O ano era 2020 e vivenciávamos a explosão da pandemia. Da noite para o dia, trabalhadores e empresas dos mais diversos setores da economia se viram obrigados a adaptar-se a uma nova lógica de trabalho, o trabalho remoto.

É verdade que, naquele momento, algumas empresas já conheciam bem os benefícios e desafios do trabalho à distância, mas para a esmagadora maioria, manter-se produtivo nessa nova lógica de trabalho (e em meio a uma Pandemia) foi bastante complicado.

Nesse momento, houve também a explosão dos recursos e ferramentas para videoconferência. Parecia bastante simples recriar a lógica do presencial no virtual, bastava ligar a câmera do computador ou do smartphone e resolver tudo sem sair do lugar. Até mesmo as festas de família e happy hour com os colegas de trabalho foram recriados a partir das videoconferências. Estávamos adaptados ao “novo normal” e tudo parecia bem, certo?

Na verdade, não. Começamos a sentir os efeitos nocivos do excesso de videoconferências, fenômeno que ganhou o nome de Zoom Fatigue. Dores de cabeça, olhos ressecados, dificuldade de concentração, baixa produtividade. Mesmo sendo um recurso interessante para aproximar as pessoas e facilitar a comunicação, passar 8h (ou mais, em muitos casos) do seu dia interagindo através da tela é bastante exaustivo para o nosso cérebro.

As causas do Zoom Fatigue vão desde o esforço cognitivo (precisamos prestar mais atenção numa interação social pelo vídeo do que face a face) até aspectos emocionais como o estresse de avaliação social gerado pela câmera. O fato é que, ao utilizar de forma indiscriminada esta ferramenta, na tentativa de solucionar o problema da distância, acabamos criando outros problemas.

Além do Zoom Fatigue, um outro aspecto da comunicação através das videoconferências começou a ser explorado e questionado: a qualidade da comunicação e das interações sociais promovidas através destas ferramentas. A partir do momento que uma boa parte do trabalho (e até da educação) é transferida para o ambiente virtual, é preciso garantir que não estão ocorrendo perdas significativas nestas interações, afinal, decisões importantes, aprendizados e processos de criação estão ocorrendo diariamente por meio desse recurso.

Algumas perguntas começaram a surgir: Que tipo de reunião pode ser realmente eficiente no ambiente virtual? Quais aspectos da comunicação podem ser prejudicados? Existem diferenças na performance do grupo quando trabalham juntos presencialmente ou virtualmente? Quais interações e atividades funcionam melhor face a face?

Aqui vou citar dois estudos recentes que contribuíram para responder parte dessas perguntas, embora seja importante ressaltar que este é um conhecimento em constante atualização, visto que estamos vivendo estes desafios a relativamente pouco tempo e, por isso, as pesquisas seguem a todo vapor.

Em 2022, um Estudo publicado na renomada revista científica Nature mostrou que a criatividade e proposição de novas ideias pode ser impactada pela modalidade da reunião. Os grupos que trabalharam presencialmente tiveram um número maior de novas ideias quando comparado com aqueles que trabalharam remotamente.

O estudo foi conduzido com voluntários estudantes universitários e com engenheiros de uma multinacional em cinco países. O desafio proposto para os estudantes era mais simples (como inventar formas de uso para o plástico bolha) do que o desafio dos engenheiros, que deveriam propor novos produtos e serviços para a empresa. Os resultados mostraram que o processo criativo é mais eficiente quando ocorre em interações face a face, possivelmente porque o alto esforço cognitivo inerente às interações virtuais acabam por dificultar a geração de novas ideias. Em outras palavras, o cérebro tem recursos limitados e a videoconferência acaba por demandar mais, sobrando menos capacidade cognitiva para outros processos, como a criatividade.

Um segundo resultado importante deste estudo foi o fato de que tarefas mais objetivas e práticas, como decidir em conjunto qual ideia deveria ser escolhida para ser desenvolvida, não apresentaram diferenças em sua efetividade se realizadas presencial ou virtualmente. Este achado é tão importante quanto o primeiro, pois indica que as reuniões por videoconferência podem ser excelentes ferramentas para tomada de decisão em grupo, especialmente quando os participantes estão alinhados e por dentro da pauta. Por outro lado, discussões mais complexas ou que envolvem o processo criativo tendem a ser mais eficientes no presencial.

Mais recentemente, outro estudo publicado na revista The Journal Of Neuroscience investigou o impacto da videoconferência no comportamento prosocial dos integrantes, aspecto importante para o trabalho em equipe e eficiência da comunicação. Os 72 participantes do estudo foram agrupados em pares e realizaram tarefas de resolução de problemas, criatividade e socioemocionais, em ambiente virtual ou face a face. Além de indicadores comportamentais, os cérebros dos participantes também foram analisados a partir de técnicas de neuroimagem. 

Os resultados deste segundo estudo mostraram que as reuniões virtuais foram caracterizadas por uma redução significativa na troca de interlocutor durante as interações entre pares. A troca de interlocutor é um indicador de interação social que está associado a outras métricas positivas, como cooperação e desempenho nas tarefas. Por este motivo, a redução deste indicador nas videoconferências mostra uma perda na qualidade da comunicação, quando comparado com a modalidade presencial.

Além disso, a análise obtida a partir da neuroimagem revelou padrões alterados de coerência entre cérebros durante as interações virtuais, que se mostraram negativamente relacionados com atitudes cooperativas. Os autores da pesquisa afirmam que a videoconferência afeta negativamente a qualidade das interações sociais e sugerem que o aprimoramento tecnológico das ferramentas de interação virtual será crucial para uma comunicação mais eficaz.

Se você é como eu, acredito que intuitivamente já havia sentido maior dificuldade para fazer trabalhos colaborativos, mais complexos e que exigem criatividade através das videoconferências. No entanto, sabemos que o uso dessas ferramentas e dessa modalidade de trabalho/reunião está cada vez mais presente em nossa rotina. Então, este artigo não é para te desanimar ou te desencorajar a reunir o seu time numa videoconferência, muito menos para advogar a favor do trabalho 100% presencial. Sabemos que nos dias de hoje o trabalho remoto é essencial para empresas e pessoas.

O objetivo desta conversa é embasar nossas decisões enquanto líderes e orientar equipes para que usem os recursos disponíveis de forma a potencializar os resultados, preservando nosso tempo, melhorando nossa performance e favorecendo nosso bem-estar e saúde.

Como andam as videoconferências por aí? Para te ajudar, seguem algumas dicas com base no aprendizado que podemos extrair desses estudos científicos:

1. Tenha cautela com o excesso de videoconferências: Além de causar o Zoom Fatigue, já percebemos que esta ferramenta reduz a qualidade da comunicação. Se sua equipe passa o dia todo saindo e entrando de reuniões virtuais, é bem provável que o tempo de cada colaborador esteja sendo utilizado de forma pouco eficiente, trazendo prejuízo para a performance, para o clima e para a satisfação e bem-estar de todos.

2. Defina de forma objetiva as pautas de cada reunião e reflita qual a melhor maneira de conduzir estas interações. Se a pauta for complexa e exigir criatividade do time, procure sempre que possível trazer a reunião para o presencial. Utilize as videoconferências para alinhamentos rápidos e tomadas de decisão mais práticas e objetivas, pois como vimos, esse tipo de interação não sofre prejuízos nas interações virtuais. Estimule os membros da equipe a refletirem sobre as reuniões que estão sob sua responsabilidade.

3. Deixe os momentos de integração e conexão emocional do time para o ambiente presencial. Felizmente saímos do contexto da pandemia e o contato face a face é bastante saudável para criar vínculos e promover senso de pertencimento para a equipe. Por isso, se for possível, tenha momentos presenciais para que todos interajam, se conheçam melhor e desenvolvam sua empatia e habilidades de comunicação.

Se sua empresa opera 100% remota e sua equipe tem pouca oportunidade de estar junto fisicamente pode ser interessante contar com a ajuda de profissionais especializados para facilitar encontros e workshops por videoconferência, com metodologias que podem minimizar os impactos negativos do ambiente virtual. Dessa forma, é possível favorecer a criatividade e a colaboração, mesmo com as limitações do ambiente virtual, embora nada substitua o bom e velho contato humano.

Ilustração: Yifan Wu

Thais Gameiro

Thaís Gameiros é Mestre e Doutora em Neurociência, especializada em Neurobiologia do estresse e bem-estar e sócia da Nêmesis Neurociência Organizacional.

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