O câncer é a segunda principal causa de morte no mundo. Nos Estados Unidos, aproximadamente 600.000 pessoas irão morrer esse ano. Aqui no Brasil, o INCA estima quase 600 mil casos novos em 2016 – cerca de 1600 pessoas todos os dias.
Graças às pesquisas biomédicas hoje é possível curar alguns tipos de câncer, incluindo casos de leucemia infantil e de linfoma de Hodgkin, e há um progresso significativo no tratamento de outros tipos.
Grande parte deste sucesso deve-se aos altos investimentos em pesquisas clínicas e epidemiológicas, resultando em avanços na prevenção, no diagnóstico, nas terapias e no monitoramento dessa doença.
No entanto, o presidente americano Barack Obama, acredita ser necessário um progresso maior. E urgente!
No início desse ano, ele convidou o vice-presidente Joe Biden para liderar uma nova iniciativa – a National Cancer Moonshot – para avançar nas pesquisas. Na realidade, essa não é a primeira campanha americana contra o câncer – em 1971, o presidente Richard Nixon anunciou uma “guerra contra essa doença”.
O vice-presidente americano Joe Biden, à esquerda, gesticula enquanto conversa com o Dr. Bruce L. Levine PH.D. (centro), e Dr. Carl H. June M.D., no Abramson Cancer Center, da Universidade da Pensilvânia em Janeiro/16. (Crédito: Joseph Kaczmarek / AP)
Depois do anúncio, surgiram alguns questionamentos sobre o porquê de tal iniciativa e o que a difere da campanha de 45 anos atrás.
Tanto o governo americano quanto cientistas e pesquisadores acreditam que estão no momento certo para um esforço renovado contra o câncer. Com os novos conhecimentos científicos e inovações tecnológicas, as perspectivas de sucesso são maiores do que nunca.
Trabalhos usando ferramentas e tecnologias decorrentes do Projeto Genoma Humano e de dados do Cancer Genome Atlas, além de outros estudos, já esclareceram muitas coisas sobre o câncer. Por exemplo, a tecnologia genômica mostrou que, embora cada tumor seja molecularmente único, certas rotas são repetidamente afetadas. Essas descobertas ajudaram a desenvolver uma nova geração de medicamentos que alvejam essas rotas.
Novas e poderosas ferramentas e métodos de bioinformática também permitem o monitoramento e a análise de grandes conjuntos de complexos moleculares e dados clínicos (ou “big data”), necessários para a geração de modelos preditivos de progressão do câncer e de sua resposta terapêutica.
Enquanto isso, depois de uma luta que já dura décadas, as estratégias para estimular o sistema imunológico a atacar as células cancerígenas começam a ter sucessos surpreendentes. Algumas imunoterapias como os “inibidores de checkpoint” e terapias de células T, têm conseguido induzir a remissão ou mesmo a cura em pessoas resistentes ao tratamento de melanoma, leucemia e linfoma, mesotelioma, bem como câncer de ovário, pulmão, rim e câncer de mama triplo negativo. No entanto, muitos tumores sólidos não respondem bem a estas abordagens. Ainda há muito trabalho a fazer.
Claramente, vai ser um desafio imenso descobrir como aplicar todos os recentes avanços na compreensão da biologia do câncer e das novas abordagens terapêuticas. Essa nova iniciativa de pesquisa terá o objetivo de fazer a diferença em todas estas áreas, com duas prioridades fundamentais:
– Aumentar os recursos dedicados à luta contra o câncer;
– Derrubar os silos para unir a comunidade no combate à doença. Uma coordenação em todo o governo está sendo reforçada, envolvendo vários departamentos e liderada pelo vice-presidente Biden.
Com US$ 680 milhões assegurados no orçamento do ano fiscal de 2017 para o Instituto Nacional de Saúde (NIH), além de recursos adicionais para a Food and Drug Administration (FDA), a iniciativa terá como objetivo acelerar o progresso de novas intervenções que consigam reduzir substancialmente a incidência do câncer e melhorar dramaticamente os resultados dos pacientes.
As oportunidades mais atrativas do NIH serão apresentadas no final de setembro de 2016 em um plano de pesquisa de acordo com as deliberações de um painel de especialistas, que irá fornecer subsídios científicos para o National Cancer Advisory Board.
As potenciais áreas de pesquisa focam no desenvolvimento de vacinas, em tecnologias para detecção precoce, análise genômica de uma única célula, imunoterapia, câncer pediátrico e melhor compartilhamento de dados (veja a tabela abaixo).
Tradução de O Futuro das Coisas (Cortesia: The New England Journal of Medicine)
O painel de especialistas irá explorar o conhecimento de cientistas, oncologistas, filantropos e representantes das indústrias farmacêuticas e de biotecnologia que concentrem-se em fronteiras emergentes na compreensão e no tratamento do câncer. Serão exploradas novas oportunidades de colaboração entre agências governamentais e entre os setores público e privado, sendo destaque em uma cúpula no final de Junho/16.
Para maximizar a capacidade da comunidade científica em tirar proveito dessas novas possibilidades, o painel irá explorar a possibilidade de estabelecer um fundo – “Exceptional Opportunities in Cancer Research Fund” – para apoiar a busca de novas ideias que solucionem problemas atualmente sem tratamentos.
Com isso, o National Cancer Institute (NCI) poderá rapidamente alavancar novos conhecimentos em qualquer área da oncologia. Tal investimento pode assegurar que os cientistas mais criativos do país tenham os recursos necessários para prosseguir suas pesquisas.
Compartilhamento de informações
Um segundo objetivo da iniciativa será o de superar as barreiras que muitas vezes impedem a colaboração e o compartilhamento de informações entre os vários grupos de trabalho no combate ao câncer, e que limitam o acesso às pesquisas no estado-da-arte.
Inovações tecnológicas vão ajudar a revolucionar as formas com que os dados relacionados ao câncer são compartilhados e utilizados. O governo federal deverá procurar formas de facilitar o compartilhamento de dados entre os pesquisadores que atualmente relutam em divulgar os seus dados e resultados.
Atualmente, tanto o “Cancer Genomic Data” da NCI, quanto o “Cancer Genomics Clouds Pilots” criam novos métodos para facilitar o compartilhamento de dados, novos algoritmos, softwares, ferramentas e anotações.
O vice-presidente Biden, também deixou claro que vai tomar medidas para garantir que todos os americanos – mesmo aqueles que dispõem de recursos limitados ou vivem longe dos principais centros, como áreas rurais – tenham acesso ao tratamento de ponta e de prevenção.
Atualmente, menos de 5% dos adultos americanos com câncer, participam de ensaios clínicos. Além disso, os oncologistas tratam atualmente de cerca de dois terços dos pacientes com câncer, tendo acesso limitado às novas pesquisas e avanços, além de pouco estímulo financeiro para levar seus pacientes aos ensaios.
Seguindo um modelo centrado no participante, essa nova iniciativa de pesquisa pretende assegurar que os pacientes e suas famílias sejam tratados como parceiros, com acesso às informações sobre a sua própria saúde e com abertura para contribuir para as pesquisas.
O objetivo principal é inspirar uma nova geração de visionários que desafiem os limites do atual conhecimento sobre o câncer. Esperamos que esses esforços garantam o desenvolvimento de melhores formas de prevenção, tratamento e cura para todos os tipos de câncer, em todos os países, dos mais ricos aos mais pobres.
Fontes: White House e The New England Journal of Medicine.