Recentemente, em conversa com um colega de profissão também cientista atuarial, fiquei sabendo que ele havia recebido um convite irrecusável para voltar a trabalhar na Superintendência de Seguros Privados (SUSEP) em um projeto chamado Open Insurance. Na hora me lembrei do Open Banking.
Faz tempo que o mercado segurador busca inovar e assim, de forma bem resumida, podemos conceituar Open Insurance como a aplicação das práticas de inovação aberta no mercado de seguros (open = aberto / insurance = seguros), do fornecimento de serviços e dados a parceiros, comunidades e startups, com o objetivo de criar novos serviços, aplicativos e modelos de negócios mais inovadores.
Um exemplo bem conhecido de inovação aberta é o Waze. O que seria dele, sem a colaboração dos usuários, interagindo e imputando dados para aperfeiçoar o algoritmo. Android e IOS da mesma forma.
Existe uma máxima que diz que “os dados são o novo petróleo”, mas quando nos deparamos com a possibilidade de termos dados cada vez mais abertos e acessíveis, eles deixam de ser petróleo e passam a virar commodities.
Em seu artigo “Open Innovation? Open Banking? Open Insurance? O que mais está por vir?”, Thiago Lima, fundador e CEO da LinkApi conclui que, diante da commoditização dos dados, o que terá valor mesmo serão os ecossistemas, e os algoritmos por trás da utilização desses dados. Como ecossistema, podemos fazer um paralelo com o conceito de comunidades, onde estão todos contribuindo na evolução de algo para busca de um objetivo comum.
Em relação ao Open Insurance, quando analisamos sob uma perspectiva mais técnica, o seu conceito principal vem da junção de arquiteturas de APIs abertas inseridas em aplicativos de seguros. A sigla API refere-se ao termo em inglês “Application Programming Interface” (em português, “Interface de Programação de Aplicativos”). APIs são um conjunto de rotinas e padrões de programação para acesso a um aplicativo de software ou plataforma baseado na Web. Uma API é criada quando uma empresa de software tem a intenção de que outros criadores de softwares desenvolvam produtos associados ao seu serviço. Existem vários deles que disponibilizam seus códigos e instruções para serem utilizados em outros sites da maneira mais conveniente para seus usuários.
Nesse contexto, o acesso às APIs abertas viabiliza o compartilhamento de dados entre diferentes seguradoras, Startups, Bancos, Insurtechs e outras organizações e então, na prática, ao adotar APIs abertas, as seguradoras podem experimentar, colaborar e alavancar soluções indo além de sites de comparação de preços.
A Revista Apólice, traz em um dos seus artigos, os três fundamentos principais do Open Insurance:
- Inovação Aberta (Open Innovation): dados e serviços ficam disponíveis para parceiros e outras startups, permitindo o desenvolvimento de novas soluções;
- Digital Experiences: gera experiências digitais inovadoras a partir do uso de serviços e dados das companhias de seguro. Esse movimento deve ganhar impulso com tecnologias como a Internet das Coisas, que possibilita veículos conectados e residências inteligentes;
- Novos Modelos de Negócios: as inovações e vivências digitais tendem a auxiliar e direcionar o avanço de novos modelos de negócios para seguradoras.
O fato é que, a partir de agora, as seguradoras precisam descobrir como gerenciar a enorme quantidade de dados gerada por seus negócios. Além disso, precisam também extrair ideias criativas desses dados, que geralmente ficam armazenados em vários lugares diferentes.
Já há todo um movimento nessa direção, inclusive o do Órgão Regulador, algumas vezes citado por engessar a inovação na indústria.
Através do compartilhamento de dados e APIs abertas existe a possibilidade da criação de novos canais de negócios cada vez mais competitivos, produtos mais inovadores, crescimento da base de clientes e melhoria da experiência deles.
Importante ressaltar que, tanto o Open Insurance quanto o Open Banking, surgiram somente com o advento da Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD. Embora algumas pessoas entendam que esta Lei criou dificuldades adicionais, na realidade, trouxe possibilidades.
A LGPD decidiu que o proprietário do dado é o consumidor, e a partir disso, tem que se criar um ambiente seguro para esse dado transacionar. A inovação aberta surge para, na pratica, viabilizar essa troca.
A partir da LGPD, com o consumidor sendo proprietário do seu dado e não mais a empresa, é ele quem vai permitir que esse dado transacione para quem ele bem entende, e isso traz benefícios diretos para a concorrência e desenvolvimentos de produtos mais personalizados (“tailor made“) para o consumidor. Por exemplo, em um ambiente aberto com dados amplos, via sistemas inovadores, se houver o compartilhamento de dados de telemetria, uma Insurtech poderá alertar o consumidor que de acordo com o perfil de uso do carro para ele é mais benéfico o uso de seguros intermitentes (por dia, por hora etc.) ao invés de um seguro com apólice anual.
A depender do consumidor, em um ambiente aberto, um mesmo bem/ativo poderá ser segurado por diferentes seguradoras para diferentes riscos como uma espécie de apólice agregada (wallet – uma espécie de Trivago ou Booking de seguros) elaboradora por um player que poderá analisar o perfil de uso do consumidor e mapear quais seguradoras oferecem as melhores coberturas.
Seguradoras que estiverem dispostas a adotar novas soluções, permitindo decisões mais rápidas, ganharão vantagem competitiva no mercado. É um mundo novo que surge.
Vamos acompanhar a evolução desse conceito.
Bem-vindas e bem-vindos, o futuro (aberto) é agora!
Crédito da imagem da capa: Hedvig Insurance