Desde o descobrimento do arquipélago de Galápagos, no século XVI, as tartarugas gigantes dessas ilhas foram caçadas intensamente para alimentação. Foi uma das espécies que ajudou Charles Darwin a formular sua teoria da evolução no século 19. Hoje, se tudo correr bem, elas estão livres da ameaça de extinção.
É a maior espécie de tartaruga terrestre, com mais de 130kg, podendo chegar a 400 kg. É também um dos animais de vida mais longa, podendo viver até 150 anos. Um exemplar mantido em um zoológico australiano, chamado Harriet, chegou aos 175 anos.
Existem riscos associados ao aumento do tamanho do corpo e à longevidade dos animais de forma geral, com potencial acúmulo de danos genotóxicos e citotóxicos pela simples razão de que, quanto mais células um corpo tem, maior a chance para o surgimento de mutações que podem levar ao câncer.
Qual seria então o segredo da longevidade das tartarugas-gigantes-de-galápagos?
Um estudo publicado na quinta (18), na revista Genome Biology and Evolution, fez descobertas particularmente intrigantes porque elas são notavelmente grandes e vivem por muito tempo então deveriam ter maior suscetibilidade ao câncer.
Os pesquisadores examinaram o genoma dessa espécie e descobriram que, em comparação com outras linhagens de tartarugas, as de Galápagos evoluíram para ter genes duplicados (cópias extras), o que pode protegê-las de doenças relacionadas ao envelhecimento, como o câncer.
Os experimentos mostraram que as células da tartaruga, em geral, são resistentes ao estresse oxidativo relacionado ao envelhecimento, enquanto as células da tartaruga gigante de Galápagos, especificamente, são sensíveis a esse estresse, o que pode dar a esta espécie a capacidade de mitigar os efeitos do estresse celular associado a aumento do tamanho corporal e à longevidade.
Quando expostas ao estresse, as células se autodestroem por meio de um processo de “morte celular programada”, chamado apoptose. A destruição de células danificadas antes que elas tenham a chance de formar tumores pode ajudar as tartarugas a nunca desenvolver o câncer, explica Vincent Lynch, PhD, professor de ciências biológicas da Universidade de Buffalo.
“No laboratório, podemos estressar as células de forma similar ao envelhecimento e observar como elas resistem. Acontece que as células da tartaruga de Galápagos são muito, muito boas em se autodestruir antes que o estresse tenha a chance de causar doenças como o câncer.” (Vincent Lynch)
As descobertas confirmam e baseiam-se nos resultados de pesquisas anteriores, como um estudo de 2018 que também usou análises genéticas para investigar a longevidade e doenças relacionadas ao envelhecimento em tartarugas gigantes.
Um dos principais focos do trabalho de Lynch é entender os mecanismos biológicos que ajudam animais grandes como as tartarugas de Galápagos a viver por tanto tempo. As descobertas têm implicações práticas. Os segredos escondidos no genoma da tartaruga podem um dia contribuir para a saúde e longevidade humana.
“Se você puder identificar como a natureza fez certas coisas – a maneira como algumas espécies desenvolveram certas proteções – talvez você possa encontrar uma forma de traduzir essas descobertas em algo que beneficie a saúde humana e trate doenças”, acredita Lynch. “Não vamos tratar humanos com genes de tartaruga de Galápagos, mas talvez possamos desenvolver um medicamento que reproduza certas funções importantes.”
“Estudos como este também demonstram por que a preservação da biodiversidade é tão importante”, alerta Scott Glaberman, PhD, autor principal do estudo e professor de ciência e política ambiental na George Mason University. “Espécies como as tartarugas gigantes de Galápagos provavelmente guardam muitos segredos para os principais desafios humanos, como o envelhecimento e o câncer, e até mesmo para as mudanças climáticas. Nosso estudo também mostra que há diferentes espécies de tartaruga, que agem e funcionam de maneira diferente, e se qualquer uma for extinta significa que uma parte única da biologia ficará perdida para sempre.”
Crédito da imagem da capa: Robert A. Cook