Movimentos sociais são ações coletivas conduzidas por grupos organizados da sociedade que defendem, demandam e/ou lutam por alguma causa social ou política. A maioria dos movimentos recebe um nome como forma de se identificar. Por exemplo, pessoas que lutam pelos direitos das mulheres se autodenominam feministas; aqueles que defendem a proteção ambiental, são os ambientalistas; movimentos como #MeToo são contra o assédio sexual; movimentos como “Black Lives Matter” chegaram até a mudar o processo criativo de empresas.

Cada vez mais, as causas sociais que uma empresa defende são levadas em conta pelos consumidores e pela força de trabalho. As causas apoiadas passam a refletir a identidade da organização.

Mas quando o objetivo é atrair aliados internamente, qual seria o impacto de usar esses “identificadores” ou “rótulos”? Eles mobilizam as pessoas ou causam algum tipo de conflito?

Um estudo realizado por Cynthia Wang e Brayden King, professores de administração e organizações na Kellogg, mostrou que, para aqueles que já apoiam a causa, palavras familiares energizam, mas para pessoas neutras, rótulos podem afastá-las. Cynthia, Brayden e colegas, conduziram experimentos online para avaliar o apoio a uma hipotética política de igualdade de gênero em uma empresa.

Nesses experimentos, entre as pessoas que se identificavam fortemente como feministas, ver a política nomeada como “feminista” aumentou a adesão. Mas o oposto aconteceu entre aquelas que não se consideravam feministas. Para este segundo grupo, uma estratégia para estimulá-las foi nomear a política de forma mais genérica, por exemplo, adicionando o nome da organização: “política do Google” ou “política do Walmart”.

“Você precisa ser muito flexível na linguagem que usa”, diz Brayden. “Não dá para presumir que todos os apoiadores em potencial serão ativistas de uma determinada causa. No entanto, não estamos dizendo para ter medo de ser ativista. É mais sobre como ser um ativista inteligente”.

Estudos anteriores buscaram saber como energizar a liderança para implementar novas políticas ou mudanças, como por exemplo, medidas que combatam o preconceito de gênero no momento da contratação.

Esse novo estudo buscou investigar como angariar o apoio de todo o corpo de funcionários. “O CEO pode dizer às pessoas o que fazer, mas precisa haver implementação. Se as equipes não concordarem com as mudanças, vão negligenciar o que precisa ser feito ou recuar”, diz Cynthia.

“Mudanças reais requerem níveis altos de apoio em toda a hierarquia de uma empresa” – Brayden King.

Da negatividade à neutralidade

Para entender como as pessoas reagiam a rótulos de movimentos, os pesquisadores conduziram experimentos na plataforma Amazon Mechanical Turk. No primeiro estudo, recrutaram 394 pessoas que estavam empregadas em alguma empresa. Os participantes responderam perguntas para determinar o quão fortemente se identificavam como feministas.

Em seguida, foi pedido que imaginassem que sua empresa tinha enviado um e-mail anunciando que o CEO queria implementar uma política para melhorar a equidade de gênero. Para metade dos participantes, o e-mail dizia “uma nova política feminista”; para a outra metade, simplesmente “uma nova política”.

Em seguida, os participantes foram indagados sobre a probabilidade de participarem de uma força-tarefa, de realizar pesquisas sobre práticas de diversidade e endossar abertamente a política em uma reunião com toda a empresa. Com base nas respostas, cada pessoa recebeu uma pontuação de 1 a 6.

Como já era esperado, pessoas que se identificavam fortemente como feministas demonstraram maior apoio à política quando esta tinha o nome do movimento. A pontuação média de apoio foi de 4,2 para a política “feminista” e 3,9 para a política não-rotulada.

Entre as pessoas que tinham pouca identificação com o movimento feminista, o efeito foi o oposto. O apoio foi em média 3,1 se a política não fosse rotulada e apenas 2,5 se a política fosse chamada de “feminista”.

Padrões semelhantes surgiram em outro experimento, no qual a política proposta visava o assédio sexual: parte recebeu a proposta como “baseada nos princípios do movimento MeToo” e parte, sem mencionar o MeToo.

Em ambos os estudos, o apoio das não feministas à política sem o rótulo não foi tão alto quanto o apoio das feministas. Mas Cynthia observa que a omissão do rótulo pareceu levar as não feministas de uma postura negativa para uma mais neutra. Embora elas não estivessem entusiasmadas com as mudanças, pelo menos não se opuseram à elas.

Implementação cuidadosa ou desleixada?

Para uma nova política ser implementada em uma empresa, há uma série de tarefas a serem executadas. O apoio de um funcionário pode ser medido não apenas pelo que “acha” sobre as mudanças, mas pela eficácia com que realiza tais tarefas. Alguém que não concorda com a política pode não se comprometer e fazer um trabalho desleixado.

Então, o “nome” de uma nova política pode afetar o desempenho das pessoas na execução das tarefas?

Para descobrir, os pesquisadores realizaram um experimento no qual 428 participantes receberam os nomes de 22 funcionários hipotéticos (com seus respectivos departamentos) que queriam ser mantidos informados sobre a política de igualdade de gênero. Os participantes receberam um diretório e, para cada departamento, tiveram que selecionar os endereços de e-mail desses funcionários. Os pesquisadores então contaram quantos endereços de e-mail cada participante adicionou corretamente às listas departamentais.

As pessoas que não se consideravam feministas tiveram melhor desempenho na tarefa quando a política não foi rotulada, cometendo em média um erro a menos ao selecionar os endereços de e-mail.

Por fim, os pesquisadores queriam testar se um rótulo/nome alternativo conseguiria mais apoio das não-feministas. Para este experimento, eles avaliaram os sentimentos dos participantes sobre seu empregador. Por exemplo, se consideravam os sucessos de sua empresa como sucessos seus também e se normalmente usavam o “nós” ou “eles” ao falar sobre a empresa.

Foi enviado o mesmo e-mail anunciando uma política de igualdade de gênero, mas para metade dos participantes foi mencionado o nome da empresa para a qual trabalhavam. Por exemplo, se a pessoa trabalhava na Starbucks, o e-mail chamava de “política da Starbucks”. Para a outra metade, a política foi chamada de “feminista”, sem o nome da organização.

Entre as pessoas que se identificavam fortemente com sua empresa, mas não como feministas, o apoio a uma política rotulada como feminista foi de 3,5. Quando o nome da organização foi citado à política, o apoio foi em média 4,2. Essa pontuação foi ainda maior do que a pontuação para participantes fortemente feministas que não se identificavam muito com seu empregador.

“Líderes devem considerar os “micro mecanismos” por trás da conquista de aliados”, recomenda Cynthia. “As pessoas quando pensam em movimentos sociais, imaginam algo grandioso. Precisamos entender a psicologia dos indivíduos que podem ajudar a implementar a mudança, uma pessoa de cada vez.”

Mensagem adaptada

Alguns ativistas podem ser contra à ideia de evitar usar o nome e a linguagem que é uma parte tão central de seu movimento. Brayden sugere pensar na mudança como dois processos paralelos. No discurso público, quando os ativistas estão criando legitimidade para sua causa, nomes específicos do movimento podem ser importantes. Mas em conversas particulares, com pessoas em uma organização, é melhor adaptar a mensagem para ressoar com o público.

Líderes e ativistas precisam considerar as tendências políticas dos seus colaboradores. “Você tem que construir uma coalizão. E pra isso, precisa entender que, às vezes, determinada linguagem fará mais efeito do que outra”, diz Cynthia.

Ilustração: Marion Fayolle

Lilia Porto

Economista, fundadora e CEO do O Futuro das Coisas. Como pensadora e estudiosa de futuros tem contribuído para acelerar os próximos passos para organizações e para uma sociedade mais justa e equitativa.

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