Recentemente, postamos nas nossas redes uma visão gráfica de seis percursos (existem mais) que uma carreira pode seguir, extrapolando aquele padrão convencional em formato de escada.

Carreiras podem ser não lineares ou, por que não, multicarreiras. Minha carreira, por exemplo, é um híbrido esquisito entre “reorientação radical” e “retornando para o que você quer”.

Além desses seis caminhos, existem mais. Whitney Johnson em seu novo livro “Smart Growth”, aplica a Lei da Difusão da Inovação – teoria proposta em 1957 por Everett Rogers – para propor uma carreira em formato de S e uma curva de aprendizado também em S.

De certa forma, não vivemos mais uma época de escolhas binárias, onde não havia espaço para mais de uma escolha. Em nosso mundo cada vez mais fluido, a cultura do ‘OU’ vai dando lugar à cultura do ‘E’, onde interesses múltiplos podem coexistir e você pode ser quantos “E”s quiser. Charles Handy chamou isso de “carreira de portfólio“.

Mas, o que leva alguém decidir ingressar em uma nova área ou em um novo campo e construir expertise nele?

Somos uma mistura de várias coisas ao mesmo tempo – interesses, gostos, conhecimentos, e que mudam e evoluem. Algumas coisas fazemos buscando satisfação e prazer, outras fazemos por dinheiro, algumas por uma causa e outras para ganhar experiência.

Qualquer que seja a motivação, a questão é: como chegar lá. E esse “chegar lá”, significa desenvolver capacidades e habilidades naquela nova arena. É você ser capaz de perceber problemas, enxergar e avaliar oportunidades (visíveis e não visíveis) em múltiplos contextos e tomar decisões de forma ágil e embasada. É ter conhecimento crítico para aquela nova área, baseado na experiência que vai ganhando.

Essa capacidade / expertise / inteligência pode levar anos para ser desenvolvida e aprimorada; envolve esforço, erros e acertos. Mas não significa que seja tarde demais para uma pessoa mudar para uma área diferente.

Dorothy Leonard, professora emérita (William J. Abernathy) de Administração de Empresas da Harvard Business School, descreve em seu livro Critical Knowledge Transfer algumas etapas que podem acelerar esse “chegar lá. Em resumo, os passos são esses:

Primeira coisa é identificar quem são as melhores referências nessa sua nova área de interesse. Quem é realmente bom naquilo que você quer fazer agora? Quem é altamente respeitado por seus pares? Tem alguém na sua empresa assim? Em outras palavras, quem você deseja se inspirar ou “imitar”?

Qual a diferença de conhecimento entre você e essas pessoas que são referências? Use seu senso crítico para uma autoavaliação. Quanto esforço essa mudança de área exigirá? Se a lacuna de conhecimento for pequena, ótimo. Mas se você grande, Dorothy recomenda avaliar, de forma sincera, se você terá realmente disposição e determinação para prosseguir.

Se você resolveu prosseguir, é hora de ativar o “modo aprendiz”. Estudar por conta própria, conversar com colegas experientes, fazer cursos, experimentar novas formas de aprender. A aprendizagem autodirigida ajuda a chegar lá.

Pode ser difícil, mas tente conversar com especialistas. Enfatize que o tempo será mínimo. Algumas pessoas terão prazer em compartilhar conhecimento – especialmente se perceberem que você está fazendo sua lição de casa e já tiver algum conhecimento. Outras podem evitar essa conversa, seja por falta de tempo, por desconfiança das suas intenções, ou por qualquer outro motivo.

Aprenda a “puxar” conhecimento. Não espere que essas pessoas lhe passem o know-how que conquistaram em sua vida a muito custo. Se o conhecimento delas fosse fácil de transmitir, não valeria tanto. Portanto, se conseguir algum momento para interagir faça duas perguntas-chave: “Por quê?” e “Você pode me dar um exemplo?”

Observe-as em ação. Ao observar esses especialistas fazendo seu trabalho, você tem uma dimensão mais real dos desafios que eles lidam e entender como pensam e como resolvem problemas e propõem soluções Se esse especialista for alguém na empresa que você já trabalha, peça para participar de alguma reunião importante, acompanhe-o em conferências e visitas a clientes. Não é um processo passivo; você precisará se perguntar constantemente: por que ele ou ela fez isso? Qual foi o impacto? Eu teria feito diferente?

Busque mini experiências. O próximo passo é identificar oportunidades para experimentar de alguma forma o “novo conhecimento”, seja em ambientes, situações ou funções. Qualquer “mini experiência” que lhe dê um gostinho da vivência e da realidade daquela área será importante.

Dorothy sugere que, caso seu chefe esteja acompanhando (e apoiando) todo esse processo de mudança de área, ele/ela vai querer ver alguma evidência se realmente seu esforço está valendo a pena: “Um registro do que fez e aprendeu demostra compromisso e progresso. Se você tiver chance de assumir algumas tarefas nessa nova área, melhor ainda”.

Ilustração: Tanya Teibtner

Outra forma complementar aos passos recomendados por Dorothy seria transferir suas habilidades para a nova área de interesse. É o que Art Markman, PhD e professor de psicologia e marketing da Universidade do Texas, chama de habilidades transferíveis.

Certamente você é bom/boa em uma ou mais coisas, como por exemplo, saber facilitar conversas difíceis e resolver conflitos entre seus colegas. Algumas das suas habilidades podem estar relacionadas ao seu atual trabalho/função, mas outras, mesmo fazendo parte de sua rotina, talvez você nem esteja sendo reconhecido e reconhecida por elas.

Markman sugere que você avalie cuidadosamente suas habilidades, pois elas são pontos fortes que podem ser aprimorados e que podem direcionar o próximo passo em sua carreira. Veja como elas podem ser aplicadas em outros lugares.

Mas se você tem espírito empreendedor, em vez de ir para outro lugar ou outra área, pode focar em fazer sua empresa/negócio evoluir, sugere Markman. “Quase todos os setores vão mudar nos próximos 20 anos. Mesmo a educação universitária (que em muitos aspectos não mudou seus métodos nos últimos 500 anos) provavelmente sofrerá uma disrupção significativa na próxima década. Todas as indústrias passarão por mudanças radicais. Sua carreira dependerá de ficar à frente – se não criar – essas mudanças”.

O que Markman quer dizer é que todo negócio, quando não tem estratégias de adaptação e de transformação contínua pode ficar obsoleto ou sofrer disrupturas. O que fazer para evitar o mesmo na sua carreira? Foque nas habilidades transferíveis.

Lilia Porto

Economista, fundadora e CEO do O Futuro das Coisas. Como pensadora e estudiosa de futuros tem contribuído para acelerar os próximos passos para organizações e para uma sociedade mais justa e equitativa.

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