Donald Trump e Elon Musk são, sem dúvida, dois nomes que dispensam apresentações. O primeiro, magnata e atual presidente dos Estados Unidos, eterno defensor do slogan “Make America Great Again” e que promete impulsionar o Destino Manifesto, uma secular e controversa doutrina que alega que são uma nação escolhida que receberam de Deus o dever e o direito de avançar sobre outros territórios para expandir os seus domínios e disseminar os ideais americanos.

“Nossas liberdades e o destino glorioso da nossa nação não serão mais negados. Vamos perseguir nosso Destino Manifesto, enviando astronautas americanos para fincar a bandeira americana em Marte” — Discurso de Donald Trump na sua posse, em janeiro de 2025.

O segundo é o bilionário visionário que, quando não está mexendo com carros elétricos, está planejando colonizar Marte com a SpaceX, possivelmente já pensando em implantar uma wi-fi intergaláctica e que ganhou de Trump um cargo no governo. Tudo isso enquanto dispara diariamente inúmeros tweets na sua plataforma X. 

Ambos compartilham um sonho audacioso e que, na realidade, faz parte de um sonho coletivo da humanidade: explorar Marte, o grande planeta vermelho, um deserto vasto e gelado – como mostram veículos de exploração e sondas já enviados – e cuja gravidade é metade da terrestre. 

Mas a ideia de Trump não é continuar enviando sondas ou mandar uns robôs lá. Não, isso é coisa de cientista da NASA. A ideia é fincar a bandeira americana no Planeta Vermelho, como se fosse uma extensão do Texas, e reivindicar a propriedade por algo que poderíamos chamar, com um toque de ironia jurídica, de “usucapião marciano”.

A colina de Santa Cruz é um possível remanescente erodido da Cratera Jezero, em Marte. Foto do rover Perseverance Mars da NASA, em 29 de abril de 2021. NASA / JPL-Caltech / ASU / MSSS

A lógica é simples: se os americanos chegaram primeiro à Lua e plantaram lá sua bandeira (mesmo que o terreno lunar seja oficialmente neutro), por que não repetir o feito em Marte? Trump já estaria imaginando um muro nesse planeta, dessa vez para impedir a entrada de marcianos indocumentados?

Donald Trump: Marte é “nosso” (ou será)

Durante o seu primeiro governo, Trump chegou a ressuscitar a ideia de uma “Força Espacial”, algo que muitos interpretaram como um capítulo perdido de “Star Wars”. Mas sua ambição vai além de satélites espiões e missões orbitais. Ele já tinha declarado que os americanos deveriam ser os primeiros a conquistar Marte. “É um território incrível, enorme e cheio de oportunidades”, disse, provavelmente pensando em futuros resorts com campos de golfe marcianos.

Elon Musk: O senhor de Marte

Já Elon Musk, com sua obsessão por Marte, aparenta estar levando a sério o papel de protagonista de um filme de ficção científica, sonhando em colonizar o planeta vermelho com espaçonaves da SpaceX. Até já propôs ideias como “terraformar” Marte, ou seja, transformar aquele ambiente inóspito em algo habitável, como um Arizona em alta temporada.

E já afirmou que os primeiros colonos marcianos precisarão “trabalhar muito” para pagar sua passagem de ida – uma espécie de escravidão espacial moderna? – mas o bilionário parece acreditar que valerá a pena. Talvez ele imagine um planeta repleto de Teslas flutuantes e estações de carregamento movidas a energia solar marciana.

Usucapião em Marte?

Agora, imaginemos o cenário: Trump e Musk se unem (ou competem) para reivindicar Marte. Com a bandeira americana fincada no solo, eles poderiam alegar posse mansa, pacífica e ininterrupta – afinal, os marcianos, se existirem, não estão exatamente em condições de contestar no Judiciário terrestre. Quem sabe não criam o “Cartório Interplanetário de Registros de Propriedade”?

O Comitê das Nações Unidas sobre o Uso Pacífico do Espaço Sideral criou o Tratado do Espaço Exterior, em 1967. Desde que foi assinado e promulgado, 104 nações tornaram-se signatárias.

Infelizmente para Trump, o direito internacional é absolutamente claro sobre conquistas e colonizações de planetas. O Tratado do Espaço Exterior de 1967, do qual os EUA são signatários, proíbe explicitamente que qualquer nação reivindique soberania sobre corpos celestes. Mas isso não significa que o sonho de Trump tenha acabado antes de começar. E quanto à Musk, certamente irá argumentar que, como empresa privada, não está sujeito às mesmas regras que os governos.

No entanto, fazer uma reivindicação territorial sobre outro planeta “não é tão simples”, como explica a Dra. Jill Stuart, especialista em política, ética e direito da exploração do espaço sideral, em entrevista para a DailyMail. Mesmo que consigam instalar uma colônia em Marte, os EUA não terão direito de reivindicar o território marciano, por causa desse Tratado, por meio de uso ou ocupação, ou por qualquer outro meio”. 

Mas Musk poderia reivindicar parte de Marte?

Poderia sim. Pense na SpaceX como uma mineradora aqui na Terra que não precisa justificar que a área que explora é território nacional para extrair os minerais que quiser e impedir a entrada de qualquer outra empresa.

As regras do Tratado referem-se apenas às nações Estados, o que podemos concluir que há uma brecha para que empresas possam reivindicar partes do espaço como suas. O Artigo Um diz assim: “O espaço sideral, incluindo a Lua e outros corpos celestes, será livre para exploração e uso por todos os Estados, sem discriminação de qualquer tipo”. 

“Contanto que uma nação não reivindique ser proprietária da área, a lei permite que eles construam uma base, minerem os recursos que encontrarem lá e os usem para apoiar uma colônia, com base no fato de que isso ainda conta como ‘uso’,  explica Dr. Fabio Tronchetti, professor de Direito da Universidade de Northumbria. 

Além disso, um país que chegue primeiro – sem precisar fazer uma reivindicação sobre soberania ou território – pode ter o direito de dizer para outra empresa que ela não poderá estabelecer uma base, porque isso interferiria em suas atividades”, complementa Dr. Tronchetti. 

Marte ou qualquer outro planeta, pode acabar pertencendo a quem chegar primeiro. Se Elon Musk decidir explorá-los para seus propósitos pessoais, não há muito que se possa fazer,

Conclusão: Marte, o novo Velho Oeste?

No fim das contas, a corrida para explorar Marte é mais do que uma questão científica. É uma oportunidade de ouro para que bilionários e líderes mundiais continuem alimentando seus egos e ambições, enquanto deixam a humanidade boquiaberta (ou perplexa) com suas iniciativas megalomaníacas.

Se um dia Trump e Musk conseguirem transformar Marte em uma colônia americana, teremos que assistir de camarote ao dia em que ambos brigarem para decidir quem vai ser o xerife do Planeta Vermelho. E talvez, nessa disputa, os marcianos finalmente se unam para dar um basta nos terráqueos invasores.

Crédito imagem da capa: Science Photo Library Art

Arthur de Castro

Corretor de Imóveis desde 1990 e que se recusa a vender lotes em Marte.

Ver todos os artigos