No final do ano passado publiquei um texto aqui no qual levanto a hipótese de estarmos vivenciando a transição para uma nova forma evolutiva, direcionada pela cognição (a cognificação).

Pois bem, senti que havia uma necessidade de um olhar mais cuidadoso sobre esse assunto, e me deparei com o texto do futurista e co-fundador da Singularity University (SU) –  Peter Diamandis – em que ele faz uma conexão entre o passado e o futuro da evolução da nossa espécie. Resolvi trazer ele para cá e colocar algumas reflexões minhas sobre o assunto.

A ideia que abordo no texto anterior sobre a força inevitável se refere à uma tendência que reflete um desejo da natureza tecnológica e até mesmo das pessoas. Estamos conectados em diversas formas de redes, e há uma vontade demonstrada pela sociedade de querer se conectar ainda mais. Há uma necessidade de mais conexão e aproximação.

Existe um desejo perceptível por uma extensão da nossa capacidade cognitiva, já que a capacidade de armazenamento do nosso cérebro é limitada. Os nossos aparelhos digitais conectados à Internet e à “nuvem”  já servem como extensão da nossa mente, deixando clara a necessidade de uma unidade de inteligência instantânea para todas as situações.

Por essa razão, podemos concluir que há uma tendência de cunho social que clama por mais conexão e cognição. Isso já está em movimento e pode se tornar mais evidente nas próximas décadas devido ao ritmo de crescimento exponencial. Estamos no processo de recriar uma nova espécie.

Diamandis acredita que a humanidade está em um processo de transformação, a qual ele chama de “Meta-Inteligência”. Ele está investigando as forças motrizes por trás dos passos evolutivos da nossa espécie, e tentado demonstrar como estes passos poderão se repetir, mas dentro de uma nova lógica evolutiva, baseada principalmente no aumento da conexão e cognição.

Estaremos todos conectados via cloud (nuvem). Ao invés de compartilharmos uma imagem no Instagram, vamos compartilhar os nossos pensamentos e conhecimentos on-line.

Crédito: Richard Bizley/SPL

Rápido Recap: Evolução da Vida na Terra em 4 Passos

4.6 bilhões de anos atrás, o nosso sistema solar, o Sol e a Terra foram formados.

Passo 1: 3.5 bilhões de anos atrás, as primeiras formas simples de vida, chamadas “procariotos”, surgiram. Eram organismos microscópicos unicelulares, basicamente um “saco de citoplasma” com o DNA flutuante. Eles nem tinham um nucleus evidente nem organelas especializadas.

Passo 2: Um bilhão de anos depois, ou seja, 2,5 bilhões de anos atrás, o próximo passo da evolução foi chamada de “eucariotos” – formas de vida que se diferenciavam ao incorporarem “tecnologias” biológicas para o seu organismo. Tecnologia que permitia a  manipulação da energia (via a mitocôndria) e informação (via cromossomos) com mais eficiência.

Passo 3: Depois, 1.5 bilhões de anos atrás, estes primeiros eucariotos começam a trabalhar de forma colaborativa e formam a primeira vida “multicelular”, a qual eu e você somos o exemplo final (somos uma criatura multicelular com 10 trilhões de células).

Passo 4: O passo final, que é importante destacar, aconteceu há 400 milhões de anos, quando a primeira forma de peixe transitou dos oceanos para a costa, e a vida evoluiu dos oceanos para a terra firme.

O Próximo Estágio da Evolução Humana: 4 Passos

Hoje, em um ritmo alucinante – 100 milhões de vezes mais rápido do que os passos descritos acima – a vida está passando por uma evolução similar.

Neste próximo estágio evolutivo, nós iremos sair da evolução por seleção natural (Darwinismo) para uma evolução direcionada pela inteligência (como eu falei no último artigo sobre cognificação).

Vamos utilizar uma analogia para explicar melhor como funciona este processo, em 4 passos:

Passo 1:  Atualmente somos análogos aos seres procarióticos. Vida comum, cada forma de vida é independente da outra, quase sempre competindo e algumas vezes colaborando.

Passo 2: Assim como os eucariotos foram criados ao “ingerir” tecnologia, os humanos irão  incorporar tecnologia dentro do seu próprio corpo e cérebro o que possibilitará fazer um uso bem mais eficiente da informação e da energia.

Passo 3: Através de tecnologias como a AI (Inteligência Artificial) e a BCI (Interface Cérebro-Computador), estaremos super conectados a uma nuvem com bilhões de AIs que irão expandir a nossa capacidade cognitiva e até a própria consciência como indivíduo, análogo às primeiras formas de vida multicelulares, 1.5 bilhões de anos atrás. Uma interconexão que vai levar a necessidade de uma consciência universal, e à criação de um organismo chamado Meta-Inteligência.

Passo 4: Finalmente, a humanidade irá vivenciar experiências fora da Terra, se tornando uma espécie multi planetária. Será possível visitar outros planetas, com a devida adaptação biológica às situações adversas fora da Terra. Nossa atual jornada para a Lua, Marte, asteróides representam uma analogia contemporânea com a jornada feita pelo os primeiros peixes que saíram dos oceanos quase 400 milhões de anos atrás.

As 4 Forças Motrizes da Evolução e a Transformação da Humanidade

Estas são as quatro forças motrizes principais que irão nos levar em direção à transformação da humanidade em meta-inteligência tanto dentro como fora da Terra:

1- Planeta Hiper-Conectado

2- A Interface Cérebro-Computador (BCI)

3- O advento da AI

4- A abertura das fronteiras espaciais

Vamos observar:

1- Planeta Hiper-Conectado:

Atualmente, há 2.9 bilhões de pessoas conectadas on-line. Dentro de seis a oito anos, espera-se que esse número cresça para quase 8 bilhões, pois cada pessoa no planeta terá acesso a uma super conexão por megabit-por segundo ou algo ainda melhor. Teremos acesso à conexão móvel de 5G, além redes de Internet fornecidas pelo Facebook, Google, Qualcomm, Samsung, Virgin, SpaceX e muitas outras.

Dentro de uma década, cada ser humano no planeta vai ter acesso a uma conectividade multi-megabit, informações instantâneas do mundo, além de um poder computacional impressionante na nuvem.

2- A Interface Cérebro-Computador (BCI):

Uma variedade de labs e empreendedores estão trabalhando para criar conexões duradouras e de banda-larga entre o mundo digital e o neocórtex humano. Ray Kurzweil prevê que teremos cérebros humanos conectados à nuvem em meados de 2030. Além disso, empreendedores como Bryan Johnson (e sua empresa Kernel) estão investindo centenas de milhões de dólares nessa visão.

Os resultados finais em conectar o seu neocórtex com a nuvem tem duplo benefício: você vai ter a possibilidade de conectar seu cérebro com o cérebro de qualquer outra pessoa como também com as AIs, da mesma forma como os celulares, servidores, relógios, carros e todos os aparelhos podem se conectar hoje via Internet das Coisas (IoT).

3- A Inteligência Artificial/ Inteligência Humana:

A próxima transformação, e talvez a mais significante, é que estamos a beira de uma revolução em AI (meu artigo sobre cognificação pode até ajudar na absorção desta parte). A Inteligência Artificial, nutrida de deep learning (aprendizado profundo) e financiada por empresas como o Google, Facebook, IBM, Samsung e Alibaba, continuará progredindo em um ritmo alucinante.

A Inteligência cumulativa (tanto humana quanto artificial) é o maior indicador de sucesso para empresas e nações. Por essa razão, além de um avanço absurdo na cognição da AI, logo vamos ver uma corrida focada na expansão cognitiva humana.

Sejam quais desafios poderemos ter ao criar uma interface cérebro-máquina (desenvolver sensores biocompatíveis de longo-prazo ou nanorobôs que podem servir como interface do nosso neocórtex), estes desafios vão se tornar mais evidentes nas próximas décadas quando o poder computacional das AIs nos oferecer capacidade de resolver problemas ainda mais rápido. É exponencial por cima de exponencial. A adição contínua de inteligência vai nos dar as ferramentas para resolver problemas de conectividade e com isso criar formas de inteligências ainda maiores.

4 – A abertura das Fronteiras Espaciais:

Finalmente, é importante falar que a raça humana está a beira de se tornar espécies multi planetárias. Daqui a milhares de ano, seja qual for o resultado da nossa evolução, iremos olhar para trás, para estas décadas que estão por vir como o momento na história em que a raça humana saiu da Terra irreversivelmente.

Hoje, bilhões de dólares são investidos de forma privada em indústrias comercial espacial. Esforços liderados pelo SpaceX tem a intenção de levar os humanos para Marte. Enquanto a Blue Origin busca levar a humanidade de volta para a Lua, e a própria empresa do Peter Diamandis, Planetary Resources, busca desbloquear recursos quase infinitos dos asteróides.

A Planetary Resources, fundada em 2009 por Peter Diamandis e Eric Anderson, considera os asteróides a chave não só para o futuro da exploração espacial, mas como o principal veículo para “permitir que a humanidade se torne uma espécie multi-planetária”. (Cortesia: SciencePLX)

Conclusão

O ritmo da evolução humana está acelerando conforme transcendemos do processo lento e aleatório de “seleção natural Darwiniana” para um hiper-acelerado período de uma evolução direcionada pela inteligência.

Nessa análise, Diamandis preferiu não abordar o poder desencadeado pelas técnicas de edição genética como a CRISPR-Cas9, que seria outra ferramenta capaz de hackear a biologia e empoderar o ser humano da sua própria evolução.

É importante entender que há diversos fatores químicos, físicos, ambientais e biológicos que influenciam no processo de evolução, não devendo ser jamais ignorados.

O que acontece é que, como descrito no início, o desejo da humanidade é tornar-se uma espécie mais conectada e inteligente, e este fator social é inegavelmente crucial para conduzir uma evolução nessa nova era.

Podemos rejeitar a ideia de conectar o nosso cérebro à uma AI ou até mesmo utilizar neurotransmissores para expandir nossa capacidade cognitiva. Porém, pergunto a você, se esta for a solução viável para nos tornarmos independentes dos processos biológicos e portanto mais inteligentes e conectados, você aceitaria?

Por mais absurdo que isso possa parecer agora, devemos lembrar que 20 anos atrás, se alguém dissesse que você poderia compartilhar imagens, vídeos e textos de forma pública, com pessoas a milhares de quilômetros de distância, e que elas puderiam ver e comentar em tempo real, talvez essa possibilidade fosse igualmente absurda.

Seguindo o atual ritmo de crescimento exponencial é possível que haja um avanço do compartilhamento de conteúdos mais intrínsecos como pensamentos e emoções. A Meta-Inteligência vai criar uma nova era de intimidade e troca entre as pessoas, abrindo espaço para novos canais como por exemplo um “Instagram” ou “Snapchat” para compartilhar nossas memórias ou um “Facebook” para compartilhar nossos pensamentos.

Acontece que esta mudança está vindo, e bem mais rápida e intensa do que já foi considerada possível. Se o impacto disso será disruptivo ou empático vai depender das nossas escolhas no presente e do nosso mindset para absorvê-la. Todos nós, líderes, empreendedores, professores, pais e mães, temos uma grande responsabilidade de inspirar e guiar a transformação da humanidade nos próximos anos.

O que iremos fazer nos próximos 30 anos – as pontes que iremos construir para gerar abundância – vão impactar o futuro da raça humana por milênios. Nós estamos de fato vivendo uma das épocas mais empolgantes da história humana.

Bruno Macedo

Bruno é futurista e designer de Experiências de Futuro na Rito, empresa em que é co-fundador. Também é game-designer e principalmente um curioso nato que estuda desde neurociência à gamificação. Tudo o que faz procura alinhar 3 coisas: Empatia, Subversão e Diversão.

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