O mundo está em alerta diante do novo Coronavírus. A propagação da COVID-19, o aumento do número de infectados e o receio das pessoas em contaminarem-se e causarem um colapso no sistema de saúde as leva ao isolamento social, seguindo recomendações e orientações do Ministério da Saúde e da OMS.

Este isolamento temporário induz, naturalmente, ao uso mais intenso de smartphones, seja no uso de aplicativos, ou para pesquisas informacionais, pesquisas de intenção comercial, buscas transacionais ou simplesmente conversas em grupos de WhatsApp. Esse uso intensivo de celulares e computadores pode afetar o comportamento humano, inclusive o comportamento digital.

Hoje, 70% da população brasileira está conectada à internet, com perspectiva de chegar a 80% em 2021. Essa conexão digital, torna a telemedicina ou a telessaúde, como uma das tecnologias mais promissoras nessa crise pandêmica. Na realidade, abre uma nova era para os cuidados com a saúde. Um smartphone ou um computador conectado à internet podem colocar o paciente em contato direto com o médico, eliminado totalmente os riscos de enfrentar um pronto socorro lotado, repleto de vírus e bactérias no ar. Obviamente, caso a pessoa não tenha um quadro de saúde considerado grave.

A telessaúde, no contexto da COVID-19, tem papel essencial, pois pessoas com sintomas leves podem se consultar em suas próprias casas – evitando potencialmente infectar outras pessoas, ou a si próprios se não tiverem o vírus -, liberando o acesso em hospitais para casos críticos, relacionados ou não ao coronavírus.

Tecnologias de informação e comunicação para promover a saúde à distância, incluindo orientações e educação – tem sido utilizadas em surtos como Ebola e Zika, fornecendo um conjunto de ferramentas e aplicativos para impedir a disseminação, como video-consultas com profissionais de saúde, e chatbots automatizados que podem indagar sobre os sintomas e dar conselhos em tempo real. Nesse caso, é essencial que os chatbots sejam atualizados com frequência, pois os surtos evoluem rapidamente e as situações são extremamente fluídas.

Mas, não é somente em casos de surtos e pandemias. Sistemas de saúde do mundo todo, públicos ou privados, enfrentam uma tensão constante entre a necessidade de atender bem os pacientes e orçamentos quase sempre deficitários. A telemedicina, nesse contexto, emerge como uma ferramenta que permite agilidade, praticidade com um custo mais baixo. Dúvidas e problemas mais simples podem ser resolvidos rapidamente sem que haja necessidade de deslocamento do paciente ou de um profissional até um estabelecimento de saúde. Inclusive, Dr. Eric Topol vem afirmando há anos, que o futuro da Medicina está no smartphone. É esse aparelho que irá democratizar o acesso à saúde para qualquer pessoa, da rica à pobre, daquela que vive em centros urbanos à outra que vive em áreas remotas.

Chao Lung Wen, chefe da disciplina de telemedicina e professor da Faculdade de Medicina da USP, defende que a telemedicina valoriza a humanização:

Quando se evita que pessoas humildes tenham que pegar condução por horas para ir ao hospital para um atendimento de 15 minutos. Quando desafogamos os prontos-socorros para que a equipe médica possa duplicar ou triplicar o tempo disponível para cuidar de pessoas que precisam de atenção. Quando se minimiza erros de condutas pela disponibilização de uma rede de especialistas. São muitos os casos em que a telemedicina humaniza.”

As alternativas e discussões sobre a telemedicina até haviam evoluído, do ponto de vista regulatório, mas continuam adormecidas e, portanto, desatualizadas há anos e com várias opiniões divergentes entre os próprios médicos.

A revogação da Resolução nº 2.227/18 pela Conselho Federal de Medicina (CFM) colocou os médicos brasileiros numa situação vulnerável. De fato, o que temos hoje é uma norma vigente do CFM, desde 2002, que regulamenta a Telemedicina de forma genérica (e por muitos considerada obsoleta).

Entretanto, o tema volta a ser foco das atenções. A prova é que, o CFM acaba de liberar, excepcionalmente, até que dure a pandemia do Coronavírus, a telemedicina. Afinal de contas, a luta tem sido de todos.

Embora a telemedicina ainda não seja totalmente regulamentada no Brasil, o uso do aplicativo é permitido para orientações ou em caso de urgências. Vale ressaltar que parte fundamental da comunicação médica se dá pela observação, pelo toque, pela percepção do tom de voz e pela capacidade de empatia envolvida nessa relação entre o médico e o paciente. Possivelmente um dia, um algoritmo de machine learning seja capaz de perceber as sutilezas do olhar e/ou o tom da voz.

Sobre epidemias, existem 5 possibilidades de atuação da telemedicina já utilizadas em casos extremos de crise:

1- Teleconsulta

Oferece orientação médica online para pacientes assintomáticos no sentido de informá-los dos riscos e alertá-los quanto à prevenção de alguma doença ou epidemia.

2- Telemonitoramento assintomático

Após a teleconsulta, monitorar remotamente a saúde de pacientes assintomáticos.

3- Telemonitoramento sintomático

Monitorar, integralmente, casos sintomáticos que precisem de isolamento.

4- Teleperícia

Nesse caso, quando a infraestrutura médica local não possui a perícia técnica para o diagnóstico ou tratamento de um paciente, se faz necessário o apoio de centros de referência, com profissionais especialistas disponíveis para acompanhar o caso do indivíduo.

5- Teleassistência para hospitais em quarentena

Fornecer o acompanhamento a hospitais e unidades de saúde em quarentena, para que, com base na telemedicina, os pacientes que não podem acessar a unidade continuem recebendo apoio médico.

Nessa crise pandêmica, o CFM autoriza o uso da telemedicina em: a) teleorientação (para orientar e encaminhar pacientes em isolamento); b) telemonitoramento (monitoramento de condições de saúde de pacientes); e c) teleinterconsultas (troca de informações entre médicos).

Apesar das barreiras impostas à telemedicina, esse é um mercado que irá crescer de US$ 38 bilhões (2019) para US$ 130 bilhões até 2025, em função do desenvolvimento das redes de telecomunicações, das oportunidades de mercado em áreas remotas, e pela contínua integração dos serviços de saúde ao mercado de TI. O Brasil deve movimentar, nos próximos cinco anos, entre US$ 7 a US$ 8 bilhões.

Barreiras (barriers) e facilitadores (enablers) para o uso da telemedicina destacados por especialistas, por número de países declarantes.

Fonte: Oliveira Hashiguchi, 2020, em Beyond Containment: Health systems responses to COVID-19 in the OECD.

A telemedicina já é amplamente aceita em países desenvolvidos como suporte a tomada de decisão e apoio ao acesso em áreas remotas. A telemedicina não irá substituir os cuidados médicos primários, secundários e terciários. A medida da CFM, em caráter de excepcionalidade diante da pandemia, já é um passo promissor. Mas é preciso um marco regulatório no Brasil que guie a pratica da telemedicina, dos aplicativos, dos wearables e de todos os demais componentes que fazem parte da Medicina Digital, criando padrões mínimos que facilitem o acesso ao atendimento aumentado a resolubilidade para o benefício do paciente.

Coautores: Nazareno Maciel Junior, atuário, perito, mestre em Economia, atuando no segmento de Saúde Suplementar; Lília Porto, fundadora do O Futuro das Coisas; e Dr. Leonardo Aguiar, fundador da Laduo, cocriação em Saúde.

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Nazareno Maciel Junior

Nazareno é atuário, perito, palestrante, escritor e mestre em Economia. Atua no segmento de Saúde Suplementar. É membro do Instituto Brasileiro de Atuária (IBA), do Comitê Nacional dos Atuários do Sistema Unimed e do Comitê Permanente de Solvência da ANS.

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