Toda interação humana envolve comunicação. Irremediavelmente, a comunicação interpessoal não acontece por acaso; ela é resultado do esforço intencional de compreensão e conexão. Mas, na realidade, por natureza e pela história colonizadora, somos comunicadores ruins, com tendência a acreditar que nossa expressividade é melhor do que é. Por isso, eu não me canso de dizer que a comunicação é o atributo que herdamos, que merece e necessita de atenção e aprimoramento constante.
Fato é que a comunicação ocupa uma parte essencial em nossas vidas e, no entanto, é, frequentemente, ignorada como recurso de desenvolvimento. Falar o mesmo idioma, conhecer ortografia e gramática, ou mesmo utilizar técnicas de oratória, não são garantias de eficiência comunicativa, pois, para além disso, o que determina a eficiência é a compreensão dos sentidos e as nuances de conexão entre quem se comunica, decorrente da combinação entre autoconsciência e intencionalidade.
Portanto, a comunicação consciente e intencional é uma forma inteligente de interação em que a presença e o envolvimento promovem a conexão entre pessoas, onde as escolhas linguísticas e afetivas despertam no outro atenção e reciprocidade.
ENTRE TODOS NÓS, HÁ LINGUAGEM
Vale lembrar que sempre que o enfoque são as relações interpessoais há de se considerar as camadas de complexidade sobrepostas que conjugam seres diversos e plurais, contextos e culturas distintas. Isto é importante porque esclarece que não existem fórmulas prontas ou padrões uniformes, são as experiências que se transformam em repertório.
A teoria lacaniana explica que nos constituímos indivíduos por uma base tríplice que se apoia nas experiências vividas, nos atravessamentos ideológicos e nos mecanismos psíquicos, sendo a linguagem o nosso elo (intra e interpessoal), que permite intercambiar ideias, pensamentos e sentimentos para, então, criarmos vínculos. A visão psicanalítica estabelece que a linguagem é muito relevante para a construção e manutenção dos relacionamentos.
Neste processo, seja explicando, ou compartilhando, as pessoas interagem em razão de transmitir e apreender ideias, histórias, sensações e consequentemente, inspirar modos de pensar, agir e viver. O desejo de promover o que é importante para nós faz parte de nosso instinto de vida, expresso por meio da linguagem e das formas de dizer.
Porém, não é um percurso linear, os desejos se chocam e os relacionamentos são também motivadores de conflitos e tensões – o que eleva a importância de investirmos em comunicação consciente e intencional, sobretudo em contextos profissionais, cuidando para mitigar riscos de relações insustentáveis e prejudiciais ao desempenho coletivo.
Neste artigo proponho focar em pontos que nos auxiliam a perceber como o constructo da competência comunicativa pode abrigar a consciência e o reconhecimento das intenções de comunicação, abrindo oportunidades para que boas relações sejam fomentadas.
O QUE FAZ A COMUNICAÇÃO CONSCIENTE?
Comunicar-se com clareza exige a introspecção como antecessora da expressão verbal. O elo entre o mundo interno e externo nos permite enxergar os interesses de forma precisa e declaratória – a legítima assertividade. Assim, as conversas são delineadas com perspectivas de confiança e envolvimento, que predizem à compreensão, mesmo quando não se encontra consenso.
O fluxo das relações interpessoais prevê turnos de falas e turnos de escutas, mas, não se pode negar que é a escuta que promove o engajamento, pois, todas as pessoas desejam e necessitam ser ouvidas. Escutar é gesto de presença e interesse, fundamental para bons relacionamentos.
Falar o suficiente e ouvir o bastante é o exercício de equilíbrio que torna as relações mais empáticas, respeitosas e sustentáveis. Ou seja, quando se tem clareza das intenções das conversas – reuniões, feedbacks, apresentações, vendas etc. – as perguntas conduzem os interlocutores e validam as expectativas sobre os interesses expostos; além de permitir que os diálogos sejam construtivos e inclusivos. A disposição para interação abre espaço para que as palavras mudem a direção, sem que o foco das discussões seja perdido.
Há também a linguagem corporal, onde a postura, os gestos e as expressões não verbais são tão ou mais importantes do que as palavras ditas, porque sinalizam ressoadores, positivos e negativos, da interação. Essa leitura pode reforçar ou atrapalhar o vínculo, mas, sobretudo, a linguagem não verbal permite que o vínculo seja cuidado. Saber reconhecer e entender os estilos de comunicação, as mudanças culturais ou mesmo o humor imediato é valioso tanto no aspecto da identificação, quanto da adaptação da comunicação.
Por essa linha evidencia-se o poder sensorial da comunicação. Com destaque para a observação e a escuta ativa como estruturantes da competência comunicativa, traduzidas como notável presença nos relacionamentos e possibilidades de descobertas sobre as mensagens subliminares (a mensagem por trás da mensagem).
SER INTENCIONAL É PREZAR PELO CUIDADO NAS RELAÇÕES
Pelo exposto, meu intuito é afirmar que a qualidade das nossas relações impacta desde as interações menos formais e, ganha robustez quando apreciada pelo prisma da qualidade das realizações profissionais. Isto é, relações seguras e potentes, realizações positivas e consistentes, reiterando que a prática da comunicação consciente e intencional é benéfica para os profissionais que transmitem mais segurança em suas relações, para as empresas que desfrutam de reputação mais eloquente e para a sociedade que se edifica sobre espaços mais colaborativos, sustentáveis e equânimes.
Finalmente, proponho atenção aos argumentos apresentados, convertendo-os ao convite à ação, para que o desejo por relações profissionais saudáveis seja nutrido pelo exercício diário da comunicação consciente e intencional.
Referências:
1.Behlau M e Barbara M – Comunicação Consciente – Rio de Janeiro, RJ: Thiemi Revinter, 2022.
2.Chieppe, Daniela Cais – Comunicação Interpessoal e Promoção de Saúde: interface da Fonoaudiologia Organizacional In: Ferreira, L. Andrada e Silva, M. e Giannini, S. Distúrbio de Voz Relacionado ao Trabalho. São Paulo: Roca, 2015. p.331 – 335.
3. TED: Julian Treasure: 5 maneiras de escutar melhor
5. Los 5 axiomas de la comunicación: ¿cuáles son?
6. COMUNICAÇÃO INTERPESSOAL, QUEM É VOCÊ?
Foto da capa: Osmo Kyttala / Sony World Photography Awards 2015