Na busca por novos tratamentos para a obesidade e doenças relacionadas, cientistas vêm dando total atenção ao papel que nossos genes desempenham. A esperança é que um dia medicamentos possam ser desenvolvidos para ativar ou desativar genes-chave.
Um novo estudo, publicado no journal PLOS Genetics identificou grupos de genes que causam ganho de peso e outros que impedem a obesidade, jogando luz sobre as complexas interseções entre obesidade, alimentação e nosso DNA.
A obesidade se tornou uma epidemia, impulsionada em grande parte pela alimentação rica em calorias e carregada de açúcar e frutose. Estilos de vida cada vez mais sedentários também desempenham um grande papel. Mas nossos genes também desempenham um papel importante, regulando o armazenamento de gordura e afetando a forma como nossos corpos queimam alimentos como combustível. Ao identificar os genes que convertem o excesso de comida em gordura, é possível inativá-los com medicamentos e desvincular o excesso de comida à obesidade.
A relação entre genes e obesidade envolve muitas incógnitas, mas os cientistas estão começando a descobrir coisas novas. Estudos recentes ligaram a obesidade às diferenças estruturais no cérebro das crianças e às bactérias em nossos intestinos, enquanto o sono irregular também pode desempenhar um papel, por meio da disfunção metabólica.
Um estudo de 2017 identificou uma mutação genética em ratos que os faz engordar; outro estudo, de 2018, mostrou como a alteração de um gene relacionado à obesidade poderia evitar que camundongos sujeitos a dietas ricas em gordura ficassem acima do peso.
Também há estudos interessantes identificando exercícios mais eficazes para aqueles com predisposição genética para a obesidade. Outro amplo estudo de 2018, envolvendo mais de 700.000 pessoas, revelou um conjunto de 14 variações genéticas ligadas à obesidade e ao índice de massa corporal (IMC).
Avanços importantes como esses jogam luz sobre o papel que os genes podem desempenhar na regulação do armazenamento de gordura e na maneira como nossos corpos usam os alimentos como combustível. E os cientistas continuam buscando distinguir os genes associados à obesidade daqueles que a causam.
Neste novo estudo, geneticistas identificaram centenas de genes associados à obesidade – o que significa que os genes são mais ou menos prevalentes em pessoas obesas do que em pessoas com peso saudável. O desafio é determinar quais genes desempenham papéis causais, promovendo diretamente ou ajudando a prevenir o ganho de peso.
“Conhecemos centenas de variantes genéticas que têm maior probabilidade de aparecer em pessoas que sofrem de obesidade e outras doenças”, diz Eyleen O’Rourke, da Universidade da Virgínia, autora do novo estudo. “Mas ‘maior probabilidade de aparecer’ não significa quem causam a doença. Essa incerteza é a principal barreira para explorar o poder da genômica populacional para identificar alvos para tratar ou curar a obesidade. Para ultrapassar essa barreira, desenvolvemos um pipeline automatizado para testar simultaneamente centenas de genes para um papel causal na obesidade.”
Ao desenvolver essa nova abordagem, os pesquisadores usaram um verme conhecido como Caenorhabditis elegans (C. elegans), que chega a no máximo 1 milímetro de comprimento, compartilha mais de 70% de seus genes com humanos e tem sido a espinha dorsal de descobertas científicas importantes. Nesse estudo, alguns vermes foram colocados em uma dieta não saudável rica em frutose para servir de modelo para a obesidade, enquanto um grupo de controle recebeu uma dieta regular.
Utilizando aprendizado de máquina (machine learning), eles examinaram 293 genes previamente associados à obesidade em humanos, buscando identificar aqueles que causam ou evitam diretamente a doença nos C. elegans. Esta análise levou os pesquisadores a relatar 14 genes que podem levar à obesidade em ratos com dietas ricas em gordura. Entre os que o promoviam estava o KAT8, cuja atividade reduzida parece aumentar a síntese de ácidos graxos. Outro foi o TCF7L2, cujo esgotamento aumenta os níveis de glicose e se correlaciona negativamente com o IMC.
A equipe também identificou três genes que podem ser silenciados nos vermes para prevenir o aparecimento de obesidade induzida por dieta. Eliminando esses genes, eles provaram ser possível prevenir o acúmulo de excesso de gordura, apesar das dietas ricas em frutose, possibilitando que os vermes vivessem mais tempo e com mais saúde. O bloqueio de um desses genes em ratos com obesidade provou prevenir o ganho de peso, melhorar a sensibilidade à insulina e reduzir níveis de açúcar no sangue.
“Nossa primeira rodada de experimentos descobriu mais de uma dúzia de genes que causam e três genes que previnem a obesidade. Prevemos que nossa abordagem e os novos genes que descobrimos irão acelerar o desenvolvimento de tratamentos para reduzir o fardo da obesidade” – Eyleen O’Rourke
Muitas outras pesquisas deverão ser realizadas antes do desenvolvimento de medicamentos que visem esses genes ou outros semelhantes, à medida que os cientistas trabalham para entender melhor os mecanismos e verificar a segurança dessa abordagem em humanos. Eles acreditam que essa nova abordagem oferece um caminho promissor.
“As terapias antiobesidade são urgentemente necessárias para reduzir o fardo da obesidade tanto nos pacientes quanto no sistema de saúde”, diz O’Rourke. “Nossa combinação de genômica humana com testes de causalidade em animais modelo promete alvos antiobesidade com maior probabilidade de sucesso em testes clínicos, e ainda, menores efeitos colaterais.”
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