Praticar futurismo começa assim, passo a passo. Isso vale para o futuro com inovações incrementais, ou seja, aquelas que aprimoram modelos já conhecidos. Há todo um outro raciocínio para inovações disruptivas, mas isso é assunto para uma nova discussão…

Para estimar o futuro de qualquer aspecto do negócio, do conhecimento ou da vida, são necessárias três atitudes fundamentais:

(1) conhecer a história e os desdobramentos relevantes para o atual status quo do tema;

(2) conhecer o que estabelece o atual status quo desse tema, ou seja, aquilo que o faz ser o que é nos dias de hoje;

(3) acompanhar e conhecer os elementos de inovação incremental e disruptiva que são intervenientes sobre o status quo do tema.

Como qualquer outra atividade da ciência, estimar mudanças no futuro é fruto de tendências, probabilidades, contextos globais e regionais, atitudes, escalabilidade e, principalmente, engajamento para mudanças no padrão de comportamento. Na Educação isso não é diferente.

Vamos fazer um exercício simplificado e tentar projetar o futuro incremental da Educação Superior, para os próximos três anos? Vamos pensar…

O atual status quo da Educação Superior repousa, historicamente, sobre três pilares:

(1) relação entre oferta de vagas por IES públicas e particulares;

(2) os processos de regulação do Ensino Superior e o desempenho das IES;

(3) a transformação do mercado de trabalho e a necessidade urgente de transformação do modo de formar profissionais para esse mercado.

Assim, para analisar como a Educação vai evoluir, acompanhando as mudanças dessa era das tecnologias e dos novos modelos de processos de aprendizagem para as novas gerações, é sobre esses três pilares que começamos as projeções.

Em uma visão geral, a tendência de mercado, com o número amplamente superior de vagas na rede particular em relação à rede pública, é que, para sustentar-se enquanto negócio, o sistema educacional migre para soluções que agreguem valor, mantenha ou reduza custos operacionais, e atendam aos processos de regulação. Isso nos leva ao segundo pilar: os processos de regulação estão mudando (de novo).

Já existe uma comissão no Inep/MEC estudando mecanismos de avaliação para projetos pedagógicos de curso que contemplem modelos diferenciados daqueles que estão vigentes. Projetos baseados em metodologias ativas de aprendizagem, com flexibilidade curricular, formação profissional ampliada, interação em arranjos internacionais de mobilidade acadêmica.

Projetos de curso que formam para um mundo com menos barreiras geográficas e mais espaços de interação. Cursos que formam profissionais empáticos, criativos, inovadores, empreendedores de sua própria carreira, mas sem que se descolem do objetivo de empreender por um mundo melhor e com mais acesso aos serviços que assegurem melhor qualidade de vida. E então temos o terceiro pilar claro: formar para um novo (e competitivo) mercado de trabalho.

E o futuro? Já deu para começar a formar um cenário… Só que no sentido contrário.

Os cursos de graduação, hoje, já começam a receber estudantes com perfis diferentes daqueles que predominavam há cerca de três anos atrás. São estudantes mais conectados, mais independentes e questionadores dos modelos.

Mas, e especialmente, de 2019 a 2020, os estudantes que chegarão ao ensino superior serão egressos de um novo modelo no ensino médio, que está regido pela nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC), aprovada definitivamente nesse ano de 2017.

O fato é que, com esse novo perfil de estudante, não há como manter um ensino superior “velho” e que não atenda mais aos propósitos de um novo século. No mínimo, será preciso mudar ao menos duas coisas, já partir de 2018: os modelos de aprendizagem, previstos nos projetos pedagógicos de curso, e os indicadores dos processos regulatórios, estabelecidos pelo Inep/MEC. Isso nos leva de volta aos tais pilares do ensino superior, só que no sentido contrário.

Na Educação, e particularmente na Educação Superior, os processos só mudam quando a transformação do comportamento de mercado é tão forte que impacta na redução da demanda por vagas, já que a ampla e maciça maioria das vagas ofertadas para a formação superior está nas mãos do sistema particular de ensino. Mesmo nas instituições públicas, nunca a ociosidade de vagas e o abandono de matrícula foram tão altos.

Aí então, aqueles pilares acontecem no sentido reverso:

(1) o mundo mudou e quem não mudar a forma de atuar e interagir, profissionalmente, vai sendo deixado de fora das melhores colocações e remunerações;

(2) por força de uma demanda de inovações no sistema de ensino (do básico ao superior) os órgãos reguladores estudam (e breve publicarão) novas formas de conceituar os cursos superiores oferecidos e novas formas para esse modelo de negócio;

(3) a relação das vagas entre públicas e particulares não deve se alterar e, por isso, como precisa oferecer formações mais atrativas e mais conectadas com o mercado globalizado de trabalho, as instituições particulares devem ajustar seus cursos e currículos para um novo tipo de formação superior, e não diplomação superior.

Já as instituições públicas, igualmente por força de mercado e dos mecanismos de regulação, devem acompanhar (senão guiar) todo esse processo de transformação educacional profissional superior. Migrar de um modelo de diplomação despersonalizada e em massa, vigente no Brasil desde a década de 70, para um novo modelo de itinerários formativos e de construção personalizada de carreiras, sem se descolar dos padrões de qualidade estabelecidos pelas Diretrizes Curriculares Nacionais e o Catálogo Nacional de Cursos Superiores de Tecnologias.

Embora haja outras variáveis intervenientes, e igualmente importantes para se ter em discussão, para cada um desses pilares, por hora, o objetivo era fazer um exercício de uma competência que já é procurada pelo mercado de trabalho, para profissionais nos melhores cargos e remunerações: a capacidade de antever o futuro das coisas.

Percebeu como avaliar as mudanças incrementais do futuro é, na verdade, o resultado da ciência de se conhecer como o processo acontece? É uma teia de eventos que se relacionam e reverberam uns nos outros.

Se você conhece os elementos que interagem para um comportamento de consumo, social ou educacional, precisa parar para recolher as informações necessárias de como cada um deles está reagindo aos eventos e acontecimentos que acontecem aqui e agora. E, a partir daí, saber como esses elementos tendem a se reorganizar e interagir com outros elementos, em busca de sustentabilidade.

Você também pode fazer esse exercício: para sua profissão, para o seu trabalho, para a sua vida, para os seus sonhos. Tente! Porque o Futuro das Coisas, de todas elas, já começou hoje e está à sua volta. Você só precisa prestar atenção.

Denise Da Vinha

Fisioterapeuta, Mestre em Fisioterapia, Doutora em Pediatria e Pós-Doutora em Engenharia Biomédica. Especializou-se em Metodologias Ativas de Aprendizagem e em Design Thinking for Education. Além de seguir atuando na carreira docente (no Brasil e na Espanha), atua na assessoria de desenhos Curriculares personalizados e inovadores, onde o principal trabalho é preparar, em mindset e repertórios, o corpo docente de instituições de ensino superior para que encontrem os melhores caminhos da inovação na formação dos egressos, dentro de sua própria realidade e recursos. Há dois anos iniciou a Rede Innovares (Facebook e YouTube), um projeto de desenvolvimento docente, baseado em modelos colaborativos, com o objetivo de dividir conhecimento para multiplicar experiências de aprendizagens. Sua produção científica conta com artigos em periódicos nacionais e internacionais, cursos e palestras em eventos científicos, livros, orientações de pós-graduação, sistematização de processos científicos e técnicos, todos nas áreas de Educação, Fisioterapia e Saúde.

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