Um método que calcule quais trabalhos hoje correm maior risco de serem automatizados em um futuro próximo. E que também identifique e recomende trabalhos com menor risco de automação e com habilidades e conhecimentos parecidos, que possam ser reaproveitados. Esse método existe e foi desenvolvido por um time de roboticistas da Ecole Polytechnique Fédérale de Lausanne (EPFL) e de economistas da Universidade de Lausanne.

O estudo realizado por eles foi publicado dia 13 de abril na Science Robotics. E pode ser um arsenal frente aos impactos que a robótica e a inteligência artificial (IA) podem ter sobre empregos de média e alta qualificação, trabalhos cognitivos e criativos e aqueles que exigem motricidade fina.

Em longo prazo, IA e robótica irão aumentar a produtividade e acelerar o crescimento econômico, mas há uma preocupação: a quarta revolução industrial catalisada por essas tecnologias difere das anteriores que deram tempo para que uma nova geração de trabalhadores fosse treinada e se adaptasse.

Hoje, com a aceleração exponencial das tecnologias, com a convergência de megatendências e inovações (como aprendizado profundo, nanotecnologia, novos materiais etc), os impactos podem acontecer muito mais rapidamente. As pessoas terão que se requalificar e se aprimorar várias vezes em suas carreiras.

Trabalhos físicos e cognitivos

“Há diversos estudos que preveem quais trabalhos serão automatizados por robôs, mas todos focam em softwares de IA – reconhecimento de voz e imagem, consultores financeiros, chatbots, dentre outros. Aqui, consideramos não apenas eles, mas também robôs inteligentes que realizam trabalhos físicos. Desenvolvemos um método que compara sistematicamente habilidades humanas e robóticas para centenas de trabalhos”, explica o Prof. Dario Floreano, Diretor do Laboratório de Sistemas Inteligentes da EPFL e principal autor do estudo

Estudos anteriores focaram principalmente em IA (algoritmos usados ​​para automatizar tarefas cognitivas) em vez de robótica (máquinas realizando trabalho físico ou tarefas que combinam aspecto físico e cognitivo). O avanço recente de máquinas inteligentes – como veículos autônomos, robôs vestíveis (wearables), e assistentes pessoais – nos mostra que o impacto da robotização pode ser tão relevante quanto o da automação baseada em IA.

Para esse novo estudo, os pesquisadores da EPFL e da Universidade de Lausanne analisaram o Roadmap Multianual Robótico 2020 (MAR), que é um documento estratégico da Comissão Europeia revisado periodicamente por especialistas em robótica. O MAR detalha quais habilidades são desejadas dos atuais robôs e quais podem ser necessárias no futuro. Estas habilidades são organizadas em categorias como manuseio, percepção e interação com humanos.

Os pesquisadores então analisaram diversas patentes, pesquisas e descrições de produtos robóticos para avaliar o nível de maturidade hoje dessas habilidades dos robôs. Basearam-se na TRL (Technology Readiness Level), escala criada pela NASA, na década de 1970, para avaliar a maturidade técnica de uma determinada tecnologia.

Para tratar das habilidades humanas, eles usaram o banco de dados da Occupational Information Network (O*NET), amplamente utilizado no mercado de trabalho dos Estados Unidos. O banco classifica 967 perfis de trabalho e detalha habilidades e conhecimentos necessários para cada uma delas.

Assim, os pesquisadores combinaram, de forma seletiva, habilidades humanas da lista O*NET com habilidades robóticas do documento MAR, o que possibilitou calcular a probabilidade de cada trabalho hoje ser realizado por um robô no futuro.

Para cada uma das 967 ocupações, foi calculado o índice de risco de automação (ARI). O ARI é baseado em quantas habilidades necessárias para um trabalho/ocupação podem ser executadas por robôs e a importância dessas habilidades para cada ocupação específica. O ARI varia dentro e entre categorias de ocupação, indicando que é possível que trabalhadores possam mudar para um emprego com um ARI mais baixo sem precisar de forte requalificação profissional.

Além disso, para cada par possível de empregos, foi calculado um índice de resiliência (IR), que mede quão viável (em termos de esforço de requalificação) e quão conveniente (em termos de redução de ARI) seria mudar de um emprego para outro. Assim, para cada ocupação, é possível sugerir trabalhos alternativos com o melhor IR, ou seja, com a melhor mitigação do risco de automação por unidade de esforço de requalificação.

No meu caso, que sou economista, o índice deu 0,57. Como alternativas resilientes de trabalho, apareceram como opção 1 a Matemática (vemos muito essa disciplina no curso de Economia), com índice de 0,50; como opção 2, a Física, com 0,43; e opção 3, lecionar Direito, com 0,53.

Zeladores e faxineiros, exceto empregados domésticos, são ocupações com altíssimo risco de automação. (Fonte: Robots. Jobs, and Resilience)

Sociedade mais resiliente

Para o Prof. Rafael Lalive, que co-liderou o estudo na Universidade de Lausanne, o principal desafio hoje para a sociedade é tornar-se mais resiliente frente à automação. “Nosso método oferece aconselhamento de carreira para pessoas que enfrentam alto risco de automação nos seus trabalhos, indicando ocupações mais seguras e aproveitando habilidades já desenvolvidas em outros empregos”, diz.

Com esse novo método, governos podem avaliar riscos de desemprego da população economicamente ativa e desenhar políticas eficazes para requalificação e bem-estar que mitiguem os impactos socioeconômicos de uma próxima revolução industrial.

Empresas também podem usar o método para avaliar custos associados à automação. E pesquisadores em robótica e IA podem antecipar colapsos sociais que podem ser causados com a automação.

Todo esse trabalho foi traduzido em um algoritmo que consegue prever riscos para centenas de empregos, além de sugerir “alternativas resilientes” para transição de carreira.

Veja o algoritmo (em inglês) aqui.

Lilia Porto

Economista, fundadora e CEO do O Futuro das Coisas. Como pensadora e estudiosa de futuros tem contribuído para acelerar os próximos passos para organizações e para uma sociedade mais justa e equitativa.

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