Perceber os sinais do futuro, os sinais daquilo que está por vir, é uma habilidade que os futuristas têm. Eles percebem e interpretam acontecimentos (sinais) que têm forte potencial de disrupção e não são percebidos pela maioria das pessoas, por estarem em uma circunstância marginal, ou seja, estão à margem.

Margem seria aquele lugar ocupado por hackers que estão experimentando coisas novas, acadêmicos testando suas ideias e tecnólogos construindo novos protótipos.

Os futuristas buscam padrões iniciais (ou pré-tendências), à medida que pontos dispersos na margem convergem e começam a se mover para o “mainstream”.

Como a maioria dos padrões aparecem “do nada”, os futuristas então observam, esperam e testam alguns padrões no intuito de encontrar aqueles poucos que vão evoluir realmente em tendências.

Cada tendência é um espelho no futuro, uma maneira de ver o horizonte temporal. O trabalho de forecasting (previsão) dos futuristas reconhece padrões no presente e reflete como essas mudanças irão impactar o futuro para sensibilizar pessoas e organizações na construção do que pode acontecer lá na frente – e para para que não sejam pegues de surpresa.

Forecasting é uma habilidade que pode ser aprendida segundo Amy Webb, autora do livro “The Signals Are Talking: Why Today’s Fringe Is Tomorrow’s Mainstream” (algo como “Os Sinais Estão Falando: Porque o Que Está na Margem Hoje é o Mainstream de Amanhã”).

No artigo que Amy publicou no MIT Sloan Management Review, ela explica um pouco dessas habilidades dos futuristas e porque a dualidade de pensamento é importante para essa profissão.

Para Amy, uma empresa que consegue enxergar tendências com antecedência suficiente para que possa agir, tem vantagem sobre as outras.

Futuristas nas empresas

Embora o futurismo seja uma disciplina acadêmica que existe há mais de 100 anos, Amy lamenta que poucas empresas tenham futuristas em suas equipes, cujo trabalho é bem diferente do que acontece na função de P & D.

Futuristas que trabalham dentro de organizações sabem que suas ferramentas têm um aproveitamento maior quando trabalhadas em grupo.

Amy também lembra que dentro de cada organização existem pessoas cuja característica dominante pode ser a criatividade ou a lógica.

Se numa equipe há pessoas muito criativas e outras muito lógicas, e não existe um facilitador, as pessoas criativas sentem que suas contribuições não são valorizadas, enquanto as “lógicas” – cujos talentos naturais consiste em gerenciar processos, projetar orçamentos ou mitigar riscos – sentem-se subestimadas porque não apresentam ideias novas e ousadas. É o que Amy chama de “dilema da dualidade“:

O dilema da dualidade é responsável pela ausência de um pensamento mais avançado em muitas organizações. Isso levou ao desaparecimento do BlackBerry na era do iPhone. Os criativos que usavam o lado direito do cérebro queriam fazer mudanças sérias no aparelho, enquanto os pensadores do lado esquerdo fixavam-se no risco e na manutenção da base de clientes do BlackBerry. O futuro da empresa dependia da capacidade de unir forças para prever as tendências e planejar o amanhã”.

A experiência da BlackBerry sugere que o forecasting de um produto, empresa ou indústria não deve nem delegado só a visionários inventivos nem mapeado inteiramente por pessoas que pensam mais com o lado esquerdo do cérebro. O forecasting precisa unir forças opostas, aproveitando tanto a imaginação quanto o pragmatismo.

Transformando o dilema em uma dinâmica

Segundo Amy, é possível superar o dilema da dualidade – e extrair o máximo das pessoas mais criativas e daquelas que são mais lógicas – no trabalho de acompanhar as tendências emergentes e prever o futuro.

Contra intuitivamente, é mais uma questão de motivar – em vez de desencorajar – as forças de cada lado.

No artigo do MIT, Amy cita uma técnica de brainstorming do Instituto de Design Hasso Plattner da Universidade de Stanford, que pode auxiliar uma organização a aproveitar as duas forças em igual medida, alternando entre ampliar (expandir) e estreitar (focar) o pensamento.

Quando uma equipe expande o pensamento, ela está inspirada, cria várias ideias, mapeia novas possibilidades, recebe feedbacks e pensa de forma ampla. Quando a equipe foca, essas ideias devem ser investigadas, examinadas e decididas.

Perguntas como essas ajudam: “E se?”; “Quem poderia ser?”; “Por que isso poderia importar?”; “Quais podem ser as implicações de nossas ações?”; “Qual opção é melhor?”; “Qual será a nossa próxima ação?”; e “Como avançamos?”

O funil de 6 etapas

O método de forecasting que Amy desenvolveu – influenciada por outros futuristas, mas diferente em análise e escopo – é um processo de seis etapas que ela refinou ao longo de uma década de pesquisa como parte do seu trabalho no Future Today Institute.

As quatro primeiras etapas concentram-se em capturar uma tendência, enquanto as duas últimas informam que ação você deve tomar.

No funil de Amy, a dinâmica de expansão e foco é tecida através desta metodologia de forecasting. Os seis passos exigem equipes para alternar entre um e outro, aproveitando as qualidades dominantes do cérebro direito e do cérebro esquerdo.

A cada passo, você passa a entender “o futuro de X” com mais clareza à medida que define uma tendência, determina a melhor ação que deve ser tomada e cria uma estratégia para ser testada. Quando você expande e foca, consegue superar o dilema dualidade.

Amy explica como usar essas maneiras complementares de pensamento:

1- Expanda na margem: Mantenha a mente aberta, lançando uma rede ampla o suficiente para recolher informações sem julgá-las. Isso envolve a criação de um mapa mostrando os “pontos” – ou conceitos-chave, empresas, lugares e pessoas – e as relações entre eles e arredondando o que você mais tarde se referirá como “the unusual suspects” (conjecturas incomuns). Você está num processo de brainstorming, forçando-se a pensar fora da caixa e tendo que considerar pontos de vista radicalmente diferentes.

2- Concentre-se nos padrões dos pontos: você deve restringir sua pesquisa na margem e descobrir os padrões escondidos em seu esboço para detectar possíveis tendências. Amy utiliza uma ferramenta chamada CIPHER, que é uma sigla e estrutura que identifica contradições (C), inflexões (I), práticas (P), hacks (H), extremos (E) e raridades (R).

3- Amplie para fazer as perguntas certas: Determine se um padrão é realmente uma tendência ou é algo passageiro. Você será tentado a parar de observar uma vez que detectou um padrão; Mas, logo aprenderá que a criação de contra-argumentos é uma parte essencial do processo de forecasting.

4- Foque para calcular o tempo: Interprete a tendência e assegure-se de que seja o momento certo. Aqui, não se trata apenas de encontrar a curva típica S – que mostra a adoção de uma tendência, mas não oferece uma visão completa de como os efeitos externos (como uma mudança na liderança do governo ou um desastre natural) poderiam afetar o seu desenvolvimento. À medida que as tendências tecnológicas se movem ao longo de uma trajetória, duas forças estão em jogo – “desenvolvimentos internos” dentro de empresas de tecnologia e “desenvolvimentos externos” dentro do governo, empresas adjacentes e similares – e ambos devem ser calculados.

5- Amplie para criar cenários e estratégias: Crie cenários para criar futuros prováveis, plausíveis e possíveis e também estratégias de acompanhamento. Cenários prováveis ​​assumem que não haverá mudanças significativas nas leis da natureza ou dos negócios à medida que uma tendência evoluir. Os cenários plausíveis contam com as leis da natureza, mas permitem outras facetas da nossa vida cotidiana – algumas que talvez não possamos imaginar agora – e podem mudar drasticamente. Entretanto, os cenários possíveis pressupõem que nada está posto – nem mesmo as leis da natureza – e que a vida tal qual a conhecemos poderá parecer radicalmente diferente do que ela é hoje. Esta etapa requer pensar sobre o timeline do desenvolvimento de uma tecnologia e quais seria suas reações emocionais a todos os resultados. Que estratégias e formas de pensar seriam necessárias para sua empresa responder à uma determinada tendência? Você dará a cada cenário uma pontuação e, com base em sua análise, criará uma estratégia de ação correspondente.

6- Foco para testar a sua ação: Mas e se a ação que você escolher para enfrentar uma determinada tendência estiver errada? Nesta etapa final, você deve certificar-se de que a estratégia que cria para enfrentar uma tendência vai levar ao resultado desejado, e que isso exige formular perguntas difíceis sobre o presente e o futuro. Estas perguntas devem confirmar que (1) a sua organização tem confiança na estratégia e irá apoiá-la; (2) a estratégia oferece aos seus clientes uma proposta de valor única; (3) você pode acompanhar a tendência e medir seus resultados; (4) a estratégia comunica uma sensação de urgência aos seus colaboradores e ao seu público-alvo; (5) você tem os recursos necessários para recalibrar a estratégia quando for necessário; E (6) a estratégia é resiliente – o que significa que é robusta o suficiente para absorver facilmente uma mudança.

Dualidade em ação

Qualquer organização com a intenção de sobreviver e prosperar no futuro deve praticar tanto a expansão quanto o foco em qualquer metodologia que usa para detectar tendências, e por isso é fundamental que cada equipe encarregada de observar e agir sobre as tendências deve incluir pessoas criativas e pessoas lógicas.

Organizações que aprendem a equilibrar cada hemisfério estão posicionadas de forma única para prever as tendências e desenvolver estratégias que funcionam.

Artistas e engenheiros

Amy acredita que talvez a melhor maneira de entender o poder do pensamento dual seria observá-lo dentro de uma empresa que foi deliberadamente composta de pessoas que pensam fortemente com o lado direito do cérebro e outras com o lado esquerdo.

Mentes criativas, como o escritor de quadrinhos Andy Lanning (Guardiões da Galáxia) e o artista gráfico Dave Gibbons (Watchmen), estão trabalhando em harmonia ao lado de engenheiros, como Jean-Yves Bouguet, que já esteve na equipe do Google (Street View).

Há engenheiros de software que sabem como digitalizar uma íris e engenheiros ópticos especialistas em inteligência artificia, que estão trabalhando em conjunto com designers de jogos e artistas digitais. Esse grupo faz parte da Magic Leap, empresa que está inventando um tipo inteiramente novo de computação – um mundo virtual perfeitamente interconectado com o nosso mundo físico, no qual poderemos um dia realizar nosso trabalho ou mesmo visitar amigos e parentes.

Amy compara:

Em vez de se concentrar na construção de mais um headset de realidade virtual ou um aplicativo de realidade aumentada, a Magic Leap está prevendo, de forma ativa, o futuro daquilo que é conhecido como realidade mista. Ela está minerando o que a margem está construindo, calculando a trajetórias de tendências de tecnologia adjacentes e desenvolvendo cenários para o que pode ser plausível no futuro. Não é só fazer o forecasting – é também construir a plataforma e os protótipos.”

Claramente, Magic Leap está construindo a base para um novo tipo de computação e uma nova era de interação homem-máquina, em que todas as tecnologias que muitas organizações estão começando a se familiarizar – como automação, redes neurais, AI e aprendizagem profunda – mudariam drasticamente à medida que interagimos com computadores e uns com os outros.

Para Amy, a Magic Leap é capaz de prever e inventar o futuro porque encontrou pontos de convergência entre os dois hemisférios, unindo aqueles que são hábeis em processos, organização e análise com aqueles que se especializaram em ficção especulativa, ideação e fantasia.

Na realidade, Amy nos lembra que o futuro é algo que estamos criando agora, no presente. Você pode desenvolver a capacidade não só de prever o que está por vir, mas de criar o seu próprio futuro desejável. Não espere.

Fonte: MIT Sloan Management Review

O Futuro das Coisas

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