Este é o primeiro post de uma sequência de quatro sobre o futuro do trabalho e do emprego na era tecnológica, e o impacto que isso tem na economia e na sociedade.

O Fórum Econômico Mundial (WEF), em Davos, que tem como tema  “A Quarta Revolução Industrial”  projetou que com a expansão das tecnologias emergentes no setor produtivo estima-se uma perda líquida de 5 milhões de empregos em 2020, em quinze economias que correspondem 67% da força de trabalho global. Os setores administrativos e de escritório serão os mais afetados.

O relatório do WEF sobre o futuro do trabalho ainda destaca que todas as indústrias terão algumas funções automatizadas, sendo que algumas terão mais impacto do que outras:

Setores da Medicina impactados pelo avanço da telemedicina, seguidos pelos setores de energia e indústria, construção e extração, entretenimento, e ainda, o setor jurídico.

Já os setores de negócios e operações financeiras, gestão, computação, arquitetura e engenharia, vendas, educação e treinamentos juntos terão um crescimento de 2 milhões de empregos.

Haverá uma maior demanda por especialistas em big data, desenvolvedores de Inteligência Artificial (IA) e outras tecnologias emergentes e, também, por vendedores especializados.

As mulheres poderão ser as mais afetadas com o declínio dos setores administrativos, escritórios e vendas.

A matemática segundo o relatório de Davos será: a mulher irá perder cinco empregos para ganhar um, enquanto os homens ganham um emprego perdendo três.

Projeções como do WEF provocam um mix de sentimentos. Alguns céticos e protegidos na sua “zona de conforto” provavelmente irão ignorar e continuar com o pensamento “take for granted” (dar como certo) que tudo vai continuar como antes, enquanto outros ligarão o sinal de alerta, e tentarão ao máximo modificar a realidade em sua volta para construir o seu próprio futuro.

Sabemos que o mundo segue uma lógica de informação abundante e crescimento exponencial da tecnologia, a qual torna-se mais convidativa para as organizações do que a mão-de-obra humana.

Hoje, a tecnologia é a grande catalizadora das mudanças na economia mundial e vai expandir para um nível sem precedentes nos próximos anos.

O Fim do Emprego com a Expansão Tecnológica

O fim do emprego 4(Crédito: WOODLEYWONDERWORKS/FLICKR sob a licença CC BY 2.0)

A tecnologia já foi motivo de revoltas dos trabalhadores. Mas, também impulsionou a produtividade nas empresas. Embora possa causar o desemprego, ela serve também como um estimulante para o renascimento de um novo sistema.

A curva tecnológica se desenvolve em uma escala que no inicio aparenta ser linear, mas ganha proporções exponenciais, quebrando diversos paradigmas como aconteceu na genética com o sequenciamento do genoma, e com a Inteligência Artificial (IA) a qual promete promover uma das maiores revoluções nos próximos anos.

Por ser uma tecnologia adaptativa, a IA pode ser usada para resolver problemas de grande proporções. O seu desenvolvimento é motivo de preocupação para qualquer indústria e para a sociedade.

A tecnologia ameaça assumir o protagonismo no setor produtivo transcendendo a sua utilidade apenas como “meio” para uma autonomia quase total em algumas tarefas.

A automatização vai abranger tanto máquinas inteligentes como também a computarização de tarefas complexas nas organizações. A sua adesão pelas empresas trará vantagens em função da incapacidade dos trabalhadores humanos em algumas tarefas, como também redução de custos e direitos trabalhistas (a maquina não recebe salário). Para estes trabalhadores será necessário o surgimento de novas formas de trabalhos para evitar uma catástrofe.

A escala é massiva: quase metade (47%) de todos os trabalhos nos EUA e 35% na Grã-Bretanha estarão suscetíveis à automatização pela tecnologia nas próximas duas décadas de acordo com a The Economist e pesquisadores da Universidade de Oxford.

A Consultoria McKinsey relatou que 140 milhões de trabalhos poderão ser automatizados pela tecnologia até 2025. O grande desafio para o crescimento econômico nos próximos anos, é como desenvolver novos empregos que abasteçam uma população maior que a que temos hoje, e principalmente não provoquem um declínio grande na classe média, uma vez que com uma classe média fraca, o consumo geral também diminui, e a economia “sai dos trilhos”.

Já a comunicação “sem fronteiras” que possibilita o acesso às diversas ferramentas na Internet, mesmo em países emergentes e sub-desenvolvidos, abriu oportunidades de trabalhos bem remunerados – o offshoring – o que vem afetando a mão de obra especializada local, uma vez que com o avanço tecnológico, o custo-benefício de contratar mão de obra externa vai ser bem melhor.

A expansão tecnológica pode acarretar em um aumento no desemprego e outros problemas para a população. Porém, também representa uma nova era que abre espaço para um trabalho conectado com valores pessoais, capacidades, e propósito.

Agora baseado nos dados acima, vamos fazer uma pequena dinâmica de empatia:

Tente se colocar no lugar daquelas pessoas que você vê exercendo alguma atividade produtiva durante o seu trajeto diário.

O que elas estão fazendo segue uma lógica repetitiva, previsível, com pouco propósito e pouco sentimento envolvido?

Ou são atividades em que elas precisam ser criativas, ter pensamento crítico, habilidades sociais e sensibilidade?

Você  consegue olhar para esta atividade e imaginar, ela sendo feita de forma mais eficiente e rápida por uma máquina?

Ascensão do Trabalho com Propósito

“Olá, o que você faz da vida? ou “O que você é?”

São perguntas comuns que representam a nossa personalidade e nossa essência como ser humano para a sociedade em geral. As respostas mais comuns são, “Eu sou engenheiro, curso Direito, trabalho no banco”. O mais incrível é que em algumas situações a pessoa não é feliz com essa profissão, mas já se tornou internalizada, símbolo da identidade daquela pessoa.

Se o propósito de tudo o que fazemos é com o objetivo de alcançar a felicidade, porque fazemos algo que não sentimos prazer e felicidade?

O emprego remunerado como conhecemos hoje data trezentos anos e foi criado com o objetivo de maximizar a produção das fábricas segmentando em várias etapas um trabalho repetitivo, exaustivo e sem propósito.

Esse emprego foi posteriormente consolidado no modelo tradicional das escolas para preparar as pessoas para o mercado, e perdura até hoje, fomentando a ideia que para ser bem-sucedido precisa se formar em uma boa faculdade e ter um bom emprego.

Felizmente, algumas iniciativas e mentalidades contemporâneas junto com a evolução e ingresso massivo da tecnologia no mercado estão “aposentando” o modelo empregatício.

Essa transição está sendo movimentada intensamente pelos milennials (jovens nascidos entre 1980 e 2000) os quais buscam trabalhos que “espelhem” as sensações transmitidas em seus momentos de diversão.

Millenials
Millenials (Creative Commons)

Esses jovens buscam mais liberdade para criar, ambientes flexíveis, criativos e colaborativos, e estruturas mais fluídas e horizontais. Eles vão fundo, não se importam em envolver-se em diversas iniciativas, desde que haja amor, propósito e como sustentar esse sonho.

Eles fazem parte de uma nova filosofia de trabalho que apostam na transição do “work to” (trabalhar para) para o “work with” (trabalhar com) dando mais que incentivos, mas significância e preparando essa pessoa para um crescimento orgânico com um suporte da própria empresa, como uma rede, dando liberdade para a pessoa ser criativa e arriscar.

Este tipo de empresa prefere crescer “para os lados” e manter uma estrutura enxuta, está sempre disposta a fazer o bem para o mundo, mas sem caridade, e sim, com ações de impacto social. Esta empresa irá moldar a nova economia sem ter “empregados”, mas com potenciais empreendedores.

Já o novo tipo de profissional engloba todo o universo organizacional (ele, empresa e colegas) de forma afetiva, menos egóica e empática.

Organizações empáticas vão precisar de pessoas com maior capacidade de integração e sensibilidade em diferentes tipos de ambientes e situações.

Assim, eu tenho um pensamento otimista em relação às mulheres, mesmo com a projeção de curto prazo da WEF que pode afetá-las principalmente. A longo prazo, penso que as mulheres terão vantagem já que possuem característica mais marcantes com o que se projeta para a “era das máquinas”, como empatia e inteligência coletiva.

“O argumento padrão é que a diversidade é boa e você deve ter tanto homens como mulheres no mesmo grupo. Mas, o que os dados mostram que quanto mais mulheres, melhor o resultado.” Thomas Malone, Professor do MIT e autor do The Future of Work.

Mas, será que a intolerância da mentalidade machista que pode influenciar diretamente a presença feminina no mercado estaria dificultando o progresso da nossa sociedade?

O Fim do Emprego no Brasil?

“O gigante está acordando” – O Brasil vive um momento instável na sua economia, política, e entendimento sobre valores. O que pode ser um ponto positivo para uma nova mentalidade combinada com a capacidade de se reinventar, criar e inventar que tem o brasileiro.

Hoje, nós temos várias iniciativas empreendedoras com “um propósito” fazendo a diferença em todo o país. São organizações que têm como finalidade lucrar fazendo o bem.

Embora a grande maioria dos brasileiros esteja preocupada em relação ao futuro do país, e se o seu emprego estará garantido ou se a sua empresa estará em pé amanhã, eles não foram ensinados na escola a adaptarem-se aos novos sistemas e estruturas.

O mundo vai precisar de pessoas mais sensíveis, lógicas e adaptativas às mudanças no presente e futuro.

A adaptação ao “desconhecido” (o que está por vir) é a melhor forma de superar as incertezas do mercado.

“Desenhamos nossos negócios em cima de variáveis que acreditamos serem de crescimento óbvio no futuro. E, quando as crises rolam, nossos modelos se aceleram porque as pessoas acabam antecipando a transição” – Roberto Martini, CEO da FlagCX.

As crises oferecem grandes oportunidades para aqueles que não vivem em mundo distópico nem utópico, mas que as aproveitam para reinventar modelos de trabalhos que se tornaram obsoletos durante o período de crise. A estabilidade aparenta ser o presságio de uma vida tranquila, sendo que o sistema é dinâmico e sufoca o plano estático.

Você estaria disposto a abrir mão da sua felicidade plena por uma vida estável e confortável? O seu emprego hoje te faz querer “pular de felicidade”, dançar, sorrir?

A era das máquinas pode ser uma transição muito impactante em todos os setores, principalmente os mais suscetíveis à automatização parcial ou total.

No entanto, eu enxergo uma oportunidade para trabalhos mais conectados com o propósito humano, livres de burocracias e hierarquias, onde recompensem a inteligência coletiva aliada com a criatividade e permitam a construção de estruturas adaptáveis que fomentem mudanças positivas no mundo.

Compartilho da visão da Marina Gorbis, CEO do Institute for The Future sobre um futuro de trabalho on-demand:

“No futuro, algoritmos vão fragmentar as atividades de um trabalho específico e com o amplo acesso a dados sobre habilidades, capacidades e experiências anteriores podendo distribuir em uma plataforma de acordo com o potencial de cada um.”

A ideia da Marina, que foi introduzida em seu livro Nature of Technology, sobre uma economia, sociedade coletiva, que compartilha dos mesmos recursos, possibilita um maior número de interações e negócios. A SocialStructuring Economy tem como base indivíduos empoderados pelas ferramentas tecnológicas que aceleram as decisões e mudanças no ecossistema.

Neste tipo de sociedade, este “coletivo inteligente” pode superar pela sua flexibilidade e baixo custo as grandes organizações.

Ambientes Caórdicos

O jovem que escolheu uma carreira por influência da mentalidade conservadora ou super protetora da família e da sociedade, ou aquele que ainda está decidindo por qual caminho vai seguir, deve ter em mente que o “amanhã” será governado por ambientes caórdicos (caos + ordem), subversivos, divertidos, fluídos, flexíveis em que prevalece a inteligência coletiva, as lideranças rotativas, conduzido por algoritmos e plataformas e que tem como base na ampla conectividade e no propósito. O mundo amanhã vai ser completamente diferente do que é hoje.

PropósitoSteve Jobs representa a ideia de ter um trabalho com propósito (Cortesia: Softpedia)

Como vimos durante o texto a evolução tecnológica vai abrir diversas oportunidades para trabalhos com coeficiente humano, e de certa forma instaurar a lógica normal das coisas. A máquina faz a parte “chata” do trabalho e o ser humano faz aquilo que lhe dar prazer. Na verdade, tudo faz mais sentido desta forma.

O ser humano pode perder sua utilidade em atividades que não foram desenhadas para ele, mas as características inatas (criatividade, intuição, etc) serão de grande utilidade por um longo tempo.

Não há mais espaço para ser platéia enquanto a tecnologia se desenvolve em uma escala rápida e ameaça ser a protagonista do setor produtivo no futuro, embora ainda haja pessoas e empresas que irão continuar resistindo e defendendo o modelo tradicional, até como uma forma de manter seus valores e princípios vivos.

É difícil acreditar que tanto as projeções de Davos, Oxford e McKinsey estejam completamente equivocadas, apesar de não podermos mensurar com exatidão qual o impacto da expansão tecnológica no setor produtivo em todo o planeta.

Bruno Macedo

Bruno é futurista e designer de Experiências de Futuro na Rito, empresa em que é co-fundador. Também é game-designer e principalmente um curioso nato que estuda desde neurociência à gamificação. Tudo o que faz procura alinhar 3 coisas: Empatia, Subversão e Diversão.

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