Convido você a vislumbrar um possível cenário no futuro, numa época chamada Singularidade, quando acredita-se que a máquina irá alcançar um nível de inteligência e de consciência igual ou superior a do ser humano.

Estamos no ano de 2035 e algumas previsões de futuristas no passado se confirmaram. Houve uma comoditização em massa de boa parte das atividades antes praticadas pelos humanos. É possível ver robôs, em diversos formatos, executando trabalhos braçais e pouco técnicos como também atuando em profissões ditas “colarinho branco”, como de repórteres, advogados, cirurgiões, analistas financeiros, dentre outros.

Máquinas autônomas nos campos de batalha e até mesmo nas ruas, às vezes sem a companhia da polícia, tornaram-se uma ameaça constante para as pessoas.

Uma tendência crescente nesta época é tornar-se um ser híbrido (humano-máquina) pois algumas pessoas querem “bater de frente” com as máquinas. Por este motivo, elas estão escolhendo transcender os limites da sua inteligência.

Algumas atividades que precisam de empatia e sensibilidade ainda são exercidas pelo homem. No entanto, a robotização afetou até mesmo as relações humanas, ainda que haja algumas “tribos” meio que isoladas das novas tecnologias.

Os criadores desta nova forma de vida queriam que ela fosse infinitamente mais inteligente e eficiente do que o homem. Porém, esqueceram ou negligenciaram algo fundamental: desenvolver a empatia, para que a máquina pudesse compreender os dilemas humanos e pensar como suas decisões poderiam nos afetar. Filósofos, psicólogos, artistas não participaram da concepção desta super Inteligência Artificial (IA).

De volta ao presente, vale uma reflexão sobre o real significado da vida com a evolução da IA. Conflitos entre os humanos e as máquinas poderão ser desencadeados, já que pela primeira vez na história nos deparamos com uma forma de vida muito mais inteligente e eficiente do que a nossa.

Esse conflito do ser humano com a máquina foi ilustrado na série Humans, onde os synchs (robôs) superam os humanos em várias atividades e esse aparente domínio causa uma revolta nas pessoas, que manifestam seu direito de espécie dominante nas ruas. Uma reação bastante similar a que vemos hoje com a insatisfação dos taxistas com o aplicativo Uber (mal sabem eles que, em alguns anos, os carros autônomos vão provocar um impacto muito mais intenso.)

Será que a destituição da condição de dominância dos seres humanos pode causar um momento de desequilíbrio emocional e questionamentos sobre “qual o propósito de viver quando praticamente tudo for automatizado?

Inteligência Artificial e a Empatia: A Maquina Afetiva

Hoje temos uma IA segura e fácil de manusear e manipular. No entanto, nos próximos anos, com o crescimento da capacidade cognitiva da máquina, é possível que tenhamos uma IA super volátil e imprevísivel. O pesquisador da Universidade de Oxford, Daniel Dewey compara a evolução da IA com a dos micro-organismos:

“A evolução da IA é bastante similar aos micro-organismos, ambos têm uma natureza objetiva e reagem em cadeia. Com uma super inteligência essa IA usará todos os recursos a seu alcance para resolver uma tarefa.”

Uma IA superinteligente, incontrolável e sem o coeficiente emocional pode ser comparada a uma pessoa com sintomas de psicopatia.

Mas, há também uma perspectiva otimista para evitar essa possível catástrofe. Alguns ícones como o físico Stephen Hawking e os empresários Bill Gates e Elon Musk apontam outro caminho para o trajeto da IA. Musk, por exemplo, investiu 7 milhões de dólares em algumas iniciativas a favor da humanização, ou seja, de uma IA mais emotiva que fosse criada e ensinada como um ser humano.

A empatia junto com um conjunto de emoções pode despertar um lado generoso e compreensivo dentro das máquinas que pode ser um ponto de partida para a construção de um elo entre a IA superinteligente e as pessoas.

Com a evolução exponencial, uma Super Inteligência em formato humanóide pode estar por vir. Como você trataria um “ser” mais inteligente e eficiente do que você e como este “ser” lhe trataria?

Ao adicionarmos compreensão emocional e capacidade sensitiva na IA, ela pode se tornar consciente, como Ray Kurzweil comentou em uma entrevista:

“Uma vez que a máquina compreende uma linguagem complexa natural, ela se torna consciente. Não digo inteligência lógica e sim inteligência emocional, ser divertida, entender uma piada, ser sexy, ser amável, compreender a emoção humana. Isto é o que separa o ser humano da máquina hoje.”

Portanto, a capacidade de se colocar no lugar do outro e compreender o sentimento do próximo podem ser ingredientes cruciais no desenvolvimento de uma IA segura e empática para a humanidade.

Robôs com Emoções

A “computação afetiva” pode trazer novas perspectivas com relação à criação e à replicação das emoções nas máquinas. Características genuínas do ser humano como criatividade, pensamento, afetividade estão sendo compreendidas e desenvolvidas na máquina através do algorítimo de “aprendizado profundo”, a maneira de uma rede neural.

Abaixo, cito alguns robôs que já foram criados e estão sendo aprimorados para melhor interagir, conviver e contribuir com o homem.   

Pepper

A empresa SoftBank criou o primeiro robô que interpreta e aprende como um ser humano. Essa é a proposta do Pepper: conectar em uma nuvem de dados e aprender com a experiência de todos os robôs ao redor do mundo.

O Pepper funciona como um companheiro para as pessoas. Além de compreender o sentimento humano, ele responde de forma afetiva.

A pesquisadora e desenvolvedora Angelica Lim, também criou o NaoAvatar, um robô transmissor das dinâmicas e narrativa de um jogo de aventura. Essa habilidade pode criar uma conexão empática com as pessoas.

Jibo

Esse robô com um design super amigável e com uma gama de utilidades, mostra o avanço da IA, principalmente com relação a sua sensibilidade na interação com os humanos. Pode ser considerado uma evolução do assistente pessoal da Apple, a Siri.

Robôs Sociais como o Pepper e o Jibo além de resolverem tarefas complexas e importantes para as pessoas podem também se conectar com elas de forma significativa. Eles apontam uma perspectiva otimista, ao contrário do que foi falado no começo do texto sobre a comoditização das atividades humanas: estes robôs atuam como parceiros das pessoas.

Imagine outros Peppers e Jibos para crianças autistas ou com problemas de socialização, pessoas solitárias ou que perderam algum ente querido e como cuidadores de pessoas idosas.

Com o aumento da capacidade cognitiva e emocional, “emo robôs” vão ficar cada vez mais acessíveis e sensíveis.

O Poder da Abstração e da Criatividade nas Máquinas

Emoções comuns nos seres humanos como tristeza, alegria, medo, raiva e afeto podem ser desenvolvidas na IA como mostramos acima com os Emo Robôs. A grande discussão é a possibilidade de desenvolver o pensamento crítico e a autonomia criativa para resolver problemas de forma original, o que seria de suma importância, o desenvolvimento da empatia.

No setor produtivo, a capacidade abstrativa e criativa pode colocar a IA em outro patamar, ainda que esteja longe da real sensibilidade humana.

A IA começa a despontar realizando algumas atividades que  baseiam-se na intuição, percepção e critério como: composição de música, análise de tendências da música, obras de artes, especialista em arte, criação de conteúdo de mídia, design de websites, composição de poesia, edição de vídeo, etc.

Quer dizer que as máquinas que hoje funcionam como ferramentas, em um futuro próximo serão superinteligentes, criativas e empáticas?

Essa questão ainda é uma incógnita mas, alguns cientistas já trabalham para criar uma super IA que sinta, pense e aja como um ser humano. É um grande desafio.

O teste de Turing foi realizado pela Eugene, um sistema de IA que precisaria “se passar” por um adolescente de 13 anos, e ela conseguiu . Outro, o teste de Lovelace desafiou as capacidades criativas da IA, onde o seu objetivo seria ela criar alguma obra de arte original e ser avaliada por um crítico no assunto.

No entanto, o teste de Lovelace parece esta longe de ser executado com sucesso e pode responder a questão acima: a máquina ainda não superou e ainda parece longe de desenvolver o pensamento crítico e por fim a empatia, pelo menos hoje.

O Futuro da Empatia nos Humanos Impulsionado por Máquinas

Citamos várias possibilidades ao longo desse texto, de como a IA – seja em forma de robô humanóide ou como software inteligente – pode desenvolver pensamentos e sentimentos.

Por outro lado, a parcial fusão do humano com a máquina, ou seja, o ser híbrido, traz várias questões de cunhos éticos e morais sobre a modificação da condição humana natural para outra próxima da imortalidade.

“Homo Sapiens vão dar lugar aos Robos Sapiens” – disse Tirosh-Samuelson, filósofo e transhumanista.

Essa é a proposta do Movimento Transhumanista, que promove discussões sobre a evolução da espécie humana usando tecnologias avançadas para melhorar suas capacidades físicas, psicológicas e intelectuais.

O Transhumanismo é o motivo pelo qual muitos cientistas e futuristas não acreditam que a evolução da IA possa desencadear um cenário pessimista e hostil para a humanidade. Pois, ao invés de ser uma ameaça aos nossos empregos e atividades, ela pode ser o motor para a evolução da nossa inteligência e romper nossas limitações que nos impedem de transcender para uma condição de “quase” perfeição.

Com o aperfeiçoamento das capacidades humanas através da união com uma inteligência não-biológica (IA) para um estágio de “super humano” (übermensch, nos termos do filósofo Friedrich Nietzsche) em que as vulnerabilidades sucumbem, a felicidade plena ou o momento de nirvana podem ser atingidos. E por fim, acontece uma extensão da nossa zona empática.

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O filme Ex Machina aborda o tema inteligência artificial.

Um Olhar no Futuro da Humanidade

Imaginar como será a nossa vida, se o nosso trabalho ainda vai existir, e se tudo aquilo que conhecemos corre o risco de ser automatizado é um exercício que pode ajudar a anteciparmos um pouco desse futuro e nos prepararmos para o que pode acontecer. A IA hoje pode ser uma ferramenta útil e eficiente para realizar uma série de atividades mas, amanhã, ela pode ser o seu principal concorrente.

Será que os engenheiros, advogados, artistas, poetas, compositores, publicitários e até mesmo os desenvolvedores de software estão com suas profissões ameaçadas ou eles podem ser beneficiados ao usar estes sistemas para intensificar a sua performance no trabalho?

Se olharmos pelo lado otimista, o que consideramos uma super ameaça pode vir a ser um grande parceiro ou, ainda mais, pode até ser você mesmo porém, potencializado por uma inteligência artificial e outras tecnologias como a nanotecnologia, biotecnologia, etc.

Mas, isso é humano?

O homem confia e compartilha suas emoções com aquilo que ele conhece. Com o avanço da IA poderemos potencializar habilidades, aumentar nossa capacidade de conexão e até aperfeiçoar os sentidos do nosso corpo. No entanto, esse “upgrade” pode não ser aceito pela nossa sociedade dotada de preceitos éticos-morais. Talvez o maior desafio para a aceitação dos seres híbridos ou máquinas conscientes será desenvolver a vulnerabilidade, enfim, a imperfeição.

Algumas Reflexões

1- A capacidade de pensar, de se comunicar e de sentir é o que diferencia o ser humano de outras espécies. O sofrimento assim como outros sentimentos negativos poderão ser eliminados com a convergência de uma super inteligência emocional humana?

2- Como isso nos afeta como seres empáticos uma vez que, sem sofrimento, não haverá motivo para nos sensibilizarmos com a situação adversa?

3- Por outro lado, será que uma extensão da nossa condição humana através da IA e de outras tecnologias pode nos libertar de nossos pré-conceitos egóicos e aumentar nossa capacidade de compreender o que o outro está sentindo?

4- O avanço da inteligência artificial pode ser o berço de uma nova civilização de super máquinas e de seres híbridos e/ou a expansão da nossa civilização?

5- No dia-a-dia nos deparamos com várias situações de pré-conceito com pessoas diferentes da gente. Pensando no futuro, você estaria disposto a aceitar uma máquina consciente ou um ser híbrido?

6- Passamos boa parte das nossas vidas conectados com algum aparelho tecnológico. Será que já não somos um pouco híbridos?

Reflita sobre essas questões hoje. Amanhã, talvez, o ato de refletir poderá ser automatizado e uma super IA irá fazer isso por você…

Esse é o segundo artigo de uma série que tem como finalidade trazer situações reais em que a tecnologia está sensibilizando e construindo conexões afetivas entre pessoas, e também proporcionar momentos de reflexão para praticar o pensamento empático dentro do contexto abordado. Para ler o primeiro artigo sobre Empatia e Realidade Virtual, clique AQUI.

Crédito da imagem: British Institute of Posthuman Studies (BIOPS)

Bruno Macedo

Bruno é futurista e designer de Experiências de Futuro na Rito, empresa em que é co-fundador. Também é game-designer e principalmente um curioso nato que estuda desde neurociência à gamificação. Tudo o que faz procura alinhar 3 coisas: Empatia, Subversão e Diversão.

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