Os cientistas estão mais próximos de criar membros bio-artificiais para transplante em seres humanos.
Harald Ott, pesquisador e cirurgião no Hospital Geral de Massachusetts, é o pai da primeira perna bio-artificial de um ratinho, cultivada em laboratório – uma perna que circula sangue e responde a vários estímulos.
Certamente é uma boa notícia para cerca de 470 mil brasileiros (Censo-2010) que foram vítimas de amputações causadas por acidentes ou por motivo de doença, como a diabetes.
Embora possamos estar longe dos transplantes para os seres humanos, Ott e especialistas em regeneração asseguram que essa pequena perna é um passo em direção ao futuro de membros bio-artificiais.
O desafio
No relatório, publicado no Journal Biomaterials, os pesquisadores do MGH relatam como conseguiram construir membros bio-artificiais de ratos, com tecido vascular e muscular funcionando.
Ott explica que construir um substituto biológico para um membro tão complexo como uma perna é particularmente um desafio.
Membros complexos possuem músculos, ossos, cartilagem, vasos sanguíneos, tendões, ligamentos e nervos – cada um deles tem de ser reconstruído e exige uma estrutura de suporte específica chamada “matriz”.
O processo de criação da perna bio-artificial
Ott e sua equipe utilizaram uma técnica chamada de “des-celurização“. Eles removeram células vivas do membro de um doador morto (outro rato), preservando os nervos da matriz principal.
Após a remoção completa de restos celulares – processo que levou uma semana – restou uma matriz isenta de células que fornece a estrutura para todos os tecidos compostos do membro a ser desenvolvido.
A equipe então “re-celeluriza” o membro injetando nele células vasculares e células musculares, que irão respectivamente formar os vasos sanguíneos e os músculos.
O membro é então um colocado dentro de um bio-reator, projetado especialmente para que ele se desenvolva durante duas semanas.
Após cinco dias em cultura, o membro recebe estimulação elétrica para acelerar ainda mais a formação de músculo.
Alguns enxertos de pele são feitos na perna incipiente e, após duas semanas, a perna é retirada do bio-reator e os cientistas a conectam a um rato (devidamente anestesiado).
A equipe observou que os sistemas vasculares dos membros transplantados nos ratos rapidamente se encheram de sangue. O sangue continua a circular.
Próteses e membros biônicos
A perda de uma extremidade do corpo (como uma mão ou um ante-braço), tem um impacto muito grande na vida de uma pessoa.
Próteses mecânicas são tecnicamente sofisticadas, mas apenas substituem parcialmente a função fisiológica e a aparência estética.
Muitas próteses e membros “biônicos” não são capazes de realizar as mesmas funções complexas que tem um membro real.
Em relação aos transplantes, embora médicos já tenham transplantado com sucesso mãos e até mesmo pernas de doadores, os receptores precisam tomar drogas que suprimem o sistema imunológico pelo resto de suas vidas para impedir que seus corpos rejeitem os novos membros.
Os riscos e os efeitos colaterais do transplante e a imunossupressão a longo prazo representam um dilema ético significativo. Essa questão motiva o avanço científico para viabilizar outras alternativas.
O Futuro
Para Harald Ott, recriar nervos dentro de um membro e reintegrá-los no sistema nervoso de um receptor é um dos próximos desafios que precisam ser enfrentados.
“O próximo passo será replicar o nosso sucesso na regeneração muscular com células humanas a outros tipos de tecidos, como ossos, cartilagem e tecido conjuntivo.”
Ott prevê que daqui a uma década, médicos irão testar membros humanos cultivadas em laboratório, em um programa de remodelação de órgãos futurista.
Membros bio-artificiais com base em matriz extracelular nativa e células do próprio paciente poderiam ser produzidos sob demanda e não exigiria imunossupressão após transplante.
Dado o risco de recriar algo tão complexo como uma parte do corpo, Ott disse que é cauteloso. “O que você jamais quer é expor um paciente a um risco desnecessário para um pequeno benefício”, diz ele. “Membros artificiais podem ser funcionalmente e esteticamente preferíveis aos biônicos, mas não se eles ameaçam a saúde de um paciente.”
Ott diz que realmente espera que com esse experimento bem sucedido, aumente o interesse de grupos especializados em músculo, especializados em ossos, especializados em cartilagem, para que eles possam trazer seus conhecimentos para criar a melhor solução.
“Temos uma plataforma”, acrescenta. “Agora só precisa da comunidade científica para construir sobre ela.”
Fontes: Massachussets General Hospital (MGH), Kurzweil AI e Washington Post.