Lewis Carroll, precursor da literatura nonsense, jamais imaginou encolher Alice no País das Maravilhas, numa escala tão surreal.
Pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) sim!
Eles desenvolveram um método que, pela primeira vez, produz objetos 3D detalhados em nanoescala de praticamente qualquer forma e estrutura desejada, inclusive usando uma variedade de materiais, desde metais ao DNA.
“Essa é uma maneira de colocarmos praticamente qualquer tipo de material em um padrão 3D com precisão em nanoescala”, comemora Edward Boyden, professor do Y. Eva Tan em Neurotecnologia e professor de engenharia biológica e de ciências cerebrais e cognitivas no MIT.
Essas estruturas minúsculas poderão ter aplicações em diversos campos, da ótica à medicina e à robótica. A técnica utiliza equipamentos que muitos laboratórios de biologia e ciência de materiais já possuem, tornando-a amplamente acessível para pesquisadores que queiram experimentá-la.
Estruturas 3D complexas em nanoescala, produzidas por encolhimento. (Imagem: MIT / Daniel Oran)
Boyden, que também é membro do McGovern Institute for Brain Research e do Koch Institute for Integrative Cancer Research, é um dos principais autores do artigo, que foi publicado na Science, semana passada. Os outros autores são Adam Marblestone, Daniel Oran e Samuel Rodriques.
As técnicas que existem hoje para criar nanoestruturas são limitadas. Os padrões de gravação em uma superfície com luz podem produzir nanoestruturas 2D, mas não funcionam em estruturas tridimensionais. Só é possível criar nanoestruturas tridimensionais adicionando camadas umas sobre as outras gradualmente e esse processo é lento e complicado. Embora existam métodos que possam imprimir objetos em nanoescala diretamente em 3D, eles estão restritos a materiais especializados, como polímeros e plásticos, que não possuem propriedades funcionais necessárias para muitas aplicações. Além disso, só é possível gerar estruturas auto-sustentadas.
Para superar essas limitações, Boyden e seus alunos decidiram adaptar uma técnica que seu laboratório tinha desenvolvido há alguns anos para imagens de alta resolução de tecido cerebral. A técnica, conhecida como expansion microscopy, envolve o tecido em um hidrogel para, em seguida, expandi-lo, permitindo imagens de alta resolução usando um microscópio. Centenas de grupos de pesquisa em biologia e medicina estão usando essa técnica pois permite a visualização em 3D de células e tecidos com um hardware comum.
Ao reverter esse processo, os pesquisadores descobriram que podiam criar objetos em larga escala envoltos em hidrogéis expandidos para depois encolhê-los em nanoescala, uma abordagem que chamam de “implosion fabrication“.
Segundo o professor Ed Boyden, muitos laboratórios de pesquisa já possuem o equipamento necessário para esse tipo de fabricação. (Crédito: os pesquisadores)
Assim como fizeram para a “expansion microscopy”, os pesquisadores usaram um material bastante absorvente feito de poliacrilato, comumente encontrado em fraldas, para ser o suporte para o processo de nanofabricação. Esse suporte é banhado em uma solução que contém moléculas de fluoresceína, que se ligam a ele quando são ativadas pela luz laser.
Usando microscopia de dois fótons, que permite a segmentação precisa de pontos dentro de uma estrutura, os pesquisadores anexam moléculas de fluoresceína a locais específicos dentro do gel. As moléculas de fluoresceína atuam como âncoras que podem se ligar a outros tipos de moléculas que são adicionadas.
“Você prende as âncoras onde quiser com a luz e depois pode prender o que quiser à essas âncoras”, explica Boyden. “Poderia ser um ponto quântico, poderia ser um parte de DNA, poderia ser uma nanopartícula de ouro.”
É como uma fotografia de filme – uma imagem latente é formada pela exposição de um material sensível em um gel à luz. Então, você pode desenvolver essa imagem latente em uma imagem real, anexando outro material, como prata, depois. Desta forma, a “fabricação de implosões” pode criar todos os tipos de estruturas, incluindo estruturas não conectadas e padrões multimateriais ”, diz Oran.
Uma vez que as moléculas são anexadas nos locais certos, os pesquisadores encolhem toda a estrutura adicionando um ácido. O ácido bloqueia as cargas negativas no gel de poliacrilato para que elas não há repelência, causando a contração do gel. Usando essa técnica, os pesquisadores podem reduzir os objetos em 10 vezes em cada dimensão (para uma redução geral de 1.000 vezes no volume). Essa capacidade de encolher não apenas permite maior resolução, mas também possibilita a montagem de materiais em um suporte de baixa densidade. Isso permite acesso fácil para modificação e, posteriormente, o material se torna um sólido denso quando é reduzido.
Atualmente, os pesquisadores podem criar objetos que são em torno de 1 milímetro cúbico, com uma resolução de 50 nanômetros. Há uma troca entre tamanho e resolução: se os pesquisadores quiserem fazer objetos maiores, cerca de 1 centímetro cúbico, eles podem alcançar uma resolução de cerca de 500 nanômetros. No entanto, essa resolução poderia ser melhorada com mais refinamento do processo, dizem os pesquisadores.
Possíveis aplicações
A equipe do MIT está agora explorando possíveis aplicações para essa tecnologia, e antecipam que alguns dos primeiros aplicativos podem estar na óptica – como por exemplo, lentes especializadas que poderiam ser usadas para estudar as propriedades fundamentais da luz. Essa técnica também pode permitir a fabricação de lentes menores e melhores para aplicações como câmeras de celular, microscópios ou endoscópios, dizem os pesquisadores. No futuro, os pesquisadores dizem que essa abordagem poderá ser usada para construir eletrônicos em nanoescala ou robôs.
Muitos laboratórios de pesquisa já possuem o equipamento necessário para este tipo de fabricação. “Com um laser que você encontra em muitos laboratórios de biologia, é possível escanear um padrão, depositar metais, semicondutores ou DNA e reduzi-lo. Há todos os tipos de coisas que você pode fazer com essa técnica”, simplifica Boyden. “A democratização da nanofabricação pode abrir fronteiras que ainda não podemos imaginar.”
Crédito da imagem da capa: Ed Boyden et. al.