Um novo programa que prevê o risco de psicose pode contribuir com neurologistas, psiquiatras e psicólogos, e ainda, impactar políticas públicas de saúde.

 

A perda de contato com a realidade é o principal drama de pessoas que desenvolvem psicose. Alucinações, desconfianças e pensamentos confusos são sintomas que podem levá-las a romper com amigos, e o que é pior, serem rejeitadas pela família e pela sociedade.

São tantas as origens da psicose – como tumores cerebrais, tóxicos, álcool, infecções, traumas emocionais – que qualquer pessoa, normalmente antes dos 25 anos, pode desenvolver, sendo que até hoje, apenas os neurologistas, psiquiatras e psicólogos podiam diagnosticar este estado mental patológico com base em sintomas relatados pelo próprio paciente ou pela família dele.

Mas, haveria uma forma de antecipar o diagnóstico ou de prever um surto psicótico no futuro?

Sim, agora será possível. E com 100% de precisão.

E essa nova tecnologia (vamos já falar dela) pode de imediato ter três grandes impactos:

1- Psiquiatras, neurologistas e psicólogos: estes profissionais terão uma melhor compreensão do quadro psicótico precoce de um paciente e antecipar o tratamento para postergar, abrandar ou até mesmo prevenir o aparecimento do distúrbio.

2- Políticas públicas de saúde: o diagnóstico antecipado com a devida intervenção terá impacto nas políticas públicas de prevenção e de combate às doenças mentais.

3- Processos seletivos de emprego: as empresas poderão minimizar o risco de contratar profissionais que tenham risco de desenvolver psicose.

Novo programa

Cerca de 1% das pessoas entre 14 e 27 anos de idade são consideradas de alto risco clínico (clinical high risk – CHR) para a psicose. Cerca de 20% delas irão experimentar um episódio psicótico.

Identificar quem irá cair na categoria dos 20%, antes da psicose surgir, agora é possível.

Pesquisadores do Centro Médico da Universidade de Columbia, do Instituto Psiquiátrico de Nova York, e do Centro de Pesquisa da IBM T. J. Watson, mostraram que a análise computadorizada da fala, oferece uma classificação mais precisa do risco de psicose do que as avaliações clínicas. O estudo foi publicado semana passada (26/08) na NPJ-Schizophrenia.

O novo programa analisa padrões da fala, identificando se jovens, em um prazo de dois anos e meio, poderão desenvolver a psicose.

Medindo a psicose

Quando uma pessoa fala, ela fornece uma janela para o que se passa na sua mente, dando pistas importantes sobre o que está pensando e sentindo.

Com base nessa premissa, 34 jovens (sendo 11 mulheres) em situação de risco, foram convidados a descrever suas experiências subjetivas, num formato de narrativa aberta.

Estas narrativas foram então transcritas e posteriormente analisadas pelo programa que analisou padrões de fala, incluindo a semântica (significado) e sintaxe (estrutura).

A análise estabeleceu a coerência semântica, ou seja, o quão bem cada cada um dos jovens permaneceu dentro de cada tópico do assunto. Também analisou a estrutura sintática, como por exemplo, o comprimento da frase e o uso de palavras que conectam as frases.

As características da fala que predizem o início da psicose incluem:

– quebras no fluxo de significados de uma sentença para outra.

– falas caracterizadas por frases curtas e pouco elaboradas.


A imagem acima mostra a classificação entre jovens de risco que desenvolveram psicose (vermelho) daqueles que não desenvolveram (azul). O poliedro contém todos os jovens em situação de risco que não desenvolveram psicose (azul). Todos os jovens em situação de risco que mais tarde desenvolver a psicose (vermelho) estão fora do poliedro. Assim, o programa de análise da fala teve 100% de precisão. (Crédito:. Cheryl Corcoran et al /NPJ Schizophrenia/Columbia University Medical Center)

 

Neste estudo, os 34 jovens participantes do estudo, foram acompanhados e monitorados trimestralmente, durante dois anos e meio. O programa conseguiu diferenciar corretamente os 5 jovens que mais tarde sofreriam um episódio psicótico daqueles 29 que não sofreriam.

100% de precisão

Um psiquiatra clínico pode intuitivamente reconhecer sinais de desorganização do pensamento em uma entrevista convencional com o paciente. No entanto, o auto-relato de sintomas, em que grande parte da avaliação psiquiátrica se baseia, depende da motivação e da capacidade do doente para comunicar com exatidão as suas experiências introspectivas, que podem ser influenciadas pela doença psiquiátrica.

Em contrapartida, uma máquina pode ampliar esta escuta e medir com precisão alterações clinicamente relevantes na psicose emergente.

No caso deste estudo, a ferramenta desenvolvida, classificou com precisão de 100%, as características específicas relacionadas com os sintomas da psicose.

Estes resultados sugerem que este método pode ser capaz de identificar transtornos do pensamento, na sua forma mais primitiva, mais subtil, anos antes do início da psicose.

O transtorno do pensamento é um componente chave da esquizofrenia, mas até hoje, difícil de mensurá-lo. A identificação correta das pessoas susceptíveis de evoluir para esquizofrenia possibilita a intervenção antecipada.

Tecnologia portátil e acessível

Outra vantagem é que essa nova tecnologia de análise da fala será acessível e portátil, podendo ser usada em smartphones. A facilidade de gravação da voz torna esta ferramenta complementar às entrevistas clínicas em conjunto com neuro-imagens.

A análise automatizada da fala, se validada, poderá fornecer informações anteriormente indisponíveis para os clínicos, funcionando como um “teste de laboratório” para a psiquiatria.

Para o campo de pesquisas da esquizofrenia, e para a psiquiatria de forma mais ampla, essa ferramenta pode ajudar no prognóstico e diagnóstico de transtornos mentais graves, e acompanhar as respostas ao tratamento.

O futuro

Os resultados exatos deste primeiro estudo representam apenas os estágios iniciais no uso da ciência da computação e das técnicas de análise comportamental, para caracterizar e prever o comportamento humano no contexto da saúde e das doenças psiquiátricas.

Novas pesquisas, com grupos de risco mais amplos, já estão previstas para confirmar a exatidão e a confiabilidade deste programa.

 

Fonte: NPJ-Schizophrenia

 

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