Em um mundo complexo e não-linear, criar cenários e tomar decisões em tempo hábil pode nos garantir alguns benefícios e vantagens.

E se considerássemos nossas vidas, carreiras e habilidades como oportunidades para novas descobertas, prototipagem e iteração? Em outras palavras, e se nós fôssemos o próprio produto?

O design thinking é uma estratégia utilizada para melhorar um produto ou uma experiência. Mas também pode ser usado para melhorar nossa vida – e é isso que Bill Burnett e Dave Evans, professores da Universidade de Stanford se propuseram a aplicar.

Esse pensamento surgiu na Stanford d.school, centro de inovação, colaboração e criatividade da Universidade de Stanford. Lá, anualmente, alunos de todas as graduações correm para se inscrever no curso Designing Your Life (“Projetando/Desenhando sua Vida”), ministrado por Bill e Dave. A estrutura curricular é apresentada no best-seller deles Design Your Work Life, junto com um pacote de recursos online para equipar não só alunos, mas profissionais de todas as áreas e idades com ferramentas para reimaginar suas vidas através das lentes do Design.

Dá para experimentar um dos exercícios, usando esta estrutura (em PDF), que tem como objetivo mapear maneiras pelas quais a vida pode se desenrolar (veja abaixo).

Exercício de uma vida hipotética como advogado(a) corporativo (Via: Business Insider)

A ideia é que, em vez de imaginar a vida como uma rota linear, do ponto A ao ponto B, você imagine três (ou mais) caminhos diferentes, cada um com perguntas sobre vida, trabalho e carreiras futuras.

Cada caminho cria-se uma história, com classificação de seus recursos (0 a 100), entusiasmo (frio a quente), confiança (pouca a plena) e consistência (0 a 100) para seguir a jornada. A ideia é imaginar direções que podem ser exploradas.

Este exercício é apenas um pontapé inicial. Desenhar e prototipar a vida é um processo que requer constantemente uma profunda autorreflexão, consciência pessoal, e também coragem. Da mesma forma que outros processos de design, envolve frequentes iterações.

Desenhar a vida é diferente de planejá-la. Enquanto planejar, por exemplo um evento ou uma viagem – um exercício com resultados (e benefícios) diretos e tangíveis –, planejar a vida é algo mais complexo. “Quantas descobertas podem se abrir quando deixamos de ter um plano e passamos a exercitar a mentalidade de aprender constantemente, e pivotando a cada momento”, afirmam os professores.

Aprender a criar oportunidades na vida e no trabalho requer habilidades e mentalidades diferentes. Logo abaixo estão mais dois exercícios para aplicar a mentalidade de design à sua vida:

1. Indo para a zona de desconforto

1.1 Desenhe três círculos concêntricos em um pedaço de papel. O círculo do centro é sua zona de conforto e quanto mais você se afasta dessa zona, mais desafiador fica. Tudo o que está fora do círculo ou nas bordas do papel são atividades que você precisa criar mais coragem para realizá-las.

1.2 Começando do centro e estendendo-se até o círculo mais externo, escreva de cinco a dez atividades que você deseja fazer, mas que você precisa de um empurrãozinho extra para que elas aconteçam.

1.3 Compare as atividades dos seus círculos com as de uma outra pessoa – amiga ou colega de trabalho. Talvez uma atividade que você tenha colocado no círculo mais externo como sendo muito desafiadora ou mesmo “assustadora” possa estar dentro da zona de conforto dessa outra pessoa. Talvez ela possa lhe passar dicas ou caminhos. Veja se também há atividades que estão na sua zona de conforto e que para ela sejam desafiadoras e, nesse caso, lhe dê dicas e orientações. Essa troca é bastante construtiva.

Você vai ficar confinada ou confinado na sua zona de conforto? (ILUSTRAÇÃO: BURNT TOAST)

2. Desafiando suposições e hipóteses

2.1 Como em qualquer projeto de design, comece com o que (você acha) que sabe. Quais são suas suposições sobre tipos de trabalho ou ambiente de trabalho que você acredita que lhe fariam feliz, realizado(a) ou lhe daria segurança? Quais são suas hipóteses sobre o setor/área/mercado/indústria/empresa que você atua?

2.2 Faça um experimento de baixo risco onde possa testar essas suposições. Você teria curiosidade em saber como seria trabalhar em uma startup? É perfeitamente possível você trocar ideias com pessoas que trabalham em startups. Talvez você acredite que seja difícil trabalhar com vendas, mas de vez em quando se pergunta: “E se?”. Registre as coisas que você ouve, aprende e sente ao longo dessas conversas e trocas.

2.3 Sintetize seus aprendizados e percepções.

Essa é uma maneira de pensar, aprender e prototipar que pode abrir novas perspectivas. Pode ajudar a descobrir habilidades, a pensar criticamente, pôr em prática ideias e se conectar com outras pessoas para lidar com problemas reais.

Força você a se perguntar: “Que tipo de mudança desejo criar (para mim ou para a sociedade), e como posso dar o primeiro passo hoje?” Em outras palavras, vez de planejar a vida é começar a desenhá-la e prototipá-la.

Quando fundei O Futuro das Coisas, meu objetivo foi questionar o status quo e conversar sobre futuros desejáveis, inspirada pela mesma mentalidade do Design e pela pergunta “e se?”. Todos os dias, nós aqui fazemos provocações de design para questionar limites “convencionais” ou que sejam culturalmente aceitáveis. Por exemplo, o que aconteceria se algo não fosse mais a exceção, mas a norma? Acessível para todos?

Como seria se todas as escolas de ensino médio – públicas e privadas – não só introduzissem a alfabetização para futuros (Futures Literacy), mas ajudassem os alunos a projetar suas vidas? Por exemplo, jovens de 14 a 17 anos de idade com experiências de aprendizado prático sobre profissões.

Estamos todos vivendo protótipos, evoluindo e nos transformando de diversas maneiras. Ao desenhar nossas vidas, podemos começar a criar futuros que talvez nunca tivéssemos pensado ser possíveis.

Ilustração da capa: George Mironidis

Lilia Porto

Economista, fundadora e CEO do O Futuro das Coisas. Como pensadora e estudiosa de futuros tem contribuído para acelerar os próximos passos para organizações e para uma sociedade mais justa e equitativa.

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