Dentre os inúmeros futuros possíveis, uma coisa é inevitável: a inovação contínua. Muito além de uma cadeia de novidades, estamos falando de inovação como um ecossistema, onde e por meio do qual nos relacionamos com o mundo e entre nós mesmos.

Se já somos surpreendidos pela simples ideia de que em apenas em um dia geramos uma quantidade maior de dados do que em todo o século XX, mal podemos imaginar o volume de informação que nos aguarda em algumas poucas décadas.

Esse volume crescente de dados nos deixa uma questão, que já permeia todos os campos de estudo e atividades: quem serão as pessoas desse novo tempo?

Já nos vemos atordoados com a carga de notícias, memes e afins com os quais lidamos a cada segundo. Mesmo pessoas mais jovens sofrem da chamada ansiedade de informação. Como imaginar uma realidade onde essas noções se intensificarão?

Quando a informação e a tecnologia convergem, o que surge é um mundo ainda mais interconectado e uma realidade ainda mais complexa. A habilidade em decifrar essa realidade é o que definirá o ser humano em seu próximo passo evolutivo. Mesmo apoiados em tecnologias que permitem a coleta instantânea de dados e um processamento mais rápido de informação, o mindset exponencial, que permite uma interpretação válida desses dados e a busca por significado em meio a tantas novidades, será o grande diferencial entre as pessoas.

Mas a grande pergunta é: estamos prontos para isso? A resposta, inevitavelmente, nos leva ao centro de um dos grandes problemas atuais: estamos sendo educados para isso?

Um pulo rápido em muitas salas de aula nos leva a crer que a resposta é um triste e inevitável não. Muitos sistemas de ensino e escolas ainda são fundados sob um modelo de pensamento antiquado. Inovar em educação é um desafio: ainda hoje o status quo educacional é um resquício de pensamentos definidos no século XIX, para atender a demandas sociais muito diferentes das que enfrentamos hoje em dia.

Assim, repetimos uma instituição que, em essência, é incapaz de dialogar com o mundo de hoje. O velho modelo de sala de aula, cheio de normas e baseado quase que exclusivamente na famosa “decoreba” – memorizar dados, muitas vezes sem contexto ou propósito para reproduzi-los mais tarde – ainda dita grande parte do que é feito pelos alunos.

Enquanto isso, os alunos se mostram a cada dia mais desmotivados e desatentos, em função da incapacidade dessas escolas de se conectar com eles. Videogames e computadores, vistos por muitos pais e professores como vilões são a válvula de escape de uma geração criativa e conectada, que não se vê representada pela educação atual.

Antes de mais nada, precisamos entender que a educação é a capacidade de transformar dados em conhecimento, possibilitando às pessoas interiorizar esses conhecimentos e usá-los a seu favor, em diferentes contextos e possibilidades.

Dessa forma, a educação é uma interface, dinâmica e criativa: um meio pelo qual uma nova realidade é traduzida para pessoas que precisam compreendê-la. Todo processo de aprendizagem envolve uma jornada, a ideia de se ir de um estado A a um estado B por meio de uma transformação. Muitas formas são usadas para se educar: de histórias a brinquedos. Basicamente, a aprendizagem requer um meio que comunique uma bagagem de conhecimento a uma audiência.

Falar da educação como interface não é reduzí-la, mas entendê-la em sua essência. A partir do momento em que uma sala de aula, onde dezenas de alunos se veem desmotivados e incapazes de atender a uma determinada métrica, não são os alunos que estão falhando, mas sim os meios e métricas utilizados.

Em teoria, a educação deveria buscar ferramentas e tecnologias para seu próprio sucesso, de acordo com seu tempo e contexto, abraçando novas ferramentas como possibilidades de inovação. E essa habilidade em inovar é que vai ser essencial para garantir o futuro da educação como base criativa das pessoas que precisaremos ser e ter no futuro.

Hoje em dia, algumas iniciativas que propõem novas formas de ensino têm se destacado mundo afora. Em comum, a maior parte destas empreitadas envolve a tradução do ensino para uma linguagem que permita uma conexão duradoura com o estudante. Dentre as principais tendências, podemos destacar:

Ensino multidisciplinar: A quebras dos velhos modelos de aulas em cinquenta minutos ou uma hora. A ideia é percorrer todos os campos de conhecimento como uma jornada unificada, coerente, que não se prenda ao funcionalismo das velhas disciplinas.

Oficinas e ensino baseado em projetos: a noção de um ensino prático já é tendência há algum tempo. O próprio cérebro humano sempre teve a habilidade de aprender mais facilmente com um contexto que envolvesse a informação. Levar o conhecimento para fora da sala de aula e resolver problemas do mundo real é uma possibilidade que vem ganhando cada vez mais força.

Espaços Maker: Dar aos alunos ferramentas e ideias que os permitam testar e criar é uma chance de se educar frente aos desafios de um mundo em que a prática do “faça-você-mesmo” se tornou uma constante em empresas inovadoras no mundo todo. Os espaços maker – como o reconhecido Fab Lab Livre em São Paulo e a Joy Fab Lab, em Fortaleza – são locais onde se ensina, na prática, tecnologias de ponta como impressão 3D, programação e eletrônica, podendo se estender a assuntos mais específicos como Biotecnologia, dando instrumentação necessária para que os “makers” e estudantes criem e inovem em tempo real, com dinâmicas e vivências baseadas em projetos.

Gamificação: Em vez de tratar os videogames como inimigos, por que não aprender com eles? A lógica dos games, a ideia das fases, tentativa e erro e feedbacks imediatos conversam com um modelo de pensamento já habitual para a maioria dos alunos. Utilizar estes componentes, aliando o storytelling digital à jornada de aprendizado, é cada vez mais uma prática que tem mostrado resultados com alunos de diferentes idades e formações.

Ensino híbrido: Mesclar ambientes reais e virtuais, em busca da potencialização do ensino e das habilidades do aluno, permite à escola atravessar seus próprios limites, operando em uma dinâmica mais maleável e próxima do estudante. Aqui entram possibilidades como realidade virtual (VR), jogos online e EAD (educação à distância), que aproveitam as novas mídias para gerar engajamento entre os estudantes. Não se abandonam os ambientes analógicos completamente: a ideia é estender a prática do ensino por novos caminhos, abrindo novos horizontes de conhecimento.

Ensino personalizado: As recentes inovações em machine learning e inteligência artificial permitem o desenvolvimento de recursos capazes de oferecer a cada aluno uma jornada de ensino mais exclusiva e que leve em conta suas próprias características, potenciais e limitações. Cai por terra a noção de uma sala linear, onde se educa de uma só forma. Passa-se a respeitar a individualidade e a diversidade de mentes, que é quase impossível para um só professor abarcar.

Empreitadas já consolidadas na internet como Khan Academy, Udemy, Coursera, dentre outros, vêm investindo nesses recursos a fim de criar novas possibilidades dentro do mercado de educação.  Além disso, muitas startups têm criado núcleos de ensino já próximos da realidade das novas profissões. Selecionados algumas iniciativas que se destacam nesse novo cenário:

A Khan Lab School (KLS), um braço da Khan Academy localizada em Mountain View, Califórnia, usa recursos de machine learning aplicados a um software de ensino personalizado. Aqui, a educação funciona mais como uma mentoria, não dividida por idades ou graus, mas por diferentes tipos de habilidades que cada estudante precisa melhorar.

A Summit Sierra, cujo método para crianças criarem sua aprendizagem autodirigida foi descrito por Bill Gates como um dos meios mais efetivos para se educar crianças, estimula os alunos se revezarem em um ambiente fluido e compartilhado entre lições, desenvolvimento de habilidades particulares, conversas com mentores sobre seus futuros e um estímulo constante para resolução de problemas em grupo.

O Minerva Project se dedica a criar um ambiente colaborativo onde jovens vivem juntos, compartilhando ideias e projetos, aprendendo através de uma série de recursos online, desafios em diferentes plataformas e, especialmente, uma dedicação extrema a desafios reais e atuais do planeta.

A Ørestad Gymnasium, escola de ensino médio em Copenhagen, com uma arquitetura marcante que encoraja o estudo em espaços abertos e a troca constante, destaca-se por seu currículo baseado em mídias, orientado para o estudo em comunicação, artes e criatividade.

Estes são apenas alguns exemplos de boas ideias que foram postas em prática no mundo, prometendo transformar o modo como o ensino acontece. No Brasil, escolas criativas como a Perestroika, além de startups como Blox, Descomplica e Edools, estão fomentando uma trilha rumo a novos modelos e ideias em educação.

O caminho ainda é longo, mas a mudança é inevitável. Desta nova educação, depende um futuro onde ainda possamos ser relevantes e imprescindíveis.

Crédito da imagem da capa: monsitj / iStock

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Felipe Esrenko

Felipe é formado em comunicação e design, se especializou em storytelling e design educacional. É fundador da Monera, consultoria com foco em desenvolvimento de tecnologias de ensino e jornadas customizadas de aprendizado para empresas e pessoas.

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