Você sabe como surgiu o emprego tradicional ? Ou indo mais além, sabe sob quais circunstâncias foi criado o modelo de educação tradicional?

Essas duas questões estão completamente correlacionadas.

Para o futurista Alvin Toffler, o modelo de educação tradicional foi criado com o objetivo de disciplinar os operários das fábricas, principalmente os mais jovens.

Então, com o jovem disciplinado a produtividade aumentou, porém, as atividades criativas foram reprimidas, por não serem tão produtivas conforme a linha do raciocínio industrial.

A escola prepara para o mercado de trabalho, se você não estuda para tornar-se um especialista em uma área específica o seu valor de mercado cai consideravelmente“. Esta herança do pensamento industrial está com os dias contados com a “explosão“ da inteligência contemporânea que promete ser em escala cósmica no futuro.

Alvin Toffler

No meu último artigo, abordei de forma geral como o trabalho executado hoje está se tornando obsoleto com as diversas tecnologias emergentes e com os novos modelos de organizações, e, principalmente, com a fomentação de uma nova mentalidade contemporânea.

Neste artigo, o foco será em compreender e refletir sobre quatro revoluções que já estão potencializando, e vão criar talvez um dos ambientes de trabalhos mais criativos e eficientes em um nível nunca visto antes.

Por isso, acredito que em um futuro emergente, a máquina será a principal colaboradora do ser humano.

Por exemplo, com o avanço de diversas tecnologias cognitivas poderíamos ter uma plataforma inteligente que identificaria dentro da abundância de dados a pessoa adequada para cada atividade, reduzindo o desperdício e aumentando a produtividade.

Vamos imaginar este cenário:

No futuro, você é um contador e a sua tarefa que antes exigia uma série de cálculos e interpretações, se reduziu para a análise e o julgamento daquelas informações providas pela máquina.

Outra situação:

Você é médico e se antes você precisava saber uma série de informações, interpretar e diagnosticar o paciente com base no seu conhecimento, no futuro, você terá um sistema (como o Watson) que vai fazer uma varredura na rede e te dar todas as informações relevantes. Ou seja, sua principal função será construir uma relação empática com o paciente, cuidando mais da sua parte psicológica do que física e tomar decisões precisas que salvem a vida dele.

Será que vai fazer sentido uma grade curricular acadêmica assim como o próprio currículo profissional com uma variedade de tecnologias inteligentes que capturam, interpretam e fornecem os melhores resultados de uma informação?

Eu tenho uma perspectiva otimista que vamos ter uma abundância de trabalho só que com mais consciência e com abundância de dados e informações ao nosso dispor. As pessoas não vão trabalhar porque devem ou precisam e sim porque faz sentido para elas.

A proliferação tecnológica reduz os custos dos serviços e expande o acesso para todas as classes sociais. Por isso, vejo um futuro com menos desigualdade social, pois o conhecimento vai ser democratizado, não importa quão pobre ou rico você seja.

O que alguns enxergam como um caminho distópico ou de extrema desigualdade, eu observo sinais claros de que a tecnologia vai permitir sermos aquilo que sempre sonhamos, livres e criativos.

REVOLUÇÃO 1: A “cognitificação” dos postos de trabalhos

A mentalidade disseminada no período industrial preparou as pessoas para trabalhos que foram “artificialmente” desenvolvidos para elas, mas na realidade, são tarefas que fazem mais sentido para os robôs. Como Kevin Kelly fala:

Kevin Kelly

No artigo anterior, comentei que posições que lidam com tarefas repetitivas, previsíveis e rotineiras correm grande risco de serem automatizadas. A abundância de algoritmos e sensores inteligentes promete tornar “mais cognitivas” as atividades humanas gerando mais eficiência e produtividade, algumas sem a necessidade de intervenção humana.

É óbvio que diversas funções executadas por humanos vão desaparecer, como por exemplo, aquelas ligadas à mobilidade urbana e ao transporte.

Os carros autônomos prometem uma das maiores revoluções pois, ele vai trazer mais segurança (embora, haja alguns questionamentos sobre o seu julgamento em algumas situações) e comodidade para as pessoas. Isto vai influenciar toda a mobilidade urbana que foi desenhada pensando em motoristas emocionais, com hábitos e ineficiências.

Qual vai ser o sentido de manter guardas de trânsito, ou até mesmo as blitz, em um mundo com um número reduzido de motoristas humanos? Até mesmo o sistema de multas vai ter que ser moldado para essa nova realidade.

Os próprios apps de táxi ou irão se tornar obsoletos ou poderão rumar para um sistema mais fluído e descentralizado, onde eles poderão ser o que a Netflix é para os filmes e séries hoje, ou seja, para o transporte particular como um todo.

Isto afeta as montadoras, companhias de táxi, concessionárias, etc.

Portanto, neste caso não vai fazer tanto sentido manter posições humanas por mera comodidade, vamos ter que escolher entre a estagnação, regresso ou progresso.

REVOLUÇÃO 2: Comoditização do comércio e varejo

Uma outra revolução que já está em andamento mas, ganhará proporções enormes no futuro, é a comoditização do comércio e varejo.

Hoje, o Instagram e plataformas de e-commerce já mobilizam isso. Mas, acredito que o próximo passo é transcender para a realidade virtual, onde vai haver uma infinidade de produtos que você vai poder experimentar e testar.

comércio realidade virtual

(Imagem cortesia: J. Walter Thompson Intelligence)

As empresas de varejo terão que encontrar uma forma atraente de manterem-se vivas, talvez com um mix de experiências em realidade física e virtual. Uma convergência de entretenimento, aprendizado e o negócio em si customizada aos interesses daquele cliente em particular.

O cliente vai deixar de ser passivo para ser totalmente ativo.

Outra possibilidade real é a fabricação de produtos pelo método aditivo em que reduz drasticamente o desperdício e nos torna artesãos (makers) novamente, quebrando o paradigma instituído pelo pensamento industrial. As fábricas vão deixar de ser exclusividade de grandes parques industriais, sendo distribuídas dentro de comunidades.

O consumidor vai ser totalmente empoderado com informações sobre cada produto, fornecedor, e comparações instantâneas. Tornando o seu consumo amplamente consciente.

Essa revolução pró “low-consumerism” poderá afetar a estrutura básica do capitalismo.

REVOLUÇÃO 3: Estruturas sustentáveis e adaptáveis

A última revolução que abordo neste artigo é a nossa capacidade de construir estruturas mais sustentáveis, resistentes e auto-adaptáveis ao próprio ambiente.

Isso vai ser possível através da natureza flexível dos nanomateriais, vamos poder mudar as propriedades do concreto por exemplo, deixando mais adequadas para a construção.

No caso da construção civil, a impressão 3D vai diminuir os custos que se tem hoje com as obras.

impressão 3D

Concepção artística de sistema de impressão 3D a qual pode construir rapidamente residências. (Cortesia de B. Khoshnevis, Center for Rapid Automated Fabrication Technologies (CRAFT), USC)

Como isso impacta na ampliação do acesso a moradia? Isso afeta o coeficiente de desigualdade no planeta?

Essas tecnologias irão reduzir os custos e acelerar a execução das obras, tornando as moradias mais acessíveis, sustentáveis e baratas. Acredito que vai acontecer um aperfeiçoamento da mão-de-obra. Não vai adiantar saber só como “colocar um tijolo”. Essa nova era vai exigir um nível técnico para compreender diversas nano-estruturas e como tirar melhor proveito da sua adaptação.

REVOLUÇÃO 4: A Robotização da Segurança

Acredito que esta revolução seja uma faca de “dois gumes” pois, por um lado ela pode libertar o ser humano de postos de trabalho que exijam riscos para a sua integridade física como vigilância, guerras, etc.

Por outro lado, ela pode se concretizar no pior pesadelo de diversas pessoas relevantes: os perigos de uma super Inteligência Artificial (IA), comparada com frequência com a ideia distópica de uma IA como a Skynet no filme O Exterminador do Futuro.

K5-robot-at-schoolRobô atuando como segurança das crianças (Imagem cortesia: Digital Trends)

Eu tenho uma visão otimista sobre essa quarta revolução: uma vez que robôs como drones ou em formato humanóide podem ser utilizados, além de eliminarmos os riscos de humanos em campos de batalha também reduzimos o risco de vítimas por acidentes de trabalho.

No caso dos carros autônomos, há o receio do julgamento da IA quando colocada em circunstâncias conflitantes, sobre quais passageiros deve proteger.

Por isso é fundamental o desenvolvimento de uma super IA que compreenda bem os valores morais humanos e possa tomar julgamentos mais empáticos em situação de conflitos. Afinal nós somos os seus criadores, o futuro distópico ou não está nas nossas decisões.

Nova Era do Trabalho

Aqueles que julgam pela lógica da escassez, imaginando que as máquinas vão dominar todos os campos e que iremos enfrentar um cenário distópico de escravidão “inversa”, eu enxergo por uma ótica completamente diferente.

Penso que viveremos uma nova era cada vez mais abundante, diversificada, fluída, democratizada, criativa e inteligente.

As comunidades estão ganhando cada vez mais força apoiadas por um propósito comum, que conquistam verdadeiros seguidores que trabalham sem remuneração muito mais tempo do que nos empregos convencionais, como o wikipedia, kickstarter, etc.

Isto inclusive é o que imagino sobre as empresas no futuro. O gênio ou talento que faz a diferença será uma soma coletiva em que para prosperar teremos que  trabalhar em sincronia e com empatia com toda a comunidade.

revoluções no mercado de trabalho 1

Performers encenando a Revolução Industrial durante a Cerimônia de Abertura dos Jogos Olímpicos de Londres 2012 (Crédito: Getty)

O conhecimento vai ser instantâneo, fluído e descentralizado, por isso me pergunto qual a finalidade de você ser especialista em uma única coisa, se você pode ser como um camaleão, com diversas capacidades para  determinada situação.

Será que o modelo tradicional das instituições de ensino já está “morto” e ainda não percebeu?

O crescimento exponencial de diversas empresas que utilizam um modelo organizacional contemporâneo, e atuam de forma distribuída, contratando sob-demanda vão desbancar as grandes empresas, que salvo exceções, ainda se confiam em uma lógica de crescimento linear e industrial.

Fico me perguntando o que as crianças de amanhã vão responder quando lhe perguntarem “o que você quer ser quando crescer”?

Talvez a resposta não seja uma, mas várias coisas.

De forma geral, acredito que a evolução tecnológica vai causar uma disrupção em todo os setores do mercado, tornando alguns completamente obsoletos, enquanto outros renovados.

O empreendedorismo vai ser uma transição orgânica, pois ele vai ser uma característica cada vez mais integrada com o novo modelo de mercado.

A evolução tecnológica traz mais espaço para o empoderamento das pessoas, que poderão desenvolver e operar diversas iniciativas em uma escala muito maior.

Enfim, eu não acredito que será uma substituição em massa de trabalhos, mas sim uma transformação necessária de um modelo obsoleto perpetuado pela mentalidade industrial a fim de permitir o nosso progresso como civilização.

Bruno Macedo

Bruno é futurista e designer de Experiências de Futuro na Rito, empresa em que é co-fundador. Também é game-designer e principalmente um curioso nato que estuda desde neurociência à gamificação. Tudo o que faz procura alinhar 3 coisas: Empatia, Subversão e Diversão.

Ver todos os artigos