Nos últimos cinco ou seis anos, estive concentrada em trabalhar remotamente pelo fato de ter atuado como freelancer. No entanto, muitos freelancers optam por trabalhar em co-workings ou pelo menos estabelecer outro espaço que não a própria casa para se tornar seu escritório. Essa foi a premissa do WeWork, por exemplo, que se focou na formação de comunidade.

Com a pandemia, no entanto, não havia escolha e muitas empresas enfrentaram dificuldades não apenas na transição do in-loco para o remoto, mas também para lidar com manutenção de laços entre funcionários e mesmo a defesa da cultura empresarial. Apesar de diferentes plataformas oferecerem ajuda nesse sentido, como foi o caso das atualizações ao Microsoft Teams, não é sempre que ferramentas tecnológicas conseguem resolver problemas inerentemente humanos.

Uma recente pesquisa propõe como a crescente adoção do trabalho remoto tem sido inversamente proporcional à quantidade de projetos considerados disruptivos. Ainda que plataformas como o Miro ou Mural tenham como premissa, justamente, facilitar um espaço colaborativo remoto, os pesquisadores indicam que ainda não é o suficiente para que a potência do trabalho coletivo, in-loco, seja alcançada.

Por outro lado, limitar a contratação de profissionais que se encontram nas proximidades físicas de uma sede empresarial também parece ser um equívoco. Por conta de fatores como este, também seria contraproducente “jogar fora” todas as adaptações feitas durante a pandemia, o que significa que a pesquisa mencionada sugere um aprimoramento ainda maior das ferramentas online que possibilitam o trabalho colaborativo e remoto.  

Diante disso, algumas empresas resolveram abandonar de vez o escritório, muitas vezes devido às vantagens financeiras que isso implica. No entanto, nem sempre essa transição é feita de modo a conciliar as necessidades dos funcionários, o que significa que decisões como essa devem ser feitas de forma crítica e analítica, considerando o movimento da empresa nos últimos dois anos, e o quão desejável é isso para os funcionários remanescentes.

No caso da Microsoft, o trabalho remoto deu muito certo, mas agora com a possibilidade de retornar ao escritório, ficou a dúvida sobre os motivos, o momento e a necessidade de se ir ao local físico quando tudo já parece estar funcionando bem.

Com a incidência da Great Resignation, na qual profissionais qualificados decidiram abandonar seus empregos devido às desvantagens culturais e financeiras oferecidas pelas empresas, a Microsoft parece estar mais atenta ao que fazer para diminuir esse efeito. O vice-presidente corporativo da Microsoft, Jared Spataro, aponta em matéria na Fast Company que 51% dos funcionários que atuam no formato híbrido estão considerando se tornar totalmente remoto no próximo ano, o que indica que há um impasse na “atratividade” do escritório.

Apesar de a pesquisa mencionada anteriormente apontar para uma possível redução na disrupção de projetos feitos à distância, este também não parece ser um motivo convincente para fazer um trabalhador abandonar o formato híbrido ou totalmente remoto. Para a Microsoft, o segredo está na “intencionalidade”, isto é, quais são os reais motivos para se enfrentar o trânsito e ir para um escritório resolver o que talvez pudesse ser resolvido tão ou ainda mais facilmente de casa?

Conforme exposto por Jared Spataro, o problema está justamente nessa ambiguidade: mais de um terço dos funcionários sequer sabe quando ou por que ir ao escritório, enquanto que apenas 28% das organizações estudadas criaram acordos entre times, para que esse tipo de dúvida seja respondida internamente. Ou seja, é menos sobre impor uma regra da “diretoria” e mais sobre encontrar um meio termo entre seus pares, os que estão próximos de você no dia a dia e sabem melhor o quanto, como e quando precisam mais de sua presença física em um determinado momento.

Afinal, como concluído na matéria, criar um espaço de trabalho híbrido não é só sobre o espaço físico, mas sobre a criação de espaços mentais, sobre o compartilhamento de mentalidades que se entendam e se alinhem de acordo com as demandas. Nesse caso, líderes têm um papel fundamental em incentivar esse tipo de conexão sem, no entanto, forçar uma única solução, que seria o escritório. 

Junto à equipe de recursos humanos e de cultura empresarial, é possível de se pensar o que a empresa pode oferecer em termos de atividades que possam gerar mais engajamento ou até mesmo maior comunicação entre os times, em especial quando se trata de uma empresa com vários funcionários. Contudo, não vai ser um almoço pago pela empresa ou um coquetel que vai solucionar o problema do engajamento caso não haja, no dia a dia, a verdadeira flexibilidade de escolher onde estar e, principalmente, por que estar (daí envolvendo outros fatores como perspectiva de carreira, salário, benefícios etc).

Com a criação de uma maior contextualidade, isto é, a formação de um ambiente propício e específico para a fertilização de ideias e discussões, a intencionalidade por trás de ir ou não ao escritório fica mais evidente. Se algo não faz sentido online, provavelmente não fará sentido o suficiente para que alguém se desloque fisicamente. Isso significa que a criação de oportunidades e ambientes de contextualidade são fundamentais para a formação de comunidades e de intencionalidade perante o que se faz.

No caso da Stanford University, uma forma de criar esse engajamento foi através de uma espécie de votação em que os funcionários escolhiam sua preferência por panquecas ou waffles. Parece bobagem, mas é com uma simplicidade como essa que se pode conquistar uma maior abertura para o diálogo e formação de comunidade. Não é sobre criar competitividade (time panqueca versus waffle), mas sobre encontrar um ponto em comum para que as pessoas se sintam livres para dar sua opinião e inclusive compartilhar certas coisas que não teriam oportunidade. 

Fora isso, há também estratégias mais pontuais, como eventos recorrentes como reuniões periódicas que compartilham os números e os objetivos da empresa, reuniões em que times podem apresentar seus projetos internos, reuniões individuais com o gerente a cada quinze dias ou mensalmente, ou ainda retiros anuais através dos quais se pode viajar ou visitar locais atrativos com seus colegas de trabalho. 

Apesar de essas estratégias envolverem reação humana, é nas tentativas e erros que se encontra um caminho através do qual se desenvolve motivação. Não é sobre ser a melhor empresa do mundo ou seguir cartilhas motivacionais de coach, mas simplesmente possibilitar que um trabalhador se sinta relevante e visto. É menos sobre performance e mais sobre pertencimento.

Ilustração: Paul Windle

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Lidia Zuin

Lidia Zuin é Jornalista, pesquisadora, professora e futuróloga. Mestre em semiótica, doutora em artes visuais e escritora de ficção científica. Como pesquisadora acadêmica, possui textos publicados em periódicos e livros.

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