Em tempos de fake news é extremamente importante ter referências fortes para não cair em armadilhas e virar cobaia de falsos heróis. Sabe aquelas pessoas que têm certo apreço por lacrar assuntos polêmicos? Quase nunca os assuntos abordados e a forma como são comunicados é honesta e saudável.
E como estarmos preparados para as ciladas do mundo pós-digital?
Penso que entendendo um pouco ou muito (o que torço para que aconteça) sobre arte. Sim, a arte é uma poderosa ferramenta para desenvolver vários superpoderes. Quais são esses super poderes? Muitos e garanto que nenhum deles envolve força sobrenatural ou teletransporte.
No momento em que vivemos, preservamos uma distância segura para evitar o crescimento de infectados pela COVID-19 mas as distâncias do mundo digital ficam cada vez menores. A internet sem sombra de dúvida é um alento, um conforto, uma ferramenta que evitou um colapso sem precedentes em todo o mundo. Imagine como seria o mercado de trabalho sem a oportunidade de trabalhar remotamente? Com certeza o desemprego, crise financeira e número de infectados pelo vírus seriam extraordinariamente maiores.
Muito bem. Nosso cenários está montado: ano de 2020, segundo semestre, mais de sete meses de isolamento, muita movimentação no universo digital e novas fragilidades que afloraram e junto com elas, novas oportunidades.
É agora que a arte entra para entendermos que somos capazes de nos expressar através dela e que nos ajuda a compreender quem somos e desenvolver um olhar mais sensível para o mundo. Quer superpoderes mais importantes do que esses?
Segundo Allain de Botton e John Armstrong, em seu livro A arte como terapia, possuímos sete fragilidades psicológicas que a arte pode nos ajudar a combater e tornar instrumento útil em nossas vidas, vamos falar sobre elas.
1- ESQUECEMOS O QUE IMPORTA, sem reter experiências importantes e significativas. Para esse sintoma a arte oferece um antídoto para a memória “fraca” pois consegue gerar experiências e reflexões através de seus mais diversos meios de desenvolvimento que geram valor e significado ao que está sendo trabalhado e isso faz com que nosso cérebro retenha a informação.
2- TENDEMOS A PERDER A ESPERANÇA, sendo sensíveis demais ao que é ruim e desagradável, perdemos grandes oportunidades de tornar o sofrimento algo rico e significativo. Usando a arte como expressão deixamos à vista tudo o que é importante, tornando o desagradável em belo e positivo.
3- ENTRAMOS EM PÂNICO COM MUITA FACILIDADE, e somos propensos a sentimentos de isolamento. Para isso a arte nos apresenta uma fonte de dignidade para o sofrimento, ensinando que leveza e serenidade são skills possíveis de serem desenvolvidas para uma existência mais nobre.
4- NOS DESEQUILIBRAMOS E DEIXAMOS DE VER NOSSAS MAIS AGRADÁVEIS FACETAS. Para esse problema, a arte nos oferece um agente de equilíbrio, codificando com clareza a essência de nossas qualidades, mantendo-a perto de nós, através dos mais diversos meios de comunicação, produções significativas, ajudando-nos a reequilibrar nossa percepção de nós mesmos.
5- É DIFÍCIL QUE NOS COMPREENDAM VERDADEIRAMENTE pois muitas vezes não conseguimos decifrar nossos próprios sentimentos. A arte oferece um guia para o autoconhecimento pois a manifestação de qualquer sentimento através da linguagem artística nos torna mais acessíveis a nós mesmo e aos outros. Prova disso é o fato de frequentemente dizermos: “Nossa, isso me representa!”
6- SOMOS VÍTIMAS DE JULGAMENTOS SUPERFICIAIS E PRECONCEITUOSOS, deixando de viver momentos especiais e únicos pois julgamos a oportunidade pela embalagem. Condenamos o “estranho” e agimos na defensiva. A arte amplia nosso catálogo de referências, oferecendo um enorme e sofisticado universo de experiências. No início, grande parte do que nos é apresentado parece estranho, pois é novo. Mas ao descobrir que podemos ter ideias e atitudes enriquecedoras, um infinito mundo de opções brilha em nossa frente.
7- SOMOS CONSUMIDOS PELA IDÉIA DE QUE A VERDADE ESTÁ EM OUTRO LUGAR. Vivemos nos comparando com os outros e perdemos nossa sensibilidade. A arte remove nossa casca e nos salva do habitual descaso. Recuperamos a sensibilidade em notar o belo no simples e que não existem regras de boas maneiras na arte.
Numa análise final, só valemos alguma coisa por causa do essencial que personificamos, e se não personificarmos isso, a vida será desperdiçada.” – Carl Jung
Deu para perceber que a palavra de ordem é SENSIBILIDADE? A sutileza ou a força de uma obra artística nos ensina a sermos mais permeáveis às emoções e isso faz com que nossa caixas de Pandora sejam abertas. Indico que conheça o trabalho da artista Marina Abramovic, em particular a performance do olhar em silêncio, mas existem muitos outros aprendizados a serem aprendidos com essa inigualável artista. Escolha alguém para que permaneçam em silêncio e olhando nos olhos um do outro por dois minutos, somente dois minutos, reflita sobre a importância do conteúdo psicológico que essa performance nos traz. Tente, pois é incrivelmente forte. Costumo replicar em aulas e palestras e as reações são as mais diversas e inimagináveis, afinal, cada um vai reagir a essa intimidade forçada de jeitos diferentes.
A arte funciona como um agente de equilíbrio em nossa emoções e vem sendo estudada por seu poder terapêutico sobre nossa saúde emocional. São incríveis as possibilidades que a arte oferece, com o poder de ampliar nossas capacidades, compensando nossas fraquezas inatas, transformando fragilidades psicológicas em superpoderes.
Quando sofrimento e arte se encontram ocorre uma sublimação dos processos psicológicos de transformação, onde experiências aparentemente triviais se transformam em algo nobre e refinado.
A arte como expressão social nos faz perceber que não somos os únicos a sofrer e que muitos aspectos não tão glamorosos de nossas vidas não precisam ser vistos como maldições e sim como uma oportunidade de crescer e transmutar.
Enfim, a parte mais íntima e esquiva de nosso pensamento e experiências é registrada, editada e desenvolvida para melhorarmos quem éramos ontem, fazendo-nos sentir que nos vemos no espelho com mais nitidez.
E quando nos conhecemos com tamanha clareza fica muito mais simples nos comunicarmos e também interpretar as informações que chovem em nossa timeline. Somos mais honestos conosco e com o mundo. Como e onde encontrar essa voz artística que têm o poder de descortinar nosso mais íntimo eu? Esse caminho você deve encontrar, talvez esse vídeo te ajude.
O futuro mais sensível e harmonioso inclui a descoberta da arte desde a infância, promovendo o desenvolvimento humano de livre expressão em meio ao sistema tradicional de educação. Crianças mais sensíveis e sem preconceitos serão adultos mais criativos e empáticos. Exemplo disso são os investimentos em indústrias criativas pelo mundo, que inspiram, atraem talentos, aprimoram habilidades, ajudam negócios e fornecem educação, como o caso do impulso milionário para indústrias criativas na Inglaterra.
Espero que eu possa ter tocado em algum lugar em sua mente para a importância da arte em nossa sociedade e nas relações entre sociedades distintas. Quando falamos de arte falamos de visões e formas de expor sentimentos, sem preconceitos ou amarras. Toda forma de expressão é arte.
Grandes transformações começam com pequenas revoluções, comece a sua!
As artes não são uma maneira de ganhar a vida. Elas são uma maneira muito humana de tornar a vida mais suportável. Praticar uma arte, não importa o quão bem ou mal seja, é uma maneira de fazer sua alma crescer.” – Kurt Vonnegut Jr.
Crédito da imagem da capa: Daniels Joffe