Hoje quero dar uma pausa nas leis, fatos, cenários e evidências para focar no futuro da Educação, e trocar ideias sobre um pilar que emergiu recentemente nesse nosso cenário de aprender-a-aprender: a empatia.

O mindset das eras digital e pós-digital é, inegavelmente, tecnocêntrico. Temos a tecnologia mediando praticamente tudo nas nossas vidas diárias, o que nos torna pequenos universos centrados em nossos smartphones, na maior parte do tempo (quem não?!). Quase paradoxalmente, a mesma tecnologia que nos convida à alienação do mundo só pode ser desenvolvida com altas doses de empatia.

Empatia é, por assim dizer, o que nos aproxima do mundo do outro para compreendê-lo, e o que gera soluções para que o outro tenha a opção de permanecer no seu próprio mundo, só que agora com mais recursos. Pode parecer confuso, mas quem é da área do empreendimento de novas soluções para velhos problemas, sabe exatamente do que eu falo.

O sucesso dos processos, produtos e serviços centrados em empatia se traduzem na sua própria escalabilidade. Zuckerberg nem gostava do tal anuário escolar, mas percebeu que a maior parte dos estudantes não só gostava como usava os tais Facebook como base para disputas, jogos, notícias (fofocas, bullying, discriminação). A empatia o levou a perceber que ali existia uma grande oportunidade, e nem preciso contar o final dessa história.

Processos como o Design Thinking mostraram-se superiores em resultados (seja qual for o design que você buscar ao aplicar a metodologia), mesmo quando foram adaptados fora da sua área de origem. Você mesmo sente-se compelido a acompanhar uma página, um autor ou uma personalidade quando encontra interfaces, quando percebe-se contemplado, de alguma maneira, no que essa página, autor ou personalidade, faz, diz, sente ou atua.

Empatia engaja. Empatia motiva. Empatia nos torna quem somos: humanos.

E porque na Educação vemos tão pouco da empatia nos professores e nos estudantes? Sim, hoje eu vou falar também dos estudantes, porque o protagonismo do aprender não pode partir de mais ninguém, a não ser de quem quer aprender.

Nesses meus mais de 30 anos de magistério superior já vi muita coisa na sala de aula, na sala dos professores, nas reuniões de suporte didático, na gestão do ensino superior, nos processos de avaliação – internos e externos. Mas empatia é algo raro. Pergunte a qualquer professor, hoje, assim de repente, como ele “preparou a aula”. Em geral ele responderá algo como “-essa é a minha melhor aula”, ou então “-busquei os melhores materiais que encontrei”, ou ainda “-pensei no que é imprescindível no conteúdo e coloquei nos slides”. Em nenhuma das três afirmações você perceberá a imagem de um profissional empático.

Não, não me queiram mal, colegas! Mas vamos assumir que montamos as aulas para nós mesmos, na maior parte das vezes. Exceção feita às palestras, porque aí pensa-se mais na plateia, o que justifica existirem excelentes palestrantes que são professores medíocres, mas dificilmente o contrário. Temos uma sequência de raciocínio e nossos slides/recursos de apoio seguem somente essa lógica. Quando eu (professor) escolho o que penso ser o melhor para você (estudante), eu estou sendo “simpático”. Uma camuflagem para reter o domínio pleno e completo da sala de aula, que é o espaço de segurança de qualquer professor.

Abrir mão desse domínio significa estar exposto à incerteza, e todos aprendemos que o professor “tem que saber tudo”. Certo?

E-r-r-a-d-o. Pelo menos, errado pela visão da educação para o século XXI! E essa é a nossa dose de futurismo de hoje: a empatia alinhada à experiência de como vemos o conhecimento.

Vamos ao estudante do ensino superior. Ele chega na sala e senta. E a partir desse momento, o professor tem o dever de torná-lo um profissional. Participar da aula? Hummmm… Isso merece outro texto, sobre a atitude de aprender a aprender, ou a arquitetura da aprendizagem. Tema excelente para estudantes também!

Mas voltando ao nosso dilema, o estudante é tão “simpático” com o professor na mesma proporção em que acredita que estar “presente” de corpo (e não em pensamento!) na aula é suficiente para que toda a mágica aconteça. A tecnologia deve fazer parte dessa dinâmica, mas não pode exigir dele além do que as linhas que estão no slide do professor. Uau! Haja mágica nesse cenário!

Quando eu me afasto da posição de professor ou de estudante, e observo-os como um sistema, claramente a ideia de que esse tipo de sistema não vai funcionar em resultados. Mas, quais seriam os resultados pelos quais eu pauto meu conceito de avaliação? É aqui que mora o dilema…

Em uma organização em que os resultados são medidos pelo quantitativo das notas e pelo número de diplomas emitidos, os comportamentos “simpáticos” são perfeitos. Mas instituições de ensino superior não deveriam ter esse perfil de organização, onde ninguém se compromete com o outro, e ainda, assumem o comportamento de que o outro é que deve fazer o resultado acontecer.

Professores ensinam e o resultado esperado é que o estudante pontue bem no ENADE (que virou resumo da ópera). Estudantes estão presentes na aula (será?) e fazem a prova, a obrigação do professor é passá-los, e da instituição, diplomá-los. Ninguém exige nada além disso porque tal demanda criaria a necessidade de passar da “simpatia” para a “empatia” e isso nos exigiria mudanças de comportamento. E como seria essa mudança?

Primeiro: a tecnologia introduz no cenário da aprendizagem o elemento da incerteza. Nada é, definitivamente, somente aquela definição apresentada pelo professor. Sempre há muito mais além do que cada um de nós é capaz de organizar em alguns minutos de aulas. Abrir a mente e expandir a sala de aula para navegar nas ondas da pesquisa de elementos em tempo real é inseguro e pode trazer erros. Mas quem disse que erro é um problema para a aprendizagem? Em algum momento da história, em algum lugar, convencionou-se que só se aprende acertando. Eu não entendo, por exemplo, como se aprenderia a andar de bicicleta dentro dessa premissa…

O fato é que a tecnologia nos torna menos infalíveis, nos expõe e nos convida à discussão mais profunda, até mesmo do que seja a informação certa ou errada. E aí abre-se o terreno para a empatia: precisamos entender como o outro pensa, faz suas buscas, e interpreta as informações para poder intervir nessa “trilha mental”.

A empatia nos convida a entender que há muitas trilhas mentais diferentes, que aprendem, interpretam e encontram soluções por caminhos mentais diferentes, e que precisamos estar abertos a isso a todo o momento, enquanto profissionais.

Se somos profissionais no mercado de trabalho, a empatia nos aproxima daqueles a quem queremos oferecer nossos serviços, processos ou produtos, e vai além: ela é capaz de fidelizar esse público ao seu modelo de negócio.

Se somos profissionais da educação, a empatia nos afasta da postura de ensinar, mas nos aproxima exponencialmente dos mecanismos do aprender do estudante.

É com a empatia que abrimos mão de dominar “todo o conhecimento” de uma aula, abrindo espaço para que o estudante traga também sua contribuição de conhecimento, para somar ao processo, fazendo parte ativa dele. Não estou falando dos malfadados seminários, mas sim, de estratégias de desenhos de aprendizagem onde descobrir, integrar, compor e solucionar sejam os engajadores de uma nova atitude de todos, dentro da sala de aula.

Se somos estudantes, a empatia nos engaja e nos empodera para ter a aprendizagem em nossas próprias mãos. A empatia nos leva a descobrir novos usos para velhos recursos, novas formas de olhar para velhas paisagens, novas formas de construir o pensamento e os conceitos de parcerias. Os tais “trabalhos em grupo” mudam de dinâmica e, mudando a dinâmica, mudam os resultados e suas consequências.

Tudo depende de como vemos o conhecimento e qual o lugar que ele ocupa, dentro das nossas decisões. Decisões de hoje ou decisões para o futuro.  Para isso, eu penso que uma das melhores definições modernas que já encontrei é do Eduardo Carmello (Entheusiasmos):

“Se eu vejo o conhecimento como um objeto, poderia perguntar: que novos conhecimentos preciso adquirir para me destacar? Se vejo o conhecimento como Atividade, perguntaria: como estão mudando o mercado, as atualizações de minha área, e como posso responder a tudo isso? Se vejo o conhecimento como Valor, poderia acrescentar: como crio ciclos contínuos de leitura de sinais, aprendizagem, inovação e ação, explorando minhas potências e construindo meu Futuro Promissor?”

No final das contas, a conclusão só pode ser uma: não existirá mais Educação sem empatia. O que pode existir é diplomação. Mas você pode discordar, usar a empatia, engajar-se nessa leitura e nesse propósito, e me dar a sua opinião! Vamos lá?

Denise Da Vinha

Fisioterapeuta, Mestre em Fisioterapia, Doutora em Pediatria e Pós-Doutora em Engenharia Biomédica. Especializou-se em Metodologias Ativas de Aprendizagem e em Design Thinking for Education. Além de seguir atuando na carreira docente (no Brasil e na Espanha), atua na assessoria de desenhos Curriculares personalizados e inovadores, onde o principal trabalho é preparar, em mindset e repertórios, o corpo docente de instituições de ensino superior para que encontrem os melhores caminhos da inovação na formação dos egressos, dentro de sua própria realidade e recursos. Há dois anos iniciou a Rede Innovares (Facebook e YouTube), um projeto de desenvolvimento docente, baseado em modelos colaborativos, com o objetivo de dividir conhecimento para multiplicar experiências de aprendizagens. Sua produção científica conta com artigos em periódicos nacionais e internacionais, cursos e palestras em eventos científicos, livros, orientações de pós-graduação, sistematização de processos científicos e técnicos, todos nas áreas de Educação, Fisioterapia e Saúde.

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