0Acredite: você lê, em média, o equivalente a 174 jornais a cada 24 horas. O número, que obviamente assusta, é cinco vezes maior do que em 1986, segundo estudo da University of Southern California. São quase 12 horas diárias consumindo dados e absorvendo mais de cem mil palavras. Ao fim do dia, fomos bombardeados por mais de 33 gigabytes de informação, de acordo com a pesquisa How much information 2009, da Berkeley University. Quando a semana se encerra, é como se tivéssemos lido uma bíblia inteira. E não estamos apenas passivamente inseridas e inseridos nesse tsunami de mensagens. Uma pessoa produz aproximadamente seis jornais de informação diariamente. Para fins comparativos: 25 anos atrás, o conteúdo gerado por cada indivíduo não ultrapassava duas páginas e meia. Entre 2014 e 2016, criamos um volume de dados maior do que a quantidade produzida ao longo de toda a história da humanidade.
O fato é que a internet revolucionou a comunicação. Se por um lado garantiu maior acesso e suposta democratização, por outro formou um emaranhado de dados desprovidos, muitas vezes, de qualquer sistematização e organização. Eles estavam lá, mas eram confiáveis? Estavam soltos ou eram apresentados em contextos? Descentralizada e aberta, não hierárquica e interativa: as benesses estão aí para quem quer ver — e não são poucas. Mas e os problemas? Os desafios?
“Com o passar do tempo, tornou-se perceptível o crescimento exponencial da Internet, pela expansão de sua massa de informações, juntamente com o número de usuários que dela participam no processo de ‘inteligência coletiva’. A facilidade de acesso e publicação de documentos na rede desencadeou novas possibilidades quanto à construção de um grande acervo informacional. Tal fenômeno a princípio é positivo, mas no decorrer do tempo esse processo originou um grande problema na rede pelo fato de conduzir e fomentar o processo de explosão informacional gerando grandes conflitos, uma vez que o excesso de informações parece ser pior que a sua falta”, explica o mestre em Ciência da Informação Claudio Henrique Schons, em artigo intitulado O volume de informações na internet e sua desorganização: reflexões e perspectivas.
Tomemos como exemplo negativo a Cybercondria. A síndrome contemporânea é caracterizada pelo mau uso de informações especializadas presentes na internet a respeito da saúde e do bem-estar. Sem critério na interação com o mundo virtual, os hipocondríacos encontram na rede mundial de computadores uma forma fácil de se autodiagnosticar e, mais seriamente, de se medicar sem orientação médica. Você certamente deve conhecer alguém que digita sintomas aleatórios em buscadores e que acredita piamente que pode estar sofrendo dessa ou daquela patologia. Tem vezes, como nestes casos, que informação não é poder — potencializa riscos.
O estudo The deep web: surfacing hidden value, de Michael Bergman, compilou algumas das grandes problemáticas referentes à superabundância informativa. Entre elas estão o crescimento exponencial do número de informações disponíveis, a forma caótica como são disponibilizadas informações e documentos, e a indexação isolada e estática de cada página HTML — desconsiderando que diversos sites estão inter-relacionados.
E por mais que já pareça muito, talvez essa seja apenas a ponta do iceberg. Se mergulharmos ainda mais na problematização, veremos que nem toda informação disponibilizada e consumida vira, de fato, conhecimento. Aliás, eis, aí, o calcanhar de Aquiles da aprendizagem: submersos numa overdose de dados, acabamos infoxicados. O termo, criado originalmente pelo físico espanhol Alfons Cornella, em 1996, é autoexplicativo e dá nome à síndrome contemporânea caracterizada pelo excesso de informação. Hiperconectividade, dispersão, dificuldade de concentração, estresse e ansiedade são alguns dos sintomas recorrentes.
Vivemos recentemente um caso típico de infoxicação: a pandemia global fez da COVID-19 assunto corriqueiro. Era ligar a TV, entrar no Instagram, abrir o e-mail, dar aquela checada no WhatsApp ou olhar um site de notícias e, pronto, lá estavam elas, as informações sobre o vírus. Erradas, corretas, meias-verdades, fake news: na enxurrada de dados a respeito do tema, não havia peneira que desse conta de separar instantaneamente o joio do trigo.
Como, então, curar os conteúdos e fazer uma gestão adequada do conhecimento? Se a informação é pontual e tem, normalmente, vida curta — como a cotação do dólar, a previsão do tempo, uma notícia da editoria de Cidades, por exemplo —, o conhecimento não tem limitação temporal. Ao adquirirmos conhecimento, garantimos a possibilidade de ressignificar tudo que está ao nosso redor. Ganhamos novas aptidões, outras habilidades. Agregamos informações e criamos uma linha narrativa que faz com que nosso olhar para o mundo se expanda.
Vale pontuar: quando falo em aprendizagem, não estou focando especificamente na educação tradicional, aquela composta por cadeiras escolares e universitárias. Refiro-me a lifelong learning — jornadas educacionais que duram toda uma vida, que nunca cessam, que não têm linha de chegada. Nesse contexto, há de se reiterar o papel social das empresas na formação constante de seus colaboradores. Se queremos nutrir criatividade, disrupção e inovação, se queremos que os profissionais estejam alinhados ao espírito do tempo e que sigam atentos às demandas contemporâneas, é fundamental que as corporações sejam a ponte entre o excesso de informação e o conhecimento. Entre dado isolado e pensamento crítico. Daqui pra frente, espertas as empresas que apostarem em fomentar espaços de aprendizagem mais focados na personalização da trilha de cada colaborador/ aluno. Porque, agora, sabemos com toda a certeza: a disponibilidade de informação não tem nada a ver com aumento automático de conhecimento. Podemos fazer parte da estatística de 3,5 bilhões de buscas diárias realizadas no Google. Ou podemos ir além. Qual a sua escolha?
Ilustração da capa: Farfor
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