmente e que já fazem parte deste cenário, como, por exemplo, os programas de reputação digital.

Outra tecnologia que pode contribuir com a atividade destes profissionais é a Inteligência Artificial (IA). Essa tecnologia irá otimizar o tempo ao executar tarefas repetitivas que pouco ou nada mudam, deixando os atuários bem mais focados na busca de soluções de problemas de natureza mais complexas e inovadoras. Também poderá ajudar na identificação de padrões para exploração de dados, possibilitando uma maior precisão na análise de um determinado perfil, e contribuindo assim para a identificação de fraudes. Sem contar que poderá contribuir também para o processamento de linguagem natural desenvolvendo uma aplicação capaz de interpretar textos como as resoluções normativas dos reguladores para avaliar a possibilidade de determinados cenários gerarem multas no ambiente do risco legal.

3- Ter uma visão mais estratégica

A verdade é que os atuários ainda são conhecidos, na maioria das vezes, como técnicos que possuem boa percepção analítica, são conhecedores de planilhas eletrônicas e bancos de dados, exclusivamente responsáveis pelo cálculo dos preços, das provisões técnicas, da reserva matemática etc. Apesar disso, numa concepção mais moderna, considero mais importante que a profissão siga os passos para a visão mais ampla do risco, possibilitando a união da boa técnica com uma noção mais estratégica. Portanto, são novas necessidades dos atuários:

a) ter uma visão sistêmica da negócio/empresa;

b) interagir com profissionais de outras áreas do conhecimento; e

c) ser um profissional multidisciplinar.

Outro ponto fundamental é que o atuário, além de utilizar cálculos, sejam eles determinísticos ou estocásticos, possam utilizar, também, dependendo do caso e com a prudência e o bom senso necessários, o seu feeling, explorando, assim, sua subjetividade e experiência da área em que está atuando, avaliando e ponderando os aspectos internos e de mercado. Desta forma, amplia os horizontes de ação e não fica restrito a uma metodologia, algumas vezes até inexistente para aplicação.

4- Saber interagir com outras áreas

A interação com outras áreas do saber é necessária e fundamental, pois estimula novas ideias/soluções e estabelece um enriquecimento intelectual mútuo, ativando, inclusive, a subjetividade, além do fato de possibilitar cada vez mais o conhecimento da ciência atuarial pelo outros, corroborando para gestão de risco em sua essência maior.

5- Simplificar a comunicação

A comunicação é outro fator muito importante. Possuir clareza e didática para explicar algum estudo realizado é tarefa, muitas vezes, difícil, principalmente quando o público não trabalha diretamente com números. Portanto, querer explicar as fórmulas mirabolantes dos livros pode ser uma tarefa árdua e, por vezes, incompreendida, pois as pessoas, geralmente, não querem saber disso, querem apenas entender os resultados.

De forma criativa, fazer analogias, fornecer exemplos lúdicos e ilustrativos, transformar a matemática em algo prazeroso pode ser uma ótima saída. Um exemplo disso é a forma de apresentação; relatórios extensos podem se transformar em um infográfico de uma página só.

6- Entender mais sobre Economia Comportamental

Além das razões óbvias que já sabemos, o que leva um beneficiário ir a uma consulta eletiva? O que leva uma pessoa a não poupar?  a não fazer o seguro do seu carro? O que leva a falta de interesse de um determinado produto que é julgado importante? As respostas desses questionamentos podem ser muito úteis na tomada de decisão. Uma disciplina fundamental que estuda os aspectos comportamentais do ser humano e que certamente agregará muito ao equilíbrio necessário entre o qualitativo e quantitativo é a chamada Economia Comportamental.

Os atuários, mais do que nunca, devem complementar suas análises preditivas levando em consideração, além do lado da empresa, o lado do cliente, contemplando, assim, um mapeamento dos motivos pelos quais o levam a atitudes que geram, em sua essência maior, fatos intrinsecamente ligados aos riscos inerentes ao negócio das empresas e à sociedade como um todo.

Embora este texto tenha tido um enfoque eminentemente atuarial, existem diversos outros profissionais que trabalham com gestão de riscos e não são atuários. Contudo, as seis habilidades destacadas são, na minha visão de atuário, interessantes para fomentar reflexões junto ao conhecimento, evolução e continuidade desta ciência.

Nazareno Maciel Junior

Nazareno é atuário, perito, palestrante, escritor e mestre em Economia. Atua no segmento de Saúde Suplementar. É membro do Instituto Brasileiro de Atuária (IBA), do Comitê Nacional dos Atuários do Sistema Unimed e do Comitê Permanente de Solvência da ANS.

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